Reforma Política

8/2/2008
Pedro Luís de Campos Vergueiro – advogado e procurador do Estado de São Paulo aposentado

"Há muito tempo se cogita da idealização, da preparação, da instituição e da realização efetivas de uma reforma política. Muita coisa deve ser modificada, ou melhor dizendo, aprimorada, sem dúvida alguma. Porém, fazer tudo de uma vez pode ser extenuante e complicado. Assim que se faça por partes a começar pelo estabelecimento de uma disciplina nova sobre as regras aplicáveis ao exercício dos cargos públicos. A nova disciplina deverá abranger também, é claro, o expurgo das regras e garantias e prerrogativas inadequadas (politicamente incorretas, segundo o jargão corrente). Um ponto crucial dessa reforma diz respeito ao desvio de função. De fato, uma das prerrogativas dos membros do Poder Legislativo, representado neste país pelo Senado, pela Câmara dos Deputados, pelas Assembléias Legislativas e pelas Câmaras Municipais, é uma proibição que não está prevista no inciso II, do artigo n°. 54; ao revés, o que deveria ser uma proibição está afiançado pelo disposto no artigo n°. 56, inciso I, ambos da Constituição da República vigente. Trata-se da prerrogativa dos senadores, deputados (federais e estaduais) e vereadores não estarem impedidos de exercer algum cargo dos Poderes Executivos. Vale dizer, embora eleitos para o exercício das atribuições legislativas, eles podem ser 'convocados' para integrar o corpo de ajudantes do Poder Executivo (tanto o federal, como o estadual ou municipal), e exercer as atribuições de um cargo em comissão. Negociações políticas norteiam esse desvio de função, é claro, sem nenhum interesse para a acelerar o desenvolvimento deste país. Ou seja, como sacramentado na Constituição vigente, o titular de mandato junto ao Poder Legislativo pode vir a integrar o Poder Executivo sem perder o cargo legislativo. Assim, o Senador, o Deputado Federal, o Deputado Estadual, o Deputado Distrital e o Vereador, no caso de serem dispensados de suas funções junto ao Poder Executivo, eles retornam ao exercício do cargo no Poder Legislativo. Exemplo mais que conhecido disso é o caso do ex-deputado federal José Dirceu. Foi ele eleito Deputado Federal. Empossado como tal, foi chamado pelo Presidente da República eleito para exercer um dos cargos do seu Gabinete. Porém, à vista dos escândalos que então vieram à tona, foi ele destituído do Ministério, retornando ao exercício do cargo de Deputado Federal. Anotamos que a perda deste cargo se deu por notórias razões de falta de ética e outros quesitos muito desabonadores. Por aí se vê a incoerência da coisa estabelecida pela Constituição. Sucintamente: o senhor Dirceu foi considerado 'persona non grata' para o Poder Executivo e, mesmo assim, voltou a exercer o mandato de Deputado Federal. Ou seja, embora fosse ruim para o Executivo, não era ruim para o Legislativo. É isso! É isso que, urgentemente, precisa ser objeto de correção. E a forma de fazê-lo é simples: estabelecer a perda do mandato para o membro do legislativo que aceitar exercer as atribuições de cargo do executivo. Porém, para que assim seja, é necessário que essa proibição conste explicitamente do texto constitucional. Aliás, tem-se notícia de que a vedação em tela constitui proibição que consta do texto constitucional de alguns países. Isso posto anotamos. A alteração constitucional necessária veio de ser apresentada em dezembro último ao Senado Federal, constituindo a Proposta de Emenda Constitucional nº. 103/2007. O projeto é da autoria do Senador Pedro Simon e tem apenas três precisos dispositivos. O primeiro acrescenta a alínea 'e' ao inciso II, do artigo n°. 54 da Constituição; o segundo revoga o inciso o inciso I, do artigo n°. 56; o terceiro é a cláusula de vigência. O inciso II, do artigo n°. 54, é o preceito onde estão arrolados os impedimento dos Deputados e Senadores após a posse, inciso que, consoante o projeto, deverá vir a ser acrescido da alínea 'e' do teor seguinte: [os Deputados e Senadores não poderão (caput), desde a posse (inciso II)] 'e) ocupar cargo de Ministro de Estado, Governador de Território, Secretário de Estado, do Distrito Federal, de Território, de Prefeitura de capital ou chefe de missão diplomática temporária'. Ademais, por motivo da necessária coerência do texto constitucional, o projeto contém preceito que revoga o inciso I, do artigo n°. 56, por nele estar prevista a prerrogativa da não perda do mandado nas hipóteses em questão. Perfeito! Sem dúvida alguma é oportuna essa proposta do Senador Pedro Simon, visto que, vindo ao encontro das aspirações, merece ser transcrita:

'Art. 1º - O inciso II do art. 54 da Constituição Federal passa a vigorar acrescido da seguinte alínea:
'Art. n°. 54............................................................
II- ...............................................................
e) ocupar cargo de Ministro de Estado, Governador de Território, Secretário de Estado, do Distrito Federal, de Território, de Prefeitura de capital ou chefe de missão diplomática temporária. (NR)'
Art. 2º - Revoga-se o inciso I do art. 56 da Constituição Federal.
Art. 3º - Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação.'

Diante dos fatos da nossa realidade política do último decênio pelo menos, essa modificação do texto constitucional revela ser imprescindível. E o impulso para assegurar o efetivo, e exclusivo exercício da função legislativa durante o mandato para a qual foi eleito, já teve seu início em 19 de dezembro passado. Atualmente a PEC nº. 103/2007 se encontra na Comissão de Constituição e Justiça do Senado para que seja designado o seu relator. É imprescindível pois, a começar pelo Senador Presidente, que todos os demais integrantes do Senado sejam instados a manifestar seu apreço para com a PEC nº. 103, de 2007. Dada a objetividade da proposta, cabe uma célere análise, discussão e votação da mesma, sobretudo à vista do ocorrido com precedente PEC que permitiu a reeleição do Presidente da República e que resultou na desditosa Emenda Constitucional nº. 16, datada de 4.6.97. Enfim, é possível dar início à reforma política com a aprovação da PEC nº. 103/2007. Basta vontade política, pois tempo para tanto não é impedimento."

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