Política, Direito & Economia NA REAL

Política e Economia NA REAL n° 255

Uma leitura política e econômica sobre o governo Dilma.

30/7/2013

Leitura política e econômica de uma entrevista - I

A entrevista concedida pela presidente Dilma Rousseff à Folha de S.Paulo, publicada neste último domingo, é muito ilustrativa para o delineamento do provável rumo político e econômico do país nos próximos meses. De fato, a presidente confundiu convicções sobre princípios políticos com convicções sobre medidas políticas (e econômicas). Os primeiros dizem respeito à necessária visão republicana da política. Já as segundas dizem respeito à condução de certas políticas de governo. Ora, a confusão dos dois conceitos pela presidente resulta num quadro preocupante no qual se combinam diagnósticos errados sobre a condução do governo com soluções inadequadas. Vejamos algumas das conclusões extraídas da entrevista presidencial e os aspectos que devem prevalecer nos próximos meses nas decisões governamentais :

1. Inflação : não há grandes riscos para a alta dos preços. A meta de inflação é secundária na gestão da política monetária. Basta ver que FHC não a cumpriu quase sempre ;

2. Política fiscal : a execução fiscal não é problemática e não deve haver maiores contenções dos gastos públicos. Além disso, não vê a presidente risco fiscal devido à redução da atividade econômica ;

3. Câmbio : um problema incontornável, não há o que fazer, pois é fruto das intempéries externas ;

4. Guido Mantega : o homem certo no lugar certo suportado por uma lealdade canina do Planalto ;

5. Base aliada : será mantida, basicamente, às custas dos 39 ministérios e, nas demandas pós-manifestações juninas, precisa ser "submetida ao povo", via plebiscito ;

6. Ministros e ministérios : são auxiliares sem poder de decisão e cobrados na medida da capacidade e intensidade de trabalho da presidente ;

7. Empresários e setor privado : não são aliados, mas apenas a outra parte de um processo negocial ;

8. Lula : um copresidente com o qual as divergências são normais (e antigas, desde 2005 quando era ministra da Casa Civil). Assim sendo, não precisa voltar porque não saiu ;

9. Investimentos : precisam crescer e, para isto, na essência, dependem do impulso estatal. Os leilões e concessões que devem ocorrer no segundo semestre vão dar este impulso ;

10. Controle da mídia : a questão é controlar as empresas e não a opinião das empresas, mas ainda não se sabe como fazê-lo. Mas, será feito (um dia ?)

Leitura política e econômica de uma entrevista - II

A entrevista da presidente joga um balde d'água fria na expectativa de que existam substanciais alterações na política e na economia nos próximos meses. Isso dependerá muito mais da evolução dos fatos do que da percepção da presidente. Esta última parece obscurecida por uma mistura de arrogância pessoal combinada com teimosia e miopia política. Se houver mudança por força dos fatos, esta será feita contrariando o desejo e o humor da presidente e não como resultado do natural processo político de reavaliação pelo qual "mudam os fatos, mudo de opinião". Com efeito : a perda de legitimidade política do governo, fruto da queda de popularidade, tornará a política e a economia muito mais arriscadas em função da visão de Dilma. As notas a seguir mostram um pouco dos riscos à vista.

Leram mesmo ? Se leram, não entenderam - I

Tanto a presidente Dilma quanto o Congresso estão se vangloriando de ter lido com clareza e entendido perfeitamente os recados que os movimentos populares espalharam pelo país em julho. Não é o que parece, porém. O Congresso, depois de algumas medidas mais demagógicas do que reais, foi descansar em berço esplêndido, num recesso branco incompatível com a lei e suas obrigações. Os parlamentares não poderiam ter abandonado Brasília nos últimos 15 dias sem antes votarem a LDO. A volta tem tudo para repetir a rotina de sempre. Disputas com o Palácio do Planalto, pressões políticas, chantagens, vinganças (ver nota abaixo). Se a sociedade não ficar atenta, com manobras políticas para facilitar a vida eleitoral de todos no ano que vem.

Leram mesmo ? Se leram, não entenderam - II

A presidente Dilma, em pelo menos três ocasiões públicas na semana passada, também deu mostra que sua leitura dos acontecimentos foi um tanto "vesga" : (1) na recepção do Papa, de forma extemporânea (por ser uma propaganda explícita do governo numa sessão em que o personagem era outro) ; (2) no discurso na festa do PT em Salvador ; (3) na entrevista exclusiva à colunista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, domingo, sobre a qual comentamos nas notas anteriores. O extenso palavrório pode ser resumido : "está tudo bem com o Brasil, o que não estiver estamos prontos para consertar, atendemos o que as ruas pediram". Há controvérsias em relação a este otimismo. Ele está expresso na abrangente pesquisa realizada pelo Ibope por encomenda da Confederação Nacional da Indústria, divulgada na semana passada. Ela vai muito além da confirmação da queda vertiginosa da popularidade da presidente (com sobra também para boa parte dos governadores) e da avaliação de seu governo, o destaque a sondagem na maioria da mídia. É, na realidade, um retrato estatístico, com números contundentes, da insatisfação das ruas e seus porquês.

Três constatações relevantes da Pesquisa CNI-Ibope

1. 91% dos entrevistados acham que os impostos são altos demais no Brasil.

2. 87% da população concordam total ou parcialmente com a afirmação de que "o governo já arrecada muito e não precisa aumentar mais os impostos para melhorar os serviços públicos".

3. As respostas dos governantes e do Congresso Nacional não foram vistas de maneira positiva pela população. Mais de 30% dos entrevistados reprovaram totalmente essas respostas.

Vale a pena ler o excelente resumo dos pontos fulcrais da entrevista feito pelo jornalista Ricardo Noblat em seu blog (clique aqui). Com estes dados e as lições deixadas pelo papa Francisco por aqui, governo e oposições têm um roteiro seguro para agir e dar mais fé e confiança à sociedade. Ou agem nesta linha ou vão colher outros dissabores. Já está em pleno andamento a montagem de uma manifestação popular "como nunca antes vista neste país" para o feriado de 7 de setembro, o chamado Dia da Pátria.

Uma semana de paz. E depois... - I

Com o Congresso em recesso e o papa Francisco, com seus incômodos recados de volta a Roma, a presidente Dilma terá uma semana de relativo sossego, antes de mergulhar em alguns turbilhões previstos para perturbar sua paz em agosto e setembro. Em agosto, os embates serão com o Congresso, crônicas de crises anunciadas. Além das queixas mais recentes dos parlamentares, seus partidos aliados contra a condução da política de relações com o Congresso e da política econômica por Dilma, algo meio difuso, há um contencioso concreto para a presidente enfrentar no Legislativo - a questão de três vetos que ela apôs a propostas aprovadas na Câmara e no Senado, a saber :

1. Ao fim da multa adicional de 10% do FGTS dos trabalhadores demitidos por justa causa.

2. A obrigação do governo Federal ressarcir os Estados das perdas de receita referentes a benefícios fiscais concedidos pela União utilizando impostos partilhados (IPI e IR).

3. A prorrogação, até 2014, do Reintegra, programa de compensação a exportadores.

Uma semana de paz. E depois... - II

Derrubar vetos presidenciais era quase impossível até recentemente - poucos caíram nos últimos 20 anos. O Congresso chegou a acumular até recentemente mais três mil desses vetos sem votá-los. Recentemente, depois de trocas de farpas e acusações entre Executivo e Legislativo, por iniciativa do presidente do Senado, Renan Calheiros, criou-se uma nova sistemática para a votação dessa matéria : se o veto não for votado em 30 dias, ele passa a trancar a pauta do Congresso. Esqueceu-se (não totalmente o passado) e vai se tocar nova vida daqui para frente. Os vetos de julho de Dilma já entram nesta conta. E o ambiente entre a presidente, os parlamentares e seus partidos aliados - inclusive o PT - não está dos melhores. Além das velhas queixas, foi agravado nos últimos tempos pela perda de popularidade da presidente. Desde que Dilma - pelo menos neste momento - deixou de ser uma perspectiva absolutamente certa de poder a partir de 2015, seus parceiros ficaram mais críticos, mais exigentes e com maiores laivos de independência.

Uma semana de paz. E depois... - III

O quadro fica um pouco mais complicado quando se sabe que os vetos desagradaram a setores que sempre conseguem comover os parlamentares com suas queixas, a ver :

1. Reintegra e o fim da multa do FGTS irritaram o setor empresarial, de onde sai o grosso do dinheiro de campanha.

2. Ressarcimento de perdas com subsídios desgostaram prefeitos e governadores, de quem muito dependem deputados e senadores para se reelegerem. Como os congressistas estarão indo para Brasília depois de suas semanas de contatos mais diretos com as suas chamadas bases eleitorais, cuja insatisfação "com tudo que está aí" é mais que visível, sempre ficam mais críticos e mais assanhados ainda.

Em tempo

Parte dos vetos antigos, alguns ainda da gestão FHC foram anulados pelo Congresso. Mas para significativa deles, cerca de mil ainda está parada e pode ser colocada em votação dependendo de decisão da direção do Congresso e das pressões dos parlamentares. Alguns deles, como os vetos do Código Florestal e da nova lei dos royalties do petróleo, são "explosivos". De olho neles estão os aliados com sede de vingança, como a parte do PMDB que obedece à sinalização do líder do partido na Câmara, Eduardo Cunha. Com sede de vingança ou de compensações. A presidente Dilma nunca precisou tanto do amparo do jeitinho do presidente Lula para acalmar - ou engabelar - os partidos da base aliada. Lula, pelo que se sabe, vai deixar de lado nesse segundo semestre suas viagens ao exterior para "vender o Brasil" e se concentrar em ajudar a presidente Dilma a "domar" os aliados, espicaçar a oposição e reconquistar o coração da opinião pública.

Teses eleitorais - I

Já estão visíveis algumas das teses com as quais os consultores de Dilma pretendem recuperar o prestígio da presidente e reconquistar os votos que estariam sendo perdidos agora por ela na corrida de 2014 :

1. Os problemas brasileiros não são brasileiros, são internacionais. Nós somos vítimas da má condução da política econômica por outros países, principalmente os ricos.

2. A inflação de agora não é nada, inflação perigosa era a do tempo de FHC. Não dá para comparar uma com a outra e a oposição não tem autoridade moral para falar sobre esse assunto.

3. A insatisfação popular, que explodiu nos movimentos de junho, é consequência da política de inclusão social e de incentivo ao consumo do governo Lula, continuadas pela administração Dilma.

Parece a história dos "recursos não contabilizados" do mensalão. Se colar, colou.

Teses eleitorais - II

Até agora, a oposição só tem um tema de campanha : falar mal do governo. Por mais que Dilma esteja tropeçando, é muito pouco. Não há perigo de colar.

Teses eleitorais - III

Por essas e outras, o que não é "político" [de política tradicional] está tão em alta nas pesquisas. Quanto menos identificado com a "política" dos políticos, mais prestígio.

Sol quadrado

Cálculo de quem conhece o humor político em Brasília e o novo humor do STF pós-movimentos de julho : alguns dos réus do mensalão começarão a ver, como se diz popularmente, o sol nascer quadrado ainda em setembro.

Melhor depois

Já se fala em adiar as eleições diretas para a presidência nacional do PT, marcadas inicialmente para novembro. O clima não está para disputas. Antes Lula vai ter de fazer um cuidadoso trabalho de psicanálise política nos companheiros.

Línguas soltas - I

Ministros e figuras de proa do governo já não sussurram apenas suas insatisfações - gritam. Ninguém faz mais questão de não ser visto falando mal um do outro. A intriga virou esporte predileto em Brasília. É um "salve-se quem puder" que não acaba mais.

Línguas soltas - II

Tucanos de boa plumagem voltaram a se bicar. Tudo depois que Dilma começou a perder popularidade e a possibilidade de disputar com chances a presidência da República começou a ficar possível e não apenas um sonho.

Línguas soltas - III

Livres de intrigas, até agora, estão Marina Silva e Eduardo Campos. Marina é soberana em seu território. Campos, com a queda da popularidade de Dilma, passou a ser visto com outros olhos por seus adversários dentro do PSB, mormente os irmãos Gomes. A última entrevista do "mercurial" Ciro, por exemplo, foi de uma agressividade e grosseria com Dilma como há muito não se via.

Línguas soltas - IV

Por via de todas as dúvidas, embora Joaquim Barbosa continue negando qualquer intenção de disputar o Palácio do Planalto em 2014, já estão devidamente providenciadas informações, vazadas sem fontes visíveis (o famoso "off") para desconstruir a imagem do presidente do STF. Os vazamentos têm dupla utilidade : queimar Barbosa junto à opinião pública e tentar conter seus ímpetos na segunda e decisiva fase de julgamento do mensalão. Pode ser um bumerangue.

Radar NA REAL

26/7/13   TENDÊNCIA
SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo
Juros ¹
- Pré-fixados NA alta estável/alta
- Pós-Fixados NA alta estável/alta
Câmbio ²
- EURO 1,3246 estável baixa
- REAL 2,2614 baixa baixa
Mercado Acionário
- Ibovespa 49.422,05 baixa baixa
- S&P 500 1.691,65 estável/alta alta
- NASDAQ 3.613,16 estável/alta alta

(1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais).
(2) Em relação ao dólar norte-americano
NA - Não aplicável

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Colunista

Francisco Petros Advogado, especializado em direito societário, compliance e governança corporativa. Também é economista e MBA. No mercado de capitais brasileiro dirigiu instituições financeiras e de administração de recursos. Foi vice-presidente e presidente da seção paulista da ABAMEC – Associação Brasileira dos Analistas do Mercado de Capitais e Presidente do Comitê de Supervisão dos Analistas de Investimento. É membro do IASP - Instituto dos Advogados de São Paulo e do Corpo de Árbitros da B3, a Bolsa Brasileira, Membro Consultor para a Comissão Especial de Mercado de Capitais da OAB – Nacional. Atua como conselheiro de administração de empresas de capital aberto e fechado.