Migalhas de Peso

Recuperação judicial e o impacto das decisões judiciais e seus reflexos no mercado de crédito

A presente manifestação destaca alguns aspectos polêmicos identificados na recuperação judicial apenas com a finalidade de promover o debate jurídico.

3/6/2019

Introdução

O instituto falimentar no Brasil, iniciado com o Código Comercial de 1850 e posteriormente regulamentado pelo decreto-lei 7.661, de 21 de junho de 1945, já não atendia aos anseios da sociedade, fazendo-se necessária a edição de uma nova lei, mais ágil e moderna, considerando-se as constantes transformações econômico-sociais ocorridas no país.

Em razão de tal fato, por meio da portaria 233/NJ, foi constituída uma Comissão com o objetivo de elaborar projeto de lei. Posteriormente, em razão da importância do tema, foi criada uma outra Comissão, pela portaria 552/MJ, sendo que a proposta legislativa objetivando proteger credores e devedores, com a preservação da empresa, culminou com a promulgação da lei 11.101, de 09 de fevereiro de 2015 (LFRE).

Como se sabe, a atividade empresarial exerce papel fundamental na atividade econômica, já que gera renda, empregos, tributos, desenvolvimento tecnológico e científico, além de estímulo à produção, crédito, acarretando, desse modo, circulação de riquezas com o consequente desenvolvimento econômico.

Temos, portanto, que a  lei 11.101/05 acabou sendo festejada quando de sua edição, já que teria como premissa, minimizar os efeitos da crise na empresa, auxiliar a recuperação de empresas viáveis, além de facilitar a liquidação eficiente de empresas falidas, maximizando o valor dos ativos e a recuperação do crédito dos credores, bem como trazer maior agilidade ao ambiente empresarial, além de previsibilidade e segurança jurídica, sendo esta inclusive mencionada no parecer do anteprojeto:

“deve-se conferir às normas relativas à falência, à recuperação judicial e à recuperação extrajudicial tanta clareza e precisão quanto possível, para evitar que múltiplas possibilidades de interpretação tragam insegurança jurídica aos institutos e, assim, fique prejudicado o planejamento das atividades das empresas e de suas contrapartes” (TEBET, parecer 534/04 – grifamos)

Inobstante tal recomendação, ou seja, “evitar que múltiplas possibilidades de interpretação tragam insegurança jurídica aos institutos”, o que se observou nesses 14 anos de vigência da LFRE foi a ocorrência de inúmeras discussões polêmicas, sendo que a premissa na solução destas tem sido, com frequência, a busca incessante da preservação da empresa, muitas vezes a qualquer custo, sendo a viga mestra dessa orientação o art. 471 da LFRE, erigido a “Princípio da Preservação da Empresa”.

Ocorre que a persistência no objetivo de preservação da empresa tem gerado constantes distorções no sistema, com o consequente desequilíbrio e lesão à divisão equilibrada de ônus entre devedor e credores2 que deve existir nos processos de recuperação judicial. São esses os entendimentos que passaremos a expor e que têm acarretado desconformidades no sistema.

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1 Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

2 “A recuperação judicial deve ser boa para o devedor, que continuará produzindo para pagamento de seus credores, ainda que em termos renegociados e compatíveis com sua situação econômica. Mas também deverá ser boa para os credores, que receberão os seus créditos, ainda que em novos termos e com a possibilidade de eliminação desse prejuízo no médio ou longo prazo, considerando que a recuperanda continuará a negociar com seus fornecedores. Entretanto, não se pode perder de vista que tudo isso se faz em função do atingimento do benefício social e, portanto, só faz sentido se for bom para o interesse social.

O ônus suportado pelos credores em razão da recuperação judicial só se justifica se o desenvolvimento da empresa gerar os benefícios sociais reflexos que são decorrentes do efetivo exercício dessa atividade.” (CARNIO COSTA, Daniel – Recuperação judicial de empresas – As novas teorias da divisão equilibrada de ônus e da superação do dualismo pendular - disponível aqui).

Consulta em 20.05.2019 às 9h30

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*Rodrigo Pereira Cuano é advogado em São Paulo, especialista em direito processual civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, com cursos de extensão em reestruturação e recuperação de empresas pela FGV Direito e pelo IBAJUD e em direito digital aplicado pela FGV Direito.

 

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