Arte

13/11/2007
Wilson Silveira - CRUZEIRO/NEWMARC PROPRIEDADE INTELECTUAL

"No dia 8 próximo passado, foi cancelada a mostra fotográfica de Luiz Garrido, após a Secretaria de Comunicação Social da Câmara dos Deputados, em Brasília, esgotarem todas as possibilidades de negociação com a diretora do evento, Karla Osório, em razão de uma das fotos, um seminu frontal de Rogéria. A mostra levava o nome 'Heróis' e, na explicação da nota de Karla Osório, 'constitui-se de 24 fotografias de brasileiros ilustres'. A direção da casa vetou a apresentação da foto do nu frontal da transexual, levando em conta ser incompatível com os artigos 17 e 18 do Estatuto da Criança e do Adolescente e que, de mais a mais, o Salão Negro do Congresso Nacional, não é o 'espaço apropriado para exposições que possam gerar constrangimentos de qualquer natureza, pois que é visitado diariamente por centenas de turistas, religiosos, professores e crianças, inclusive estudantes da rede de ensino, além da presença constante e rotineira de autoridades e servidores.' Karla Osório, em sua nota, reclama da proibição, referindo-se, apenas a crianças e evangélicos, em evidente discriminação provocativa, qualificando, então, os argumentos da Casa de inaceitáveis, levantando-se as manifestações de sempre no sentido de que arte é arte, arte é intocável, de que nada pode ser censurado e por aí afora. Uma discussão que não tem fim, em que todos põem a colher e que eu, como todos, ponho a minha, também, a começar por achar um pouco esquisito incluir Rogéria, a transexual, entre os heróis, principalmente de camisa e gravata, sem calças, com os pêlos pubianos à mostra, ainda mais com a qualificação de brasileiro (a) ilustre. Depois, porque ao menos eu me dou ao direito ? ainda que os céus me caiam sobre a cabeça ? de valorar arte, sim senhor. No mês passado, em Manágua, o ‘artista’ Guillermo Habacuc Vargas expôs em uma galeria de arte um cão vadio, à vista da frase escrita com biscoitos para cão, na parede da galeria: 'tu és aquilo que lês...' Sem água e sem alimentos, o cão que já foi trazido completamente desnutrido, morreu ali, à vista de todos, de fome, de inanição. O artista compareceu à exposição selecionado para representar o seu país, a Costa Rica, e ainda vai comparecer, nessa condição, na Bienal de arte centro-americano de 2008, a se realizar em Honduras. É esperar para ver o que irá apresentar, de 'arte', naquela mostra. Visitando, uma vez, a Bienal em São Paulo, estive em uma sala enorme, de um artista, creio que da antiga Tchecoslováquia, encontrando lá uma série de esculturas. Primeiro uma composta de um pedregulho, um paralelepípedo, desses de rua, preso a um ferro desses retorcido de construção, soldado em uma placa de ferro fixada ao chão, com o título 'o estranho'. Ao lado, dois iguais com o título 'dois estranhos'. Mais ao lado, três iguais: 'três estranhos'. Mais adiante, dez daqueles: 'dez estranhos'. Um monte deles: 'multidão'. Arte ?. Gostaria de saber quem autorizou o gasto de dinheiro público para trazer aquele monte de paralelepípedos, de alguma rua que estava sendo asfaltada na Tchecoslováquia, à custa do governo de São Paulo, para expor um desconhecido 'artista' tcheco em São Paulo, para que pagássemos entrada para vermos aquilo. Assim como Chico da Silva, dizem que alguns dos quadros de Di Cavalcanti foram somente assinados por ele, mas executados por ajudantes, o que deixa dúvidas sobre, então, onde está a arte. Conta-se, também, que Salvador Dali, não obstante sua reconhecida genialidade, divertia-se com os preços astronômicos que certas brincadeiras suas alcançavam por compradores ávidos de sua assinatura a ornar suas paredes de suas casas em alguma cidade texana. Não concordo, pois, com Marcel Duchamp, quando diz que 'A Arte pode ser ruim, boa ou indiferente, mas qualquer que seja o adjetivo empregado, temos de chamá-la arte. A arte ruim é arte, do mesmo modo que uma emoção ruim é uma emoção'. Se, como Duchamp, podemos valorar a arte, arte ruim não é arte. Deixar morrer o cão de inanição, à frente de todos é crime. E Rogéria não é herói, nem heroína. E sua foto, de camisa social e gravata, sem calcinha e nem cuecas, sem pênis e com pelos pubianos à mostra, não é heróico e, muito menos, artístico."

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