CNJ: Normas contra litigância abusiva não podem limitar acesso à Justiça
Entendimento do plenário reforçou que medidas contra abusos não podem comprometer garantias.
Da Redação
quinta-feira, 2 de outubro de 2025
Atualizado às 18:56
O plenário do CNJ decidiu que normas voltadas à prevenção da litigância abusiva não podem restringir o direito fundamental de acesso à Justiça.
O entendimento foi firmado em consulta apresentada pelo juiz de Direito Walter Pereira de Souza, da 1ª turma Recursal do TJ/MT, e relatada pela conselheira Mônica Autran Machado Nobre.
Justiça gratuita e comprovação de hipossuficiência
Na consulta, o juiz questionou se a simples declaração de pobreza feita pela parte poderia ser afastada pelo magistrado sem indícios objetivos, impondo a exigência automática de documentos comprobatórios.
Sobre a questão, a relatora entendeu que a presunção legal de hipossuficiência prevista no art. 99, §§ 2º e 3º, do CPC e no art. 1º da lei 7.115/83 deve prevalecer. Conforme a conselheira, a exigência de documentos só é admitida em caráter de contraprova, quando houver elementos concretos que a infirmem.
Exigência de esgotamento da via administrativa
O magistrado também indagou se o prévio esgotamento da via administrativa poderia ser imposto como condição para o ajuizamento de ações judiciais.
Para a relatora, essa exigência não constitui regra geral. Segundo afirmou, ela só é válida nos casos expressamente previstos em lei ou reconhecidos pela jurisprudência consolidada.
Diante disso, o conselho, por maioria, respondeu a consulta no sentido de que:
a) a recomendação CNJ 159/24 tem como objetivo prevenir abusos processuais e litigância predatória, não podendo ser interpretada para restringir direitos ou garantias fundamentais, já que o espírito do normativo é justamente otimizá-los;
b) a exigência de comprovação documental de hipossuficiência deve respeito, em todo caso, à presunção legal prevista no art. 99, §§ 2 e 3 do CPC e no art. 1º da lei 7.115/83, sendo admitida em caráter de contraprova, quando houver elementos concretos que a infirmem;
c) o prévio esgotamento da via administrativa não constitui condição obrigatória para a caracterização do interesse de agir, exceto nos casos expressamente previstos em lei ou nas hipóteses excepcionais expressamente reconhecidas pela jurisprudência consolidada; e
d) recomenda-se ainda, em todo caso, a interpretação sistemática das diretrizes estabelecidas pela recomendação CNJ 159/24, promovendo sua aplicação com cautela e de forma devidamente fundamentada, em modo de concordância prática com outros direitos e garantias fundamentais, de forma a assegurar a segurança jurídica e a eficiência na prestação jurisdicional.
Divergências
Apesar da maioria do plenário acompanhar a conselheira, posições divergentes foram registradas:
- Divergência parcial: A conselheira Daniela Pereira Madeira, acompanhada por outros membros, entendeu que o CNJ não deveria se manifestar sobre o item referente ao esgotamento da via administrativa, uma vez que o tema está sendo analisado pelo STJ em incidente de demandas repetitivas. Segundo afirmou, uma manifestação prematura poderia gerar insegurança jurídica.
- Divergência pelo não conhecimento: O conselheiro Alexandre Teixeira defendeu que a consulta não deveria sequer ser conhecida, por entender que o juiz apenas buscava confirmar teses já firmadas e obter a validação do CNJ para seu posicionamento pessoal. Conforme destacou, eventuais práticas equivocadas sobre Justiça gratuita ou esgotamento administrativo devem ser discutidas no âmbito jurisdicional, não em consulta administrativa ao Conselho.
Processo: 0007079-20.2024.2.00.0000
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