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Porandubas nº 407

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Atualizado às 07:01

Da burrice e da engenharia

Abro a coluna com uma historinha mineira.

Viajando pelo interior de Minas, o arquiteto Marcos Vasconcelos encontrou um grupo de trabalhadores abrindo uma estrada :

- Esta estrada vai até onde ?

- Muito longe, muito longe, doutor. Atravessa o vale, retorce na beirada da serra, quebra pela esquerda, retoma pela direita, desemboca em frente, e vai indo, vai indo, até chegar a Ponte Nova, passando pelos baixios e cabeceiras.

- Vocês têm engenheiro, arquiteto, teodolito, instrumentos de medição ?

- Num tem não, doutor. Nós tem um burro, que nós manda ir andando, andando. Por onde ele for, aí é o melhor caminho. Nós vai picando, picando.

- E quando não tem burro ?

- Aí não tem jeito, doutor ; nós chama um engenheiro mesmo.

O arquiteto seguiu adiante filosofando sobre as artes da burrice e da engenharia.

O cenário político

O olhar na paisagem permite divisar a direção do vento. Vê-se uma gradativa queda da avaliação do governo Dilma, com tendência a bater na sua imagem e nos índices de intenção de voto. Mas a presidente continuará com a forte visibilidade, podendo resgatar algumas posições. Contará com o dobro de TV de Aécio Neves, a partir de 20/8. Terá dois imensos desafios : sustar sua crescente queda no Sudeste e sustentar seus índices no Nordeste, onde chegou a bater a oposição, em 2010, por 12 milhões de votos.

BA, PE e CE

Esses três Estados constituem um desafio especial : a BA é o maior eleitorado da região nordestina. Hoje, os ventos correm em direção a Paulo Souto, candidato ao governo pelo DEM, com apoio do PMDB e do PSDB. Dilma não terá na BA a votação de 2010. O mesmo se pode dizer em relação a PE e ao CE. No primeiro, Eduardo Campos deverá ser amplamente vitorioso, tirando preciosos votos da candidata ; no CE, apesar de contar com o apoio dos Gomes - Cid e Ciro - e do candidato Eunício de Oliveira, do PMDB, não terá a votação de 2010, porque o PMDB está coligado com o tucano Tasso Jereissatti. Aécio vai ter boa votação na terra do Padim Ciço.

Rejeição

A taxa de rejeição da presidente Dilma em SP assusta. Chega a 43% junto ao maior eleitorado brasileiro. É possível diminuir esse índice, deixando-o na metade ? Sim. Mas essa tarefa será árdua. Precisa contar com alavancas de adesão muito fortes, a partir de sensível melhora na economia. Precisa que Lula corra todo o Estado e os bairros da capital, fazendo um corpo a corpo intenso. Precisa que o prefeito Fernando Haddad melhore sua avaliação junto ao munícipe. Precisa que a candidata entre em um mutirão de corpo a corpo. Esta campanha, mais que outras, exige o candidato nas ruas.

Aperto no bolso

Já é possível ver o bolso dos integrantes das classes médias mais apertado. A inflação das ruas - que se pode medir nas feiras livres - começa a ser expressa de forma indignada na linguagem de donas de casa que se queixam de uma cesta básica que encarece a olhos vistos. É evidente que esse bolso mais apertado influi no processo decisório do voto. Como sempre lembro : bolso com menos dinheiro significa geladeira mais vazia, barriga roncando alto, coração indignado e cabeça revoltada. Daí o desafio que se impõe à presidente Dilma : evitar o estouro da boiada nas ruas.

Um voto do contra

Este consultor identifica um voto do contra se expandindo em muitos espaços. Trata-se de um voto contra o status quo, a situação de sempre, a lengalenga da velha política. Esse voto é de protesto, não necessariamente a favor de A ou B. Claro, que acaba beneficiando alguns atores da política.

SP, a grande batalha

Non ducor, duco. "Não sou conduzido, conduzo". O lema do brasão da cidade de SP, criado em 1916 pelo prefeito Washington Luiz, que veio a assumir, depois, a presidência da República, expressa de modo adequado a importância do Estado mais poderoso da Federação no pleito eleitoral. Ancorando a hipótese, eis densa lista de superlativos : cerca de 32 milhões de eleitores ; as mais populosas classes sociais, com destaque para três contingentes de classe média ( A, B e C) e super-povoadas margens sociais ; os maiores conglomerados de categorias setoriais, abarcando trabalhadores e profissionais liberais ; centrais sindicais e entidades de áreas produtivas ; movimentos organizados, que promovem intensa mobilização e abrem a locução das ruas ; núcleos em defesa de direitos humanos, minorias e igualdade de gêneros ; e, para dar vazão às demandas dessa gigantesca teia de representação, SP dispõe de vigorosa tuba de ressonância.

A força além do PIB

A força de SP vai além da liderança no ranking eleitoral, com seus 23% do eleitorado brasileiro. Outros parâmetros entram na abordagem. O Estado exibe o maior grupamento de eleitores racionais, fator decisivo para avanços na esfera política. A racionalidade transparece no voto ponderado, na comparação entre perfis, na cobrança aos governantes, nas mobilizações de setores e nos movimentos reivindicatórios, a denotar a emergência de uma força centrípeta que se expande. Tal percepção provém da organicidade social. Ao longo dos últimos anos, a comunidade criou múltiplas ilhas no arquipélago do poder, tornando-as canais para fazer chegar demandas aos governantes e representantes, praticando, assim, exercícios de democracia direta.

A metrópole

O epicentro dessa movimentação é a capital, SP, com quase nove milhões de eleitores, eleitorado maior do o que de 23 Estados brasileiros, perdendo apenas para o próprio Estado, MG (15.248.680), RJ (12.141.143) e BA (10.185.417). A metrópole impregna-se de vibração, com suas regiões (norte, sul, leste e oeste) exibindo identidades peculiares (polos habitacionais, industriais e de serviços) e incorporando os adereços estéticos dos espaços chiques.

O Triângulo das Bermudas

Costuma-se dizer que o pleito será decidido pela passagem do transatlântico eleitoral pelo Triângulo das Bermudas, constituído por SP, MG e RJ, os três maiores colégios. Ou ainda que Minas é quem decide, sob o argumento de que o Estado do Sudeste é uma encruzilhada que representa a síntese do país. Ora, quando há na disputa dois candidatos mineiros (Aécio e Dilma), a tese parece fraquejar. O fato é que SP possui os maiores exércitos da guerra eleitoral. As ondas de seu mar costumam empurrar para longe os eventos que geram : protestos, denúncias, discursos positivos/negativos, avaliações de candidatos, percepções sobre o cotidiano. Na simbologia da pedra jogada no meio da lagoa (associada à classe media), o Estado é a força centrípeta que faz as marolas chegarem às margens.

As alavancas

As alavancas de empuxo são constituídas pelas classes médias, a emergente classe média C, com suas demandas em torno do "quero mais e melhor" ; a tradicional classe B, onde os índices de racionalidade são altos ; e a classe média A, de renda elevada. (A propósito, as classes médias somam, hoje, mais de 50% da população brasileira, cerca de 105 milhões de pessoas). Os discursos mais críticos e salientes provêm desses aglomerados, que se unem em cobranças e na disposição de votar contra o status quo. Tal posicionamento pode resultar nos chamados "não votos", contabilizados hoje pelas pesquisas em cerca de 30%, soma de abstenção, votos nulos e brancos.

O cabo de guerra

Por isso mesmo, SP viverá um disputado "cabo de guerra" entre as classes médias e os entrincheirados nos bastiões trabalhistas atrelados ao Estado, que tentarão segurar suas mãos nas alças do poder. A batalha eleitoral aponta, ainda, para dois territórios diferenciados : o da metrópole, onde o nível de insatisfação e angústia atinge índices elevados em decorrência dos problemas rotineiros (congestionamentos, violência, serviços públicos precários) ; e o do interior, habitado por populações menos estressadas, orgânicas e integradas aos valores de uma rotina mais harmônica. Nunca foi tão forte o clamor pela micro-política, programas e projetos destinados às melhorias da estrutura urbana. À frente das bandeiras, desfilam grupos organizados, categorias profissionais sob comandos de novas lideranças e movimentos que pregam ruptura. Em suma, o nível de conscientização - gerando um voto autônomo - é mais elevado.

Padilha subirá ?

O candidato Alexandre Padilha tende a chegar entre 15% a 20% da intenção de voto. Será puxado por Lula, que ainda tem força para arregimentar os bastiões do petismo e mobilizar as margens sociais. Daí a projeção de polarização entre petismo e tucanismo. Alckmin está bastante confortável, mas poderá ser atacado mais adiante, caso a água comece a faltar nas torneiras. Até o momento, reagiu bem ao tiroteio da oposição e ao bombardeio midiático.

Os 54% de Alckmin

Geraldo Alckmin conseguirá segurar os 54% obtidos na última pesquisa Datafolha ? Este consultor acha que ele bateu no teto. Será razoável apostar numa queda ao correr da campanha. Seu índice estará entre 40% a 45% na beirada da campanha.

TV não faz milagres

Quem estiver confiando em programa eleitoral para alavancar seu nome poderá acertar apenas parcialmente. Há uma percepção por parcela ponderável do eleitorado de que os programas eleitorais, mesmo bem feitos, exageram na cosmética e nas promessas. Trens balas, fura-filas, hospitais do primeiro mundo já foram mostrados em maquetes espetaculares. As promessas não foram cumpridas. A desconfiança grassa.

Recessão bate a porta

Há quem veja a recessão nos horizontes, tendo em vista a projeção de um PIB com resultados negativos no segundo e no terceiro trimestre do ano.

Venda de energia

Ante o aumento de cerca de 20% no preço da energia, alguns grupos, que têm amplos contratos de compra, passaram a fazer disso um negócio : vendem energia no mercado e fecham unidades industriais. Conseguem ter mais lucro com essa exótica operação invertida.

Itaquerão sem segurança

No primeiro jogo pós-Copa realizado no Itaquerão, os torcedores se depararam com um show de improviso. Em vez de contratar empresas de segurança privada e vigilância sérias, a organização do time optou por empregar vigias autônomos - função que não existe, uma vez que o profissional de segurança deve estar registrado numa empresa especializada, possuir o Certificado de Conclusão do Curso de Formação de Vigilantes, devidamente registrado na Polícia Federal e a CNV - Carteira Nacional do Vigilante para exercer a atividade. O presidente do Corinthians é Mario Gobbi, delegado de polícia.

Clandestinas

O combate às empresas clandestinas e aos vigias autônomos é um dos pilares do SESVESP (Sindicato das Empresas de Segurança Privada, Segurança Eletrônica e Cursos de Formação do Estado de São Paulo). "Devemos alertar a sociedade quanto ao despreparo dessas empresas e de vigias que trabalham por conta própria, e o quanto eles colocam em risco a vida de todos os torcedores que querem se divertir de maneira segura", afirma João Palhuca, presidente do SESVESP.

Conselhos

A coluna vai aproveitar o ciclo eleitoral para oferecer sugestões aos atores políticos e a suas equipes :

Aos candidatos

1. Procurem expressar a característica mais importante de sua identidade - o foco.

2. Não esqueçam que o eleitor deseja travar conhecimento com o personagem. Circular no meio da massa é importante.

3. Façam grande esforço para multiplicar presença em vários locais - a onipresença é um valor insuperável. Planejar eventos rápidos em lugares e cidades diferentes em um mesmo dia.

Aos assessores

1. A lei da verdade suplanta a lei da mistificação.

2. O eleitor sabe se o candidato foi aumentado artificialmente um palmo ou dois acima de sua altura.

3. Falar com o coração é mais eficaz do que falar pela cabeça.

4. Agir com grandeza, sem golpes baixos, até o fim.

5. Prometer apenas o que poderá ser cumprido. Demonstre a viabilidade.

6. Tenha fé e não desista até o último segundo.