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Previdenciário

STF julga alíquota escalonada da reforma da previdência de 2019

Entidade que representa agentes de segurança do Judiciário da União questionou dispositivos da reforma. Pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes suspendeu julgamento.

Da Redação

segunda-feira, 18 de dezembro de 2023

Atualizado às 19:18

STF começou a analisar, no plenário virtual, ação movida pela AGEPOLJUS, entidade representativa da polícia judicial da União, contra dispositivos da reforma da previdência. Porém, após pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes, o julgamento foi suspenso.

Até o momento, ministro relator, Luís Roberto Barroso votou pela procedência parcial da ação, dando interpretação conforme à CF ao art. 149, §1º-A, a fim de que a base de cálculo da contribuição previdenciária de inativos e pensionistas só possa ser majorada em caso de subsistência comprovada de déficit atuarial após adoção de alíquotas progressivas. S. Exa foi seguida pelo decano da Corte, ministro Gilmar Mendes.

Inaugurando divergência, pela ilegitimidade ativa da AGEPOLJU e, subsidiariamente, pela procedência da ação para declarar a inconstitucionalidade dos dispositivos, votou o ministro Edson Fachin, que foi seguido pelas ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber (atualmente aposentada).

Em voto intermediário, ministro Dias Toffoli concordou com Barroso apenas quanto à constitucionalidade da instituição de alíquotas escalonadas e, no restante, seguiu Fachin, votando pela invalidação dos demais artigos.  

O caso

A AGEPOLJUS - Associação Nacional dos Agentes de Segurança do Poder Judiciário da União ajuizou ADIn contra dispositivos da reforma previdenciária (art. 1º, art. 9º, caput e §§4º e 5º e art.11, §§ 1º a 4º  da EC 103/19) que alteraram o art. 149 §§1º, 1º-A, 1º-B e 1º-C da CF. 

Os pontos questionados pela entidade foram os seguintes:

  • Instituição da alíquota de contribuição escalonada, que, de 11%, subiu para faixa de 14% a 22%; 
  • Majoração da alíquota sem previsão de acréscimo no benefício, incorrendo em contribuição sem a contrapartida de melhoria, o que afrontaria o princípio da irredutibilidade de vencimentos;
  • Existência de confisco tributário, pois, a soma das alíquotas da contribuição com as do imposto de renda privam o servidor de 46,5% dos rendimentos;
  • Possibilidade de contribuição extraordinária, a qual, segundo a EC, pode ser instituída em caso de insuficiência do montante da contribuição ordinária e diante da necessidade de equacionar déficit atuarial;
  • Falta de estudos técnicos para demonstrar o desequilíbrio atuarial do regime de previdência.
  • Omissão da União em criar a unidade gestora do regime próprio. O que compromete o levantamento dos dados e impede uma avaliação atuarial segura, não sendo possível dizer se há déficit ou superávit. 

Ao final, a entidade requereu que a União se abstenha da instituição das alíquotas progressivas e de eventual contribuição extraordinária. Também pediu a condenação da União ao pagamento de eventual débito decorrente da cobrança das alíquotas e de contribuição extraordinária. 

Progressividade de alíquotas

Ministro Luis Roberto Barroso, relator do processo, em seu voto, deixou de analisar o art. 9º, §§4º e 5º por "falta de fundamentos jurídicos que embasassem a inconstitucionalidade".

Quanto à progressividade de alíquotas, o ministro as considerou possíveis.

Barroso destacou que os precedentes do STF que invalidaram a progressividade de alíquotas referiam-se a leis de hierarquia inferior. No caso da EC, o ministro considerou que é necessário avaliar se a tributação compromete a subsistência do contribuinte de forma incompatível com o respeito à vida digna.

O ministro apontou que a reforma visou atender ao princípio da capacidade contributiva, estabelecendo alíquotas conforme os salários, sendo a de 22% aplicada apenas a quem recebe mais de R$ 39 mil. S. Exa. considerou justificável o ajuste, uma vez que a alíquota permanecia em 11% há 20 anos.

Em complemento, Barroso afirmou que as faixas de valores estabelecidas na EC serão reajustadas na mesma data e seguindo o mesmo índice dos benefícios do regime geral da previdência. O ministro ressaltou que, ao contrário das faixas do imposto de renda, que permanecem sem correção por longos períodos, as da contribuição previdenciária passam por revisões anuais.

"Não é difícil perceber que, a cada atualização dessas faixas de valores, o peso da contribuição previdenciária para cada servidor diminuirá, uma vez que as alíquotas mais elevadas incidirão a partir de patamares cada vez maiores", completou o ministro. 

Barroso considerou que o valor da contribuição previdenciária deve ser deduzido da base da cálculo do IR. Assim, se o servidor sofrer aumento na tributação de seus rendimentos pela contribuição previdenciária, será beneficiado com uma redução do montante pago no imposto de renda. 

"Tal circunstância, aliada ao fato de que as alíquotas progressivas em ambos os tributos incidem por faixas de valor, já é capaz de demonstrar que a operação matemática a ser feita para se aferir a carga tributária global não consiste em mera soma das alíquotasmáximas dessas duas exações. [...] É incorreto dizer, portanto, que esses dois tributos consomem quase metade da remuneração de quem está no topo da pirâmide do serviço público no Brasil", concluiu Barroso.

Equivalência na aposentadoria

Barroso afirmou que a EC 41/03, ao alterar o art. 40 da CF, introduziu o princípio da solidariedade como característica dos regimes próprios de previdência, permitindo a arrecadação de contribuições por inativos e pensionistas.

Segundo o ministro, esse princípio indica que os indivíduos contribuem não apenas para o custeio de sua própria aposentadoria, mas para a solvência do sistema. Dessa forma, Barroso destacou que o STF já decidiu que não é obrigatória a exata equivalência entre o montante contribuído e o valor da aposentadoria.

Irredutibilidade salarial

Barroso afirmou que se o argumento da irredutibilidade salarial fosse aceito, a carga tributária sobre a folha de pagamento do serviço público seria imutável desde sempre. Ressaltou que o STF já decidiu que o aumento de tributos não configura violação ao princípio da irredutibilidade.

Ampliação da base de cálculo para inativos e pensionistas

Para superar um déficit na previdência, Barroso afirmou que a majoração da base de cálculo de inativos e pensionistas deve, obrigatoriamente, ser antecidida pela majoração de alíquotas.  

O ministro explicou que as alíquotas progressivas impactam todos os segurados e beneficiários - ativos, inativos e pensionistas - independentemente de idade e de renda, tornando-se mais onerosas à medida que as faixas de valor aumentam. 

Por outro lado, S. Exa. afirmou que a ampliação da base de cálculo recai apenas sobre aposentados e pensionistas, que, em geral, encontram-se em situação de maior vulnerabilidade do que os servidores em atividade.

Diante disso, o relator propôs uma interpretação conforme à CF ao art. 149, §1º-A para que a base de cálculo da contribuição de inativos só seja majorada se, comprovadamente, subsistir o défit atuarial após a progressividade das alíquotas.

Contribuição previdenciária extraordinária

O relator entendeu que a hipótese de contribuição extraordinária, ainda que prevista, não foi editada. Nesse sentido, caso venha a ser aprovada posteriormente, S. Exa. ressaltou que o STF poderá ser provocado pra se manifestar. 

"A mera previsão constitucional acerca da possibilidade, em tese, de se criar a contribuição extraordinária não constitui ofensa a cláusula pétrea. Não se pode eliminar de antemão a necessidade de o Poder Público vir a exigir, de forma excepcional, uma carga tributária superior, por força de circunstâncias financeiras e atuariais gravíssimas do regime previdenciário", completou Barroso

Falta de estudo atuarial e de criação de unidade gestora

Ministro Barroso esclareceu que a falta de estudo atuarial não implica vício de inconstitucionalidade, mas irregularidade passível de correção, conforme já decidido pela Corte.

S. Exa. também apontou que no que se refere à omissão na criação da unidade gestora do regime próprio de previdência social da União, o fato de os estudos atuariais do governo Federal serem produzidos pela secretaria Especial de Previdência e Trabalho, vinculada ao ministério da Economia, não prejudicam sua integridade e credibilidade. 

Ao final, o ministro conheceu parcialmente da ADIn para julgar parcialmente procedente o pedido, dando interpretação conforme a CF ao art. 149, §1º-A, com a redação dada pela EC 103/19, a fim de que a base de cálculo da contribuição previdenciária de inativos e pensionistas só possa ser majorada em caso de subsistência comprovada de déficit atuarial após adoção de alíquotas progressivas.

Ministro GIlmar Mendes seguiu o voto do relator na integralidade.

 (Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress)

Pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes suspendeu análise de dispositivos da reforma da Previdência de 2019.(Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress)

Divergência

Em seu voto, ministro Edson Fachin divergiu do relator.

Segundo S.Exa., a AGEPOLJUS não teria legitimidade ativa para propor a ADIn, por não ostentar a qualidade de entidade de classe com representação nacional, representando apenas fragmento da carreira de técnicos Judiciários da União. 

Contudo, considerando a possibilidade de a ADIn ser conhecida, Fachin examinou o mérito, entendendo que não há justificativa para a cobrança da contribuição de inativos em bases majoradas em relação aos trabalhadores em geral, nem para a instituição "aberta e difusa" de contribuições extraordinária sob alegação de "déficit".

Fachin destacou a falta de clareza no conceito de "déficit" e na margem que admitiria a contribuição excepcional. Segundo S.Exa., a redação não estabelece parâmetros claros de segurança jurídica, o que poderia resultar em uma situação de confusão e insegurança para a previdência do servidor.

"A  perda  das  balizas  da  razoabilidade,  da  vedação  ao  excesso  que acarreta verdadeiro sacrifício de direito , a instituição de um regime que pereniza a exceção e a surpresa, a exemplo do novel art. 149 e dos seus parágrafos,  não  é,  a  meu  sentir,  constitucional,  porquanto  violadora  da segurança jurídica e da vedação à instituição de tributo confiscatório".

Assim, negou seguimento à ação por ilegitimidade ativa da entidade de classe e, subsidiariamente,  caso  conhecida  a  ação,  divergiu do  relator  para julgar procedente a ação declarando inconstitucionais os §§ 1º, 1º-A, 1º-B e 1º-C do art. 149 da CF, na redação dada pelo art. 1º da EC nº 103/2019.

Ministro Fachin foi seguido pelas ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber (atualmente aposentada).

Voto intermediário

Ministro Dias Toffoli, a seu turno, acompanhou Barroso quanto à progressividade das alíquotas. Entretanto, quanto à tributação adicional - extraordinária -  acompanhou ministro Edson Fachin. 

"Instituiu-se, como se vê, um regime mais gravoso, sem qualquer justificativa especial, em face dos servidores ativos, aposentados e pensionistas vinculados ao RPPS para se equalizar um alegado deficit, o qual, reitero, igualmente pode atingir o RGPS", afirmou Toffoli.

Ao final, votou por conhecer em parte da ADIn e, divergindo parcialmente de Barroso, julgou parcialmente procedente os pedidos para declarar a inconstitucionalidade dos §§ 1º-A, 1º-B e 1º-C, do art. 149 da CF, na redação conferida pela EC nº 103/19.

Processo: ADIn 6.731

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