Porandubas Políticas

Porandubas nº 462

A cada dia surgem alternativas: se Dilma sai, se Dilma fica. A solução será dada pelo bolso/barriga das pessoas.

23/9/2015

Abro a coluna com uma historinha de PE. E fecho com outra uma de AL.

Apenas expectorante

Reunião de vereadores com o chefe político da região numa pequena cidade de PE. Cada um tinha de falar sobre os problemas do município, reivindicações, sugestões, etc.. Todos falaram alguma coisa, com exceção de um deles, meio acabrunhado no canto da sala. O chefe político cobrou dele a palavra :

- E você, amigo, não tem nada a dizer ?

O vereador, tonto com a provocação, não teve saída. Respondeu :

- Não, doutor, estou apenas expectorante.

Abriu a gargalhada dos companheiros espectadores.

(Historinha que Geraldo Alckmin me contou.)

A reforma de Dilma

A presidente Dilma está entre a cruz e a caldeirinha. Precisa entregar alguns ministérios ao PMDB. Mas exigirá aval e integração do partido ao governo. Não será exercício fácil. Primeiro : quais ministérios ? Segundo : quem indicará ? Terceiro : as diversas alas do PMDB serão contempladas ? Vamos aos fatos : o Ministério da Saúde poderá ser entregue à bancada do RJ. O endosso será dado pelo líder Picciani. E as outras bancadas ? A mineira, por exemplo ? E a bancada do PMDB no Senado ? O vice-presidente Michel Temer, Eduardo Cunha, presidente da Câmara, e Renan Calheiros, presidente do Senado, declinaram de indicações. Fizeram muito bem. O dilema da presidente : se correr, o bicho pega ; se ficar, o bicho come.

PMDB dividido

Seja qual for a fatia que caberá ao PMDB, o fato é que o partido estará dividido. Não adianta capturar o partido com Ministério da Saúde. Que, hoje, é mais um vazio a preencher. Saúde no Brasil está em destroços. Os equipamentos hospitalares estão sucateados. O PMDB tem uma ala que deseja romper com o governo, já ; outra defende rompimento em novembro ; e uma terceira está em cima do muro, a esperar o desempenho da economia. O PMDB tem hoje sete ministérios que, somados, não têm o peso de uma Pasta gorda. Por isso, Dilma tende a fundir Aviação e Portos (novidade), cedendo ainda a Pasta da Saúde ao partido e conservando Turismo, Agricultura e Minas e Energia.

Sangue

O sangue do corpo do governo continua jorrando. Aos borbotões. Dilma e nenhum dos seus médicos conseguem sustar o fluxo sanguíneo que vaza. O que fazer ? Tentar tampar com a reforma ministerial. Pior será a emenda que o soneto. Fazer reforma em momento de ameaça - decisão sobre vetos presidenciais - é um perigo. Ademais, a corda começa a esgarçar no cabo de guerra que o governo enfrenta com o Congresso. A desaprovação de matérias encaminhadas pelo governo, como a CPMF, quebra a coluna vertebral de Dilma.

Renúncia ?

Este consultor continua a não acreditar em renúncia. Por conta da índole da presidente. Seu DNA não combina com renúncia. Ocorre que esta palavra passou a ser repetida com frequência nos últimos dias. Até em hostes petistas é repetida. Será ? Comenta-se que até Lula apreciaria um gesto de renúncia para se habilitar ao pleito de 2018 como candidato das oposições. Não pode ventilar isso, ao contrário, promete construir com o povo a muralha de defesa da presidente. Seria um disfarce. Mostra-se, de um lado, solidário, e, de outro, torcedor silencioso por um desenlace que o beneficiaria. Se ela continuar sangrando até 2018, ele, Lula, não teria a mínima chance.

As alternativas

A cada dia, surgem alternativas : Dilma sai, Dilma fica ; Michel Temer acabaria assumindo e fazendo um pacto nacional ; Michel não assumiria e se afastaria de Dilma. São conjeturas. Este consultor continua apostando na ideia de que a solução - saída/permanência - será dada pelo bolso/barriga das pessoas. Ou seja, pelo aperto mortal que a economia poderá provocar lá para meados de novembro. Povo na rua, barriga roncando, Tribunais decidindo, Congresso votando. Contra Dilma, é claro. E o leit motiv ? Ficará a cargo das Cortes.

E se tudo continuar

Se as coisas continuarem como estão, teremos : uma economia recessiva corroendo o bolso e inflação subindo ; Dilma sem apoio na base, perdendo todas, mas, sob o manto de orgulho, empurrando o governo com a barriga ; TCU E TSE aprovando pedaladas fiscais e contas de campanha de Dilma ; povo nas ruas, gritaria geral, movimentos grevistas e Dilma achando que o cenário de devastação é apenas miragem ; Lula correndo o país com meia dúzia de gatos pingados ao redor, mas soltando o verbo demagógico ; casas congressuais votando contra e a favor de Dilma, dependendo do projeto ; Joaquim Levy dando lugar a outro, que também não teria condição de avançar ; em dezembro, veríamos um país sem Papais Noéis nas ruas. Um Natal triste e um janeiro sem perspectivas. Um feio desenho.

Caindo na real

Vamos cair na real ? Essa crise não é coisa corriqueira como os economistas, regra geral, imaginam. Todos eles gostam de dizer : passamos por piores crises. E citam a inflação de 80% ao mês. Lembra-se, Mailson ? Ora, não se trata apenas de uma crise de economia em recessão. Trata-se de uma crise moral, na esteira da maior roubalheira jamais vista, flagrada, denunciada e condenada pelos tribunais. Trata-se de um copo transbordando com as águas da indignação social. Trata-se do flagrante de um partido pego com a boca na botija, com objetivo de construir propinodutos que o levariam a um poder perpétuo. Ora, ora, economistas, não venham querer driblar a crise com números de inflação.

Até quando ? Até quando ?

Essa crise não terá solução no curto prazo. É uma cadeia de eventos negativos que se imbricam. A crise política continuará, mesmo com reformas cosméticas e prisão de alguns protagonistas do momento. A crise econômica poderá ser debelada com o controle das contas do governo e diminuição do tamanho do Estado. Coisa para quatro a cinco anos. As crises hídrica e energética podem durar um tempo menor. Mas a crise moral não será equacionada da noite para o dia. Não se muda cultura por decreto. A desconfiança, a descrença, a imagem negativa dos atores políticos, essas mazelas continuarão por bem mais tempo.

E a Lava Jato ?

Todos observam : a operação Java Jato continua a todo vapor. Novas fases se abrem. A última, a Nessum Dorma, chega mais perto de Lula. O procurador Carlos Fernando vê conexão entre mensalão, petrolão e eletronuclear. Todos os dutos de propina saindo de uma fonte só : a Casa Civil do governo Lula. É o que se infere. Mas o ministro Teori Zavascki dividiu a operação. Não vê conexão entre as denúncias sobre recursos que teriam sido repassados para a senadora Gleisi Hoffmann e Lava Jato. Por isso, separou as coisas.

Skaf liderando

Paulo Skaf, presidente da FIESP, está pouco a pouco vestindo o manto de principal liderança do setor produtivo nacional. Todas as grandes campanhas em defesa da produção e do consumidor são por ele promovidas. Esta última, sobre a CPMF, caiu no gosto do povo. Skaf é uma boa surpresa no estreito território dos líderes nacionais.

Mercadante fica

Aloísio Mercadante, o chefe da Casa Civil, não cairá. Quanto mais se fala (mal) dele, mais parece prestigiado pela presidente. Mercadante faz ouvidos de mercador.

CPMF

Se a CPMF passar pelo Congresso, Dilma chegará ao fim do governo. Neste caso, valerá o provérbio : "é mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no reino dos Céus".

Pimentel

Ouvi, ontem, de um sensível e sensato observador da cena mineira : Fernando Pimentel, governador de MG, desapareceu de cena desde que tomou posse. Só deu as caras quando a esposa dele apareceu envolvida em denúncias de favorecimentos. Para Pimentel, passarinho na muda não apenas não pia como simplesmente desaparece.

Pezão

O governador Pezão, do PMDB do RJ, é o único a prestar fidelidade absoluta à presidente Dilma. Não se ouve isso nem de governador petista. Até quando durará essa fidelidade ?

Delfim

Delfim Netto continua com a língua afiada e o cérebro tinindo de lucidez. A entrevista que deu, domingo, ao Estadão, é um primor de análise crítica sobre o governo Dilma.

Gilmar

Pode-se até discordar do ministro Gilmar Mendes, do STF. Mas é admirável sua coragem. Não se faz de rogado. Diz abertamente o que pensa sobre a roubalheira cometida pelo PT. Ouvi sua peroração na OAB/SP, semana passada, em mesa que fui moderador.

Ayres Britto

Uma voz de bom senso : Carlos Ayres Britto, ex-presidente do STF. Que perfil de equilíbrio. Que alma poética sob a toga preta do juiz.

O melhor ministro ?

Outrora, era fácil distinguir os ministros e recitar seus nomes. Hoje, essa tarefa é praticamente impossível. Afinal, recite, leitor, 15 nomes de ministros. E qual o melhor ?

Fecho a coluna com uma historinha de AL

Sonhando com Deus

Era o ano de 2006. A campanha ao governo de AL estava "fervendo". Um candidato muito conhecido no Estado pelas presepadas, cujo nome, por motivos óbvios aqui se omite, liderava as pesquisas. Era considerado imbatível. Último debate eleitoral na TV Gazeta. O apresentador passa a palavra ao mais que provável vencedor :

- Candidato, após esta intensa campanha eleitoral, o senhor tem 30 segundos para as considerações finais. Fique à vontade para falar.

O candidato abriu o verbo :

- Povo de AL, ontem eu tive um sonho. Neste sonho, Deus meu dizia : "doutor (fulano de tal), construa hospitais para o sofrido povo deste Estado".

A seguir, o apresentador passou a palavra ao outro candidato. Que usou a verve :

- Povo de AL, quem sou eu para disputar uma eleição com um homem que Deus o trata por doutor ? O candidato (citou o nome do fulano ) disse há pouco que falou com Deus e Deus disse : doutor fulano de tal. Ora, se Deus chama o meu adversário de doutor, reconheço que não posso fazer melhor do que ele. Vocês não acham que o adversário (fulano de tal) já se considera nomeado por Deus ?

E foi assim que o candidato (fulano de tal), líder absoluto nas pesquisas, conheceu a derrota. Perdeu para a própria arrogância.

(Essa historinha foi enviada para a coluna por Manoel Pedrosa).

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Colunista

Gaudêncio Torquato jornalista, consultor de marketing institucional e político, consultor de comunicação organizacional, doutor, livre-docente e professor titular da Universidade de São Paulo e diretor-presidente da GT Marketing e Comunicação.