Novos pecados 12/3/2008 Wilson Silveira - CRUZEIRO/NEWMARC PROPRIEDADE INTELECTUAL "Com a notícia, vinda do Vaticano, da introdução dos novos pecados mortais, tive que me atualizar quanto a essa questão de pecados, já distante dos tempos em que estudava em 'colégio de padres', no São Bento, aqui na capital de São Paulo. Tinha o pecado original, mas desse já nos havíamos livrado, há muito tempo, o que era justo até porque não o tínhamos praticado diretamente. Tinha, também, o pecado venial, que era aquele menos grave, que se expiava pela confissão e cujas penas se pagava pelas tormentas, mais leves, do purgatório, se não me engano. E havia os mortais, ou capitais. Esses eram os mais graves, que mereciam a morte eterna, ou seja, o inferno que, na ocasião, estava em moda. Desde sempre, eram eles sete: a soberba, a avareza, a luxúria, a ira, a gula, a inveja e a preguiça. Todos nós, cristãos ou não, desde cedo acostumamo-nos a exercitar esses pecados e, porque não dizer, tornando-nos mestres em alguns deles com relação aos quais adquirimos especial predileção. E todos eles sempre foram absolutamente democráticos, podendo ser exercitado por qualquer pessoa, independentemente de classe social, cor, sexo, idade ou profissão. Qualquer um, não importava se ganhasse menos de um salário mínimo ou fosse um Bill Gates, fosse negro, branco ou amarelo, tivesse nascido no Haiti ou em Nova York, poderia ser raivoso, orgulhoso, preguiçoso, avarento, invejoso ou participar de uma orgia sexual, estava apto a praticar os sete pecados capitais. Agora não, a Santa Igreja decretou, de maneira altamente discriminatória, pecados mortais destinados especificamente à classe alta, abandonando, definitivamente, sua opção pelos pobres, como vinha fazendo pelo menos a CNBB nos últimos anos. Com exceção do tráfico e uso de drogas, todos os demais novos pecados são destinados à classe média-alta para cima. São pecados de ricos. Ser excessivamente rico, por exemplo, agora é pecado mortal. Não ficou claro, se é pecado mortal quem já é excessivamente rico, ou seja, se o pecado mortal é retroativo, ou se a lei só vale a partir da publicação, tratando-se de norma penal, a regra é que não retroage, mas sendo norma penal religiosa, vale uma explicação. Ou, ainda, como fica essa história do 'excessivamente', se vai ser estabelecido um nível, um patamar a ser – ou não ser – atingido, acima do qual o candidato a mortal pecador deverá se livrar do excesso, por exemplo doando a carga a mais para sua igreja, capaz de suportar esse fardo, tirando-o do seu fiel, livrando-o da danação. Gerar pobreza, por outro lado, um outro pecado mortal, parece ser um 'bis in idem', já que pode ser entendido que cada vez que uma pessoa ganha, gera pobreza para outro, como em um jogo de cartas, em que o cacife de um jogador diminui na medida em que o do outro cresce. De qualquer forma eu, por exemplo, tenho dúvidas como posso gerar pobreza. Preciso pensar nisso melhor. No momento, estou pensando em enriquecer, ainda que não seja excessivamente. Mas, aquela história do Eike Batista, de que pretende aumentar sua fortuna, de 6 para 16 milhões ainda este ano, talvez seja melhor deixar de lado. E, uma pergunta: essa questão do 'excessivamente', como vai ser avaliada? O Vaticano vai se valer da lista da Revista Forbes? Ou vai estabelecer critérios próprios? Já poluir o ambiente é mais fácil, pois que sou fumante e tenho plena consciência que poluo o ambiente à minha volta. É pouco, mas poluo. Agora, a Marina Silva deve estar alegre, pois o que não conseguiu até agora, vai conseguir com ajuda divina, o que não é pouco. E a ministra foi, ainda, brindada com mais um pecado mortal para ajudar seu ministério, já que violações bioéticas também são pecados mortais. Quem não ficou satisfeito deve ter sido o ministro Temporão, porque o controle da natalidade – com camisinha ou sem – agora é pecado mortal, assim como experimentos 'dúbios' com células tronco, ficando essa história de 'dúbios' como mais um problema para o ministro Direito analisar – se é que ele tinha alguma coisa mais a analisar – em seu pedido de vista no processo que corre no Supremo. E talvez seja bom, também, o governo parar com essa distribuição de camisinhas. É pecado mortal! Um dos pecados mortais foi especialmente dirigido ao presidente Lula – apesar de tudo o que tem feito pelo Brasil 'nextexs' anos – é o agravamento da injustiça social, não a própria, é claro, e nem o da sua família e de seus amigos, mas do povo que o elegeu e que continua morrendo à míngua de qualquer coisa, recebendo a paternal bolsa 'qualquer coisa' do paizão. Mas, S. Santidade que me perdoe a soberba, mas ao assistir a Fala Papal pela televisão, transmitida diretamente do Vaticano, daquele ambiente de excessiva pompa e riqueza, pensei: 'E a corrupção?' Não seria, também, em tempos de globalização, que tanto preocupam S. Santidade, ser o maior dos pecados, esse sim ao alcance de todos? Ou corrupção não é pecado?" Envie sua Migalha