Santa aposentadoria

7/4/2004
Wilson Pinheiro Jabur

"Instados os migalheiros a se manifestarem sobre a aposentadoria do Ministro Vicente Leal (Migalhas 896), que teria sido causa suficiente para extinguir o processo administrativo-disciplinar instaurado no STJ, penso que há dois modos de lê-la, nenhum dos quais, entretanto, engrandecedor da mesma ou daquele Tribunal. O primeiro, está dentro de uma certa tendência dos Tribunais Superiores de se absterem de decidir de modo efetivo e definitivo os processos que lhe são submetidos (utilizando-se, por vezes, de artifícios processuais, verdadeiras armadilhas). É certo que o desumano volume de trabalho que assoberba aquelas Cortes não pode ser olvidado. Porém, não menos certo é que o processo deve servir à pacificação social: não pode e não deve o Judiciário deixar de pôr fim às lides, mantendo vivos conflitos que deveriam ser por ele resolvidos. Condenável, portanto, a "simplista" decisão que se furtou do exame do mérito da questão. O segundo modo de se ler essa notícia é em conjunto com o lúcido artigo do Prof. Miguel Reale Júnior, igualmente publicado nas Migalhas nº 896, que trata do declínio ético por que passa nossa sociedade contemporânea. De fato, a total ausência de limites éticos desponta evidente e proveniente de todos os rincões e níveis da sociedade, passando pelo Governo e chegando aos nossos Tribunais - que deveriam ser os guardiões da ética e da lealdade. É de se perguntar que padrões éticos são os agora vigentes? Ou será que se chegou ao ponto em que é necessário indagar da própria existência de padrões éticos? Essa decisão é também condenável do ponto de vista ético porque se presta a acobertar uma dúvida, dúvida acerca da conduta de um de seus membros - agora aposentado, não se olvide - e que é de um peso inaceitável em um país democrático em que cidadãos, juízes e governantes têm, todos eles, deveres e obrigações. Ou será que também isso mudou e não nos informaram? Além de pensarmos ou repensarmos que país nós queremos, como proposto pelo Prof. Reale, sugiro que os Julgadores não percam a consciência da importância e reflexos de suas decisões, para além dos limites dos autos e que cada um de nós reflita sobre o papel que desempenha e o seu impacto nos demais."

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