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O impacto das fusões dos planos de saúde para o consumidor

O autor aponta o impacto das fusões dos planos de saúde para o consumidor.

5/12/2011

Rafael Robba

O impacto das fusões dos planos de saúde para o consumidor

O mercado de saúde suplementar tornou-se um dos mais lucrativos do país devido à precariedade do sistema público brasileiro e à falta de políticas capazes de satisfazer a demanda da população por tratamentos cada vez mais complexos e caros.

O enriquecimento das empresas que atuam no setor de planos de saúde foi evidenciado pela recente declaração da FenaSaúde - Federação Nacional de Saúde Suplementar, afirmando que 15 operadoras filiadas tiveram lucro líquido, no ano de 2010, de aproximadamente 15 bilhões de reais1.

Esse constante crescimento no lucro deu início a uma série de fusões e aquisições, notadamente para fortalecer algumas empresas e torná-las mais competitivas. O exemplo mais nítido é a Amil, que, em aproximadamente dois anos, adquiriu outras grandes operadoras e hospitais, como a Medial Saúde, a Amesp, o Hospital Nove de Julho, e, recentemente, a Lincx Assistência Médica.

Ocorre que essas aquisições e fusões vêm causando diversos transtornos aos consumidores, que têm seus direitos básicos desrespeitados. Muitos usuários enfrentaram dificuldades para obter informações claras sobre a nova forma de prestação de serviços e agendar consultas e procedimentos junto à operadora; tiveram redução da rede credenciada em razão de sucessivos descredenciamentos de hospitais, clínicas, laboratórios e médicos e, em casos absurdos, os planos foram cancelados, pois não eram clientes vantajosos para a nova empresa.

Isso deriva, seguramente, da péssima atuação da ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar, que se limita a apenas autorizar a transação entre as empresas, mas não fiscaliza o cumprimento das obrigações contratuais assumidas por elas com os consumidores.

Atitudes como essa ferem a ordem econômica brasileira, pois segundo o artigo 170 da Constituição Federal (clique aqui), ela tem como princípio, além da livre concorrência – que assegura o direito das empresas adquirirem ou fundirem-se com outras –, a defesa do consumidor2.

Vale ressaltar que a defesa do usuário, além de ser um dos princípios da ordem econômica é, ainda, direito fundamental também previsto na Constituição Federal3, portanto, destinado a protegê-lo enquanto pessoa, e, por consequência, atender ao princípio da dignidade do cidadão, um dos fundamentos do Estado Democrático brasileiro. Ou seja, a possibilidade legal das grandes empresas de planos de saúde em adquirirem ou fundirem-se com outras operadoras não pode, em hipótese alguma, ofender qualquer direito do consumidor, inclusive aos já adquiridos durante o vínculo contratual.

A proteção do consumidor deveria ser, aliás, o princípio norteador da atuação da ANS, quando autoriza a fusão ou aquisição de empresas. Todavia, em razão da inércia da Agência, o consumidor deve contar com a eficiência e ativismo do Poder Judiciário para impedir lesões aos seus direitos.

__________

1 Declaração dada pelo diretor executivo da FenaSaúde, José Cechin, na audiência pública realizada na Câmara dos Deputados em 10 de maio de 2011.

2 Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

(...)

IV - livre concorrência;

V - defesa do consumidor;

3 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;

__________

* Bacharel em direito pela Universidade Santo Amaro, especializado em Responsabilidade Civil na Área da Saúde pela FGV, membro da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB/SP e membro do Vilhena Silva Advogados.

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