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Previsões para 2005

terça-feira, 14 de dezembro de 2004

Atualizado em 13 de dezembro de 2004 12:10

Francisco Petros*


Previsões para 2005


Um dos maiores paradoxos da ciência econômica é o fato de que a formação dos preços das mercadorias e dos contratos ocorre em função das expectativas, mesmo que estas não sejam confirmadas pelos fatos. Como existe uma distância e tanto entre aquilo que se prevê e o que ocorre na realidade, os ajustes no sistema de preços podem ser fenomenais, extraordinários e até mesmo destrutivos. O período de final de ano é particularmente interessante para analisar este processo. Os economistas e analistas se dedicam com afinco à elaboração de projeções e estimativas. Normalmente, não gastam tempo revisando o passado e entendendo a razão de eventuais erros cometidos em projeções anteriores. A análise da história sempre foi parte integrante e essencial do estudo econômico, mas é quase sempre relegada à margem quando se trata de projeções do final de ano.

No início deste ano, os principais economistas do mercado financeiro, participantes da Pesquisa Focus do Banco Central do Brasil (BC) previam que a inflação, medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor - Amplo) iria ser da ordem de 6% em 2004. Na realidade este indicador deve ser entre 7,4% e 7,6%. A taxa de câmbio (real versus dólar dos EUA) esperada para o final de ano era de R$ 3,10. Deve fechar o ano ao redor de R$ 2,80. Um erro de previsão cerca de 10%. A taxa de juros básica (Selic) estava prevista para fechar ao ano ao redor de 13,5% e com tendência de declínio. Nesta semana o BC deve elevar esta taxa para 17,75% ao ano e deve continuar subindo no início de 2005. A previsão neste caso estava completamente equivocada, seja numericamente seja qualitativamente. A previsão de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) era de 3,6% em 2004. O crescimento deve ser de pouco mais de 5,0%. No que se refere ao indicador da relação de dívida líquida do setor público / PIB a previsão era de 56% ao final de 2004. Deve ser de 53%. A previsão para a balança comercial deste ano era de um resultado de US$ 20 bilhões. Deve ser de US$ 33 bilhões, 65% superior ao estimado pelos economistas do "mercado". O mesmo ocorreu na previsão do saldo de transações correntes (que também decorre do resultado da balança comercial): a previsão era de um déficit de US$ 2,6 bilhões. Devemos fechar o ano com um superávit de quase US$ 11 bilhões! Bem, houve um indicador cujas projeções foram quase certeiras: o superávit primário deve gravitar ao redor de 4,5% do PIB. Ufa! Que bom! Acertaram!

Se alguém pensa que a atividade de elaborar previsões é tão ingrata somente no Brasil pode retirar esta impressão da cabeça. Trata-se de uma atividade ingrata universalmente. Os wall streeters erram tanto ou mais que os economistas nativos. E os efeitos destas previsões são muito mais significativos em função da importância que estes têm na formação do sistema de preços da economia global.

A despeito desta constatação não devemos desprezar as previsões sobre as principais estatísticas. Ao contrário: é preciso levá-las com seriedade, mas agregar um ingrediente muito importante a estas: o "espírito crítico" que permite que ao lado de números objetivos seja acrescentado um rigoroso acompanhamento das tendências. Estas últimas permitem que se "normalize" a precisão dos números e indicadores. Por exemplo: é uma tarefa hercúlea se fazer previsão sobre o déficit fiscal dos EUA. Há vários fatores que podem determinar de forma exógena um maior ou menor déficit fiscal. O principal dentre estes fatores é o dispêndio com o aparato militar utilizado para a manutenção da segurança interna e externa do país. Ora, neste caso, a pergunta a se fazer é: há alguma evidência de que as tensões geopolíticas irão se reduzir em 2005? Acredito que a resposta correta seja "não". Se os leitores tiverem a mesma opinião e considerando-se as variáveis "normais" do ciclo econômico mundial (em termos de crescimento, etc.) não há nenhuma evidência de que o déficit de aproximadamente 6% do PIB seja reduzido. De outro lado, este pode até crescer no ano que vem... Trata-se apenas de uma especulação provida de alguma racionalidade.

Observadas as principais variáveis que podem influenciar o andamento da economia mundial em 2005 (déficit fiscal e externo dos EUA, a cotação do petróleo, a relação entre as principais moedas internacionais, as tensões geopolíticas no Oriente Médio e na Coréia do Norte) verificamos que as "tendências" destas variáveis estão, no que tange a sua previsibilidade, muito opacas. Não é nem um pouco óbvio que o ano será necessariamente bom. Também não é possível ser categórico e dizer que ele será ruim. Há muito que se pesar na análise de cada um dos principais pontos que estão a influenciar o dia-a-dia das cotações dos ativos e dos contratos.

Se os leitores estiverem de acordo comigo - e é provável que muitos não estejam - a melhor postura em relação às estratégias de investimentos, seja nas carteiras de aplicações, seja nos investimentos corporativos, é a de ter cautela. Isso significa que os investidores têm de ser pacientes em relação ao timing de suas decisões, bem como prudentes em relação à magnitude dos esforços financeiro e humano que empenharão para a realização de seus objetivos.

É relativamente incomum que se recomende cautela quando se trata de estratégias financeiras e corporativas. Afinal de contas, é preciso reconhecer que em certas circunstâncias a capacidade de se elaborar previsões e estimativas é diminuta. Parece-me que seja o caso do ano de 2005. Não me arrisco ainda em tentar prevê-lo. Prefiro ler as previsões que estão à solta por aí.
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* Economista e pós-graduado em Finanças. Foi Vice-Presidente e Presidente (1999-2002) da APIMEC - Associação Brasileira dos Analistas e Profissionais do Mercado de Capitais (São Paulo).







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