Artigo - Eu e a OAB/SP

24/3/2008
Romeu A. L. Prisco

"Ser advogado. Segundo óbvia observação de uma leitora, no Brasil, o exercício da advocacia é privativo dos inscritos na Ordem dos Advogados. Aliás, esta norma também se aplica à denominação de 'advogado', só podendo usá-la quem for titular da mesma inscrição. Entretanto, não é desse modo que se faz um advogado. Advogado é aquele que, portador da licenciatura, assim entendido o diploma de bacharel em ciências jurídicas e sociais, se dedica à prática diária e constante desta atividade. É aquele que 'fuça' aqui e acolá, desde o início do curso de Direito. É aquele que 'tromba' com profissionais das áreas paralelas à advocacia, com estes muitas vezes aprendendo e a estes muitas vezes ensinando. Advogado é aquele que estuda permanentemente, mantendo-se atualizado em tudo que for aplicável ao exercício da profissão. Constitui verdadeiro disparate a pretensão de se reconhecer como advogado somente os inscritos na OAB. Ao longo da minha carreira de advogado de empresa, cansei de me defrontar com indivíduos que se diziam meus 'colegas', devidamente inscritos na OAB, mas, que não sabiam sequer minutar uma simples procuração. Confesso que, em algumas oportunidades, não consegui conter a minha ironia, indagando-lhes: 'tem certeza de que é meu 'colega'? Todavia, além de ironizá-los, deveria ainda ter-lhes dito: 'olhe, só por ser inscrito na OAB, não saia a campo dando 'consultas' e nem recebendo eventuais clientes na sua casa, porque você, sim, estará exercendo ilegalmente a profissão'. É o que acontece com bom número de 'inscritos' na OAB, totalmente despreparados e desatualizados. Aliás, e aqui peço licença ao nobre e culto migalheiro Wilson Silveira, por estar invadindo uma área da sua especialidade, acho que deveria ser o caso de, a cada 'x' anos, como ocorre com o prazo de exclusividade para exploração de marcas comerciais, industriais e de serviços, demonstrarem os 'inscritos' na OAB o 'uso' efetivo do título de advogado, sob pena de, não o fazendo, perderem o direito de mantê-lo. Outrossim, o curioso da história, é que os advogados, eternos defensores das liberdades e garantias individuais de terceiros, tratam-se com extremo rigor, criando, para si próprios, incontáveis restrições e obrigações, umas abusivas, outras arbitrárias. No Brasil, o advogado está impedido de fazer publicidade dos seus serviços, podendo apenas indicar nome e área de especialidade, ficando o resto por conta da imaginação de quem aspira a contratá-lo. Na Itália, além de outras profissões, o advogado não pode exercer a atividade jornalística. Parece que publicidade e jornalismo andam de mãos juntas. Na Costa Rica, somente os advogados, inscritos, claro é, podem exercer o magistério nas faculdades de Direito, modelo este que, felizmente para alguns e infelizmente para outros, o Brasil não copiou. Aqui no Brasil, nada impede a um bacharel em ciências jurídicas e sociais, sem estar inscrito na OAB e após obter graduação em doutorado e mestrado, tornar-se professor em faculdades de Direito, cujos objetivos maiores são a formação de advogados. Embora poucas devam ser, entre nós, as situações como essas, nelas não deixa de existir grande incoerência, perante a norma estatutária brasileira, enquanto o modelo costarriquenho mostra-se mais racional, quando fecha as portas de acesso às cátedras das faculdades de Direito aos magistrados e membros do Ministério Público. O Bastonário dos Advogados de Portugal, país que, em matéria de corrupção, guarda similaridade com o Brasil, defende a descriminalização do corruptor, a quem considera 'a primeira vítima do ato corruptivo', porque a ele, corruptor, não restaria alternativa, salvo ceder à chantagem do corrupto. Agora fica a pergunta: caso essa situação se dê com um advogado, lá ou cá, haveria tanta indulgência, ou seria o caso de grave infração disciplinar, sujeita às sanções previstas no estatuto da categoria, afora as de natureza penal e afora, ainda, o péssimo exemplo que, como guardião da legalidade, estaria dando ? Como se vê, diante de um sistema arcaico e superado, nada mais fácil do que dizer: ‘advogado é todo aquele 'inscrito' na Ordem dos Advogados'. Destarte, Eduardo Couture e Ives Gandra da Silva Martins perderam seu precioso tempo, na elaboração dos respectivos decálogos dos advogados, quando poderiam tê-los resumido a um único e lacônico mandamento."

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