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A concessão de benefícios indiretos a empregados e os reflexos previdenciários, trabalhistas e fiscais

As empresas devem rever seus procedimentos para garantir que a concessão de benefícios indiretos seja realizada de acordo com a legislação.

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Atualizado em 19 de janeiro de 2015 13:38

É comum as empresas concederem aos seus empregados e executivos uma série de benefícios indiretos, também chamados de "fringe benefits", tais como veículos, auxílio-combustível, vale-refeição, aparelhos celulares, planos de saúde, planos de previdência social, reembolso de despesas médicas, bolsas de estudo, cursos de idiomas etc.

Os benefícios indiretos certamente tornam o emprego mais atraente e tem funcionado bem como diferencial para atrair e reter talentos.

Contudo, é preciso que as empresas adotem alguns cuidados na concessão de tais benefícios, a fim de mitigar eventuais problemas com relação a natureza jurídica destes benefícios e que poderão resultar em questionamento das autoridades e também mitigar riscos de reclamações por parte dos próprios empregados.

Em primeiro lugar, é recomendável formalizar a concessão dos incentivos por intermédio da elaboração e aprovação de claras e objetivas políticas internas contendo todos os detalhes da concessão (beneficiários, condições de uso/fruição, eventual prazo, restrições aplicáveis, obrigações por parte do empregado e da própria empresa etc.), bem como termos de ciência/termos de compromisso a serem assinados por cada empregado.

Ainda nessa linha, é importante que as empresas tenham o devido controle sobre os benefícios indiretos, por meio de manutenção de contratos, termos, recibos, faturas, comprovantes de pagamento, notas fiscais etc., a fim de fiscalizar o correto uso/fruição por parte dos empregados.

Em segundo lugar, é imprescindível que as empresas analisem de forma específica a natureza e a forma de concessão para identificar se o benefício indireto deve ou não ser caracterizado como rendimento do trabalho assalariado. Destacamos que tal análise deve feita individualmente, levando em conta cada tipo de benefício indireto e a população de trabalhadores beneficiada, tanto no âmbito trabalhista, como no previdenciário e ainda no fiscal, já que cada legislação traz disposições específicas.

No âmbito previdenciário, de acordo com a lei 8.212/91 (Lei Orgânica da Previdência Social) e com o decreto 3.048/99 (Regulamento da Previdência Social), a contribuição previdenciária devida pelas empresas incide sobre o total da remuneração paga ou creditada a qualquer título ao segurado empregado e demais trabalhadores sem vínculo empregatício.

A lei 8.212/1991 define, como base de cálculo da contribuição previdenciária, a totalidade dos rendimentos pagos, a qualquer título, durante o mês, destinados a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa.

Somente não haverá incidência de contribuição previdenciária sobre as verbas de natureza nitidamente indenizatória, bem como sobre as verbas que estiverem expressa e taxativamente indicadas como isentas na lei 8.212/1991 (parágrafo 9º, artigo 28).

Logo, é necessário avaliar se os benefícios indiretos concedidos são isentos de contribuição previdenciária ou, não estando expressamente isentos na legislação, se a sua natureza seria indenizatória.

Já no âmbito trabalhista, de acordo com a Consolidação das Leis Trabalhistas ("CLT"), os benefícios, com reflexos econômicos para os empregados, concedidos de forma habitual e gratuita em retribuição aos serviços prestados, integram o salário para todos os efeitos legais e as condições de trabalho. Via de regra, a matéria é regulada pelo artigo 458 da CLT e súmulas específicas dos tribunais.

Assim, é também preciso avaliar se determinado benefício indireto deve ser configurado como retribuição pela prestação de serviços, situação em que estará sujeito aos depósitos ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço ("FGTS"), além da integração na base de cálculo dos direitos trabalhistas (13º salário, férias, 1/3 de férias, aviso prévio etc.).

Por sua vez, cabe mencionar que, no âmbito fiscal, todos os rendimentos do trabalho assalariado estão sujeitos à incidência do IRRF calculado de acordo com a tabela progressiva (alíquota de 0% até 27,5%). Muito embora seja utilizado o conceito de trabalho assalariado previsto nas leis trabalhistas e previdenciárias, a legislação fiscal também enumera os valores que deverão integrar os rendimentos do trabalho assalariado e indica determinados benefícios que poderão ser excluídos da tributação.

Outra questão importante no âmbito fiscal diz respeito à dedutibilidade dos benefícios indiretos da base de cálculo do IRPJ/CSL. Como regra geral, os valores relativos à remuneração são plenamente dedutíveis. Mas, no que se refere aos benefícios indiretos, se não forem caracterizados como rendimentos do trabalho assalariado, é preciso verificar se poderiam ser considerados como despesas operacionais (despesas usuais, normais e necessárias da empresa) para que sejam integralmente dedutíveis.

A avaliação de cada benefício indireto conforme as leis previdenciária, trabalhista e fiscal é relevante para garantir a uniformidade no tratamento legal, evitando possíveis cobranças e autuações relacionadas que podem implicar grandes contingências para as empresas. Desse modo, é imprescindível que, se determinado benefício seja considerado como salário, ou não, assim o seja para todos os fins.

Eventuais incongruências no tratamento legal dos benefícios indiretos podem gerar diversos problemas para as empresas, especialmente em vista do recente decreto 8.373/14, publicado em dezembro de 2014, que instituiu o Sistema de Escrituração Digital das Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas, o chamado "E-Social".

Note-se que o E-Social é um projeto do Governo Federal que busca unificar todas as informações relativas às obrigações fiscais, previdenciárias e trabalhistas. Com a adoção desse novo sistema, todos os dados relativos aos empregados serão centralizados, permitindo o cruzamento das informações. Tal cruzamento certamente implicará maior fiscalização em termos de cumprimento e observância aos direitos sociais dos empregados.

Até então, muito embora com a criação da Super Receita em 2007 as Autoridades Previdenciárias e Fiscais já tivessem um canal mais direto de comunicação, agora com o E-Social a expectativa é de que as Autoridades Trabalhistas, Previdenciárias e Fiscais compartilhem o máximo de informações, identificando com mais facilidade divergências e falhas relacionadas aos pagamentos feitos aos empregados.

Cabe apontar que o E-Social ainda precisa ser regulamentado, sendo necessário aguardar uma Resolução Conjunta do Comitê Gestor do sistema que indicará o cronograma de implementação e também esperar a edição do Manual de Orientações.

De todo modo, e mesmo antes da efetiva implementação do E-Social, as empresas devem rever seus procedimentos para garantir que a concessão de benefícios indiretos seja realizada de acordo com a legislação, afastando assim o risco de geração de passivos previdenciários, trabalhistas e fiscais.

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* Cristiane Ianagui Matsumoto Gago é sócia da área previdenciária do Pinheiro Neto Advogados.

** Thiago Teno é associado da área trabalhista do Pinheiro Neto Advogados.

*** Mariana Monte Alegre de Paiva é associada da área tributária do Pinheiro Neto Advogados.





 

*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

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