Marcha da maconha 14/5/2008 Wilson Silveira - CRUZEIRO/NEWMARC PROPRIEDADE INTELECTUAL "A palavra marcha, além de jornada a pé, andada, caminhada, significa, também, progresso, desenvolvimento. É isso o que se vê com a Marcha da Maconha, que já acontece em cerca de 240 cidades de 19 países. No Brasil, os organizadores pretendiam que acontecesse em todas as capitais mas, em algumas, o evento foi proibido. Em outras, malgrado os esforços do Ministério Público, foi autorizada. Em Porto Alegre, a Marcha foi permitida, por decisão da Juíza Laura de Borba Maciel Fleck, pelos motivos seguintes: 'Tenho que a liminar é de ser deferida, por dois aspectos, bem enfocados na impetração. A um, a Constituição Federal assegura a liberdade de expressão, em seu artigo 5º, incisos IV e IX, enquanto garantia fundamental do cidadão brasileiro, bem assim assegura que essa manifestação do pensamento se dê de forma pública, inclusive com realização de marchas e passeatas (inciso XVI, do mesmo artigo 5º. da Constituição Federal). Nesse sentido, e do material acostado com a impetração, se vislumbra que o movimento que se reunirá na denominada "Marcha pela Maconha" não visa propalar o uso de substâncias que causem dependência química, mas discutir, inclusive em nível mundial, políticas públicas que incluem a descriminalização do uso de substâncias entorpecentes, no caso, especificamente, da "Cannabis sativae", discussão pública que está há vários anos em curso no Brasil e que visa, a final, modificação legislativa. Tal tipo de discussão e exercício do direito de crítica tem sido exercido em relação a vários outros assuntos que são ou foram tipificados como delitos, como ocorreu em relação ao Estatuto do Desarmamento e ainda ocorre em relação à discussão sobre a descriminalização do aborto, eutanásia, etc. Temas polêmicos, todos, com posições divergentes e até acirradas a favor ou contra e que têm por base a descriminalização de conduta prevista como infração penal. Tal propósito, em princípio, se situa dentro do direito de crítica e de livre expressão do pensamento, não podendo ser caracterizado, "a priori", como apologia ao crime, o que, em tese, parece estar sendo o pensamento da Autoridade dita Coatora ou, mesmo, como caracterizador do tipo penal previsto no artigo 33, § 2C, da Lei 11.343/2006. De outra parte, e a dois, de se ver que os argumentos invocados quanto à potencial atipicidade da conduta dos participantes da denominada "Marcha da Maconha", por ausentes os elementos de tipicidade tanto do artigo 287 do Código Penal como do § 2, do artigo 33, da Lei 11.343/2006, se mostram razoáveis, para efeitos de obstar a ação da Brigada Militar, pois a lavratura de Termos Circunstanciados (conduta admitida pela Autoridade Coatora como a que será adotada), como se sabe, dispensa maiores formalidades quanto à análise da tipicidade da conduta e submete, desde logo, o autor do fato, a procedimento criminal, o qual sempre invade a seara da liberdade pessoal, ainda que não sujeite o infrator à pena de prisão.' Já na Paraíba, a Marcha foi proibida, pelo Juízo da 8ª Vara Criminal, pelos motivos abaixo: 'Antes de analisar o pedido liminar em si, deve-se esclarecer que a Carta magna de 1988, autoriza a manifestação pública de pensamentos e idéias, inclusive com a realização de marchas e passeatas (Art. 5º, incisos IV, XVI, da CF). Contudo, deve se atentar que o direito de manifestação de pensamentos realizados para consubstanciar a marcha em apreço não são ilimitados, ao passo em que encontram limites nos demais direitos consagrados na mesma Constituição Federal, o que corresponde ao princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas. No caso específico, entendo que a discussão sobre a legalidade ou não do consumo da referida droga, até então relacionada como ilícita, deve ser feita em locais apropriados, tais como centros universitários, casas legislativas e em outros ambientes propícios para tanto, e não da forma como está sendo proposta, em praça pública aos olhos de crianças, idosos e todos os cidadãos. Ainda, se o propósito é restrito a legalizar a uso da referida droga, não se pode negar que isso somente pode ocorrer com a alteração da legislação em vigor e, para tal, caberia aos interessados adotar as medidas previstas na Carta Magna. Ademais, a realização de passeatas e reuniões pressupõe a legalidade ou a licitude do que se pretende com este ato. Na hipótese, é forçoso convir que com a realização desse movimento, emergem indícios do cometimento de crime, sob a forma de instigação e indução ao uso de drogas (art. 33, parágrafo 2º, da Lei 11.343/06), e com isso, de fins ilícitos, podendo assim configurar o tipo penal de Apologia ao Crime (art. 287, do CP). Dizem os artigos: Art. 33. ( Lei 11.343/06) - Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. § 2º Induzir, instigar ou auxiliar alguém ao uso indevido de droga: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa de 100 (cem) a 300 (trezentos) dias-multa. Art. 287.(Código Penal) - Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime: Pena - detenção, de 3 (três) a 6 (seis) meses, ou multa. Por fim, não se pode olvidar que essa conduta atenta contra a ordem pública, pois afronta a moral e os bens costumes, visto que ultrapassa o terreno do debate de idéias e estimula um comportamento que pode produzir nefastas conseqüências, notadamente quando o instigamento é feito em locais públicos aos quais costumam comparecer muitos jovens ainda imaturos que são levados, muitas vezes, pelo modismo da situação.' A OAB/RJ promoveu um ato público em favor da liberdade de expressão, em razão da proibição, naquele Estado, da Marcha da Maconha. Foi interessante ver, pela televisão, todos aqueles importantes membros da OAB defendendo a Marcha da Maconha e criticando a decisão judicial que proibiu a Marcha da Maconha, considerando a decisão um 'atentado à liberdade de expressão e às liberdades individuais', algo que acaba com a democracia. Proibidos de marchar pela maconha, os organizadores do movimento, no Rio de Janeiro, decidiram transformar o mesmo em uma marcha de protesto pela liberdade de expressão, mas os que lá estavam se dispersaram, em virtude do mau tempo, que parece ser suficiente para impedir protestar pela não liberdade de expressão mas não a favor da maconha, um motivo bem mais edificante, como se vê. O novo ato da OAB/RJ, em conjunto com a ABI, terá como motivo central 'a intolerável proibição da livre expressão e da manifestação do pensamento'. Há os que pensam que a liberdade no consumo da maconha levará ao consumo de outros tóxicos. Há, mesmo, inúmeros casos de pessoas que começaram, inocentemente, na maconha e hoje estão mergulhados na cocaína, o que ninguém desconhece, a não ser os que não tem contato com nenhum drogado. Há os que pensam que, abrindo-se a porteira, por que não outras marchas. Por exemplo a da cocaína? Há os que defendam a descriminalização dos tóxicos. E, porque não a Marcha do 'Crack', para os que desejam, ordenadamente, discutir o assunto, e não fazer apologia do uso? E o 'ecstasy', tão apreciado pela moçada? Até já há lei mandando instalar bebedouros nas casas noturnas para os usuários com sede. Por que não uma marcha pela legalização? Uma coisa ordeira, sem apologia. Só para abrir a discussão do assunto. Afinal, há ou não há liberdade de pensamento e de manifestação? O governo comanda todos os jogos de azar no país. E os bicheiros? Podemos organizar uma marcha pela legalização do jogo do bicho? Pela alteração das leis que o qualificam como contravenção? Coisa boa, familiar, sem apologia. Tudo dentro da lei, com ordem e escolas de samba financiadas pelos próprios bicheiros que, aliás, jamais deixaram a profissão. Uma outra marcha ocorre, moderna e atual: a da pedofilia, que visa regulamentar a atividade, os vôos internacionais fretados para o nosso país e, até, um partido político para a causa, como existe na Holanda. Não é para fazer apologia. Mas, em um país onde a liberdade de expressão é um dos pilares da Constituição, a livre manifestação não há de ser coibida." Envie sua Migalha