Reforma eleitoral 18/8/2009 Milton Córdova Júnior - OAB/DF 22.899 "É de se estranhar a opinião e fala do ministro da Defesa e ex-presidente do TSE, Nelson Jobim, sobre o Projeto de Lei da Câmara 141/09, que institui a reforma eleitoral, em audiência pública (dia 12/9) no Senado Federal, quando afirmou que o artigo que permite o voto em trânsito precisa ser suprimido do texto. Segundo explicação de Jobim, para que fosse possível o voto do eleitor fora de seu endereço eleitoral, seria necessário que as urnas estivessem interligadas pela internet, o que amplia a possibilidade de invasão do sistema, por hackers. É de se estranhar, pois como ex-ministro do STF, ele deveria saber que o voto direto, universal e secreto (art. 14), - é o principal dos direitos políticos do cidadão, fazendo parte dos direitos e garantias fundamentais plasmados na Constituição, cláusula superpétrea, que sequer pode ser deliberada a sua abolição (art. 60, parágrafo 4, II). Além disso, o dispositivo constitucional que estabelece o voto e suas condições é de eficácia plena e de aplicabilidade imediata (art. 5, parágrafo 1), pois a Constituição, de forma clara e inequívoca prevê que 'as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata'. As únicas exceções constitucionais para o não-voto (art. 14, parágrafo 1, II) são os analfabetos, maiores de setenta anos e menores de dezoito anos. Mesmo assim, se esses quiserem votar, poderão votar. Portanto, aspectos meramente operacionais (se o voto só pode ser acolhido por meio de urna eletrônica, se é on-line ou off-line, se pode ser acolhido por cédula) não podem ser invocados para impedir o voto. É querer que a dosagem do remédio mate o paciente. Portanto, nesse aspecto o TSE incide em grave inconstitucionalidade ao cruzar os braços e se acomodar com a denominada 'justificativa do voto' - e insistir nela, por mera conveniência. Por que 'conveniência'? Simples. Porque é impactante, em termos de mídia nacional e até internacional, informar que o Brasil 'realizou as maiores eleições informatizadas do Mundo' e que todos os votos foram apurados poucas horas após o final das eleições. Isso 'sai bem na foto', embora seja omitido que milhões de brasileiros não puderam votar (ainda que por outro meio que não a urna eletrônica), porque se o fizessem, a apuração da eleições seria mais demorada. Apenas isso. Pior que a acomodação do TSE foi o seu vigoroso empenho pela aprovação do art. 59, da Lei das Eleições (lei 9.504/97), que impõe que os votos serão por sistema eletrônico. A partir daí, o TSE encontrou justificativa plausível para deixar que aproximadamente 10 % dos eleitores (que estão 'em trânsito' no dia nas eleições) deixassem de votar. Mais grave é que antes dessa lei o Código Eleitoral permitia o voto 'em trânsito' (vide art. 145, § 2º) para algumas pessoas, como por exemplo, o juiz eleitoral, o Presidente da República (que podia votar em qualquer seção eleitoral do país), o governador, vice-governador, senador, deputado federal e estadual bem os que forem candidatos a esses cargos (em qualquer seção do Estado em que for eleitor). Porém depois da lei, o art. 62 (Lei das Eleições, também proibiu esses votos, indo na contramão da Constituição Federal. Como se uma lei infraconstitucional tivesse o poder de revogar a norma constitucional. Tudo em nome da urna eletrônica, como se o 'voto eletrônico' fosse o único possível para o acolhimento do voto. Vale dizer: o sistema eletrônico não é a panacéia da democracia, e nem o único possível para acolher o voto, pois inclusive existe previsão legal para o uso da cédula (papel). Apesar do cerceamento do voto imposto para os cidadãos 'em trânsito', a lei 9.504/97 prevê, em seu art. 82, a possibilidade da cédula em papel, nos locais em que não for usado o sistema eletrônico de votação. Lembramos que o assunto já foi provocado junto ao TSE, por meio do MS 3273, de 25/10/04 e do MI 04, de 3/7/06. Por sua vez, o Senado Federal aprovou o PLS 207/2004, elaborado com fundamento no teor naqueles remédios constitucionais, disciplinando o voto para os eleitores em trânsito e propondo uma implementação gradual, começando pelas eleições à presidência da República (de circunscrição nacional) e, posteriormente, para os demais cargos eletivos. Está parado nas gavetas da CCJ, na Câmara dos Deputados, também por gestões eficientes dos técnicos do TSE, que são contra o 'voto em trânsito'. A rigor, considerando a natureza dos comandos constitucionais que envolvem os direitos políticos e o voto, o TSE não precisa sequer esperar o advento de uma lei nesse sentido (uma vez que a Constituição não a exige). Basta, apenas, regulamentar o assunto por meio de Instrução ou Resolução, acolhendo o voto dos eleitores em trânsito por meio de cédulas eleitorais, nos termos da lei 9.504/ 97, art. 82, iniciando pelas eleições presidenciais. Não é o eleitor que tem que servir ao TSE; é o TSE que tem que servir ao eleitor." Envie sua Migalha