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Misoginia

Arthur do Val cometeu crime em áudio sobre mulheres ucranianas?

Deputado estadual de SP disse que ucranianas são "fáceis porque são pobres". Advogada e promotora explicam consequências jurídicas.

Da Redação

terça-feira, 8 de março de 2022

Atualizado às 12:30

Em áudios tornados públicos na internet e que causaram indignação, o deputado estadual de São Paulo Arthur do Val, conhecido como "Mamãe Falei", profere uma série de falas misóginas contra mulheres.

Diante dos fatos, perguntamos a duas especialistas: o deputado cometeu crime?

Apologia ao crime

Para a promotora de Justiça Silvia Chakian, do Ministério Público de São Paulo, a fala do deputado deve ter consequências legais, inclusive com cassação de seu mandato parlamentar.

No âmbito administrativo, ele pode ter o mandato cassado, visto que não há imunidade parlamentar para falas que não tenham relação com o cargo.

Na esfera Cível, vislumbram-se danos morais coletivos contra todas as mulheres que se sentiram ofendidas pelas falas, processo pelo qual Arthur do Val pode responder aqui mesmo, no Brasil.

Criminalmente, ela explica que não há um tipo penal específico para a misoginia. Neste caso, é necessário que se faça uma tradução cuidadosa dos fatos para os tipos penais já existentes.

Ela cita, por exemplo, a possibilidade de o ato ser enquadrado em apologia ao crime, ou incitação à prática do crime de exploração sexual.

Ela destaca que há avanço legislativo no caso da lei do racismo, hoje também aplicada à homofobia, mas que a "aversão à mulher" ou o "ódio à mulher" ainda não está prevista no ordenamento penal.

Racismo

Para a criminalista Daniella Meggiolaro, atos de preconceito de modo geral podem, sim, ser classificados como atos de racismo. "O racismo não é só discriminação de raça e cor. Ele também envolve discriminação por etnia, por exemplo, por nacionalidade. Eu acredito que contra as mulheres ucranianas ele cometeu racismo."

Ela explica que não é o caso de falar em injúria ou difamação, visto que as falas não foram imputadas a uma vítima especificamente.

Para a advogada, o fato de as falas serem de um deputado torna a situação ainda mais grave. "O que se espera de um representante do legislativo uma postura condizente com a relevância do cargo. Essa também vai ser uma das sanções que o deputado deve sofrer."

O caso 

Em áudios tornados públicos na internet e que causaram indignação, o deputado estadual de São Paulo Arthur do Val, conhecido como "Mamãe Falei", profere uma série de falas misóginas e diz que mulheres ucranianas são fáceis porque são pobres.

"São fáceis porque elas são pobres. E aqui minha carta do Instagram, cheia de inscritos, funciona demais. Não peguei ninguém, mas eu colei em duas 'minas', em dois grupos de 'mina'. É inacreditável a facilidade."

Ouça o áudio completo:

O deputado esteve na Ucrânia após arrecadar doações para ajudar refugiados após a invasão russa ao país. No áudio, ele diz que, na fila de refugiadas, só tem "deusa".

"Sem noção, inacreditável, é um bagulho fora de série. Se pegar a fila da melhor balada do Brasil, na melhor época do ano, não chega aos pés da fila de refugiados aqui. [...] "Passei agora quatro barreiras alfandegárias, duas casinhas pra cada país. Eu contei, são doze policiais deusas. Que você casa e faz tudo que ela quiser. Eu estou mal cara, não tenho nem palavras para expressar. Quatro dessas eram 'minas' que você se ela cagar você limpa o c* dela com a língua. Assim que essa guerra passar eu vou voltar para cá".

Ele confirmou que as declarações são suas e disse que foram feitas em grupo privado. Ele também pediu desculpas e disse que cometeu erro.

Consequências

Até esta segunda-feira, 7, o Conselho de Ética da Alesp recebeu ao menos 11 pedidos de cassação do mandato do deputado estadual. Entre os pedidos está o da presidente da OAB/SP, Patrícia Vanzolini, e do deputado estadual Emídio de Souza. Na foto, é possível vê-los assinando o pedido. 

Patrícia Vanzolini, presidente da OAB, e o deputado Emídio de Souza, assinam pedido de cassação do mandato de Arthur do Val.

Em sua representação por quebra de decoro parlamentar, o deputado Emidio pede que o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar apure o caso. "O presente caso merece, evidentemente, apuração pela quebra de decoro parlamentar; competindo, assim, a este colendo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar afirmar sua repulsa ao sexismo e a qualquer forma de discriminação, reforçando posicionamento de integral solidariedade e respeito às mulheres que se viram aviltadas em sua dignidade pela manifestação do parlamentar, nos termos e conformes dos procedimentos adrede especificados."

De acordo com a CNN, 26 deputados assinaram pedidos individuais e coletivos contra o parlamentar. 

A ministra da Mulher, Família e Direitos humanos, Damares Alves, repudiou as declarações divulgou nota pedindo a cassação do deputado.

Tramitação

Agora, os dez membros do Conselho de Ética devem receber os pedidos, além do próprio Arthur do Val, que poderá apresentar defesa. Após esse retorno, será indicado relator, que pode decidir pelo arquivamento ou pela aplicação de penalidades, como advertência, censura, perda temporária do mandato ou perda do cargo. 

Caso a pena decidida seja pela perda do mandato, o plenário da Casa precisa avalizar a decisão. 

Procedimento disciplinar

O Podemos, partido do deputado, decidiu abrir procedimento disciplinar interno contra ele pelas declarações sexistas. Em nota assinada por Renata Abreu, presidente do partido, as falas do deputado são "gravíssimas e inaceitáveis".

"Gravíssimas e inaceitáveis são as declarações do deputado estadual Arthur do Val, que foram divulgadas na imprensa. Não se resumem ao completo desrespeito à mulher, seja ucraniana ou de qualquer outro País, mas de violações profundas relacionadas a questões humanitárias, em um momento em que esse povo enfrenta os horrores da guerra."

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