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Anywhere office: aspectos jurídicos do empregado que trabalha de qualquer lugar

Recomenda-se, por precaução, que as empresas elaborem uma política interna sobre o trabalho remoto, para uma maior segurança entre ambas as partes

21/10/2022

Como o próprio termo já diz, o anywhere office trata da possibilidade do empregado trabalhar de qualquer lugar que desejar. Com a pandemia, muitos empregados passaram a trabalhar de casa e vários deles também optaram por alugar uma casa na praia, campo ou, até mesmo, mudando de cidade ou ainda de país.

Com essas alterações do modelo de trabalho, surgiram algumas dúvidas tanto do empregado como do empregador acerca de diversos temas, como a jornada de trabalho, as regras do local de trabalho, o que é e não é permitido, qual convenção coletiva de trabalho aplicar nesses casos, e ainda, caso o empregado queira ajuizar uma ação trabalhista, qual seria o foro competente.
Desta forma, para sanar algumas das principais dúvidas, elaborei este artigo.

Recentemente, foi sancionada a lei 14.442/22, que alterou alguns dispositivos, bem como acrescentou alguns artigos à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Dentre os principais pontos, foi acrescentado o art. 75-B, §2º, que trata sobre a necessidade do controle de jornada, exceto para os empregados em regime de teletrabalho que prestam serviços por produção ou tarefa ou de empregados que ocupem cargos de confiança, conforme art. 62, II, da CLT. Ou seja, é importante que as empresas passem a adotar meios de controle de jornada, bem como fiscalizar o trabalho para que os empregados não laborem além da jornada permitida.

Além disso, foi acrescentado também o §7 ao art. 75-B, que prevê expressamente que a convenção e acordo coletivos aplicados aos empregados que optem por trabalhar fora do Brasil, referem-se à legislação local e são baseadas na base territorial do estabelecimento de lotação do empregado. Ou seja, caso um empregado decida, a seu critério mudar de país, a legislação aplicável, em regra, será a do local da empresa.

Outro ponto que traz dúvidas, trata dos empregados que se mudaram durante a pandemia, exercendo o anywhere office, e depois foram chamados pelo empregador para retornar ao trabalho de forma presencial. Nesses casos, o art. 75-C, §3º, determinou que o empregador não será responsável pelas despesas resultantes do retorno ao trabalho presencial do empregado que optar pela realização do teletrabalho ou trabalho remoto fora da localidade prevista no contrato.
No tocante ao enquadramento sindical do empregado, ele é aplicado tendo como referência:

(i) a base territorial da prestação de serviços; e

(ii) a atividade preponderante do empregador, salvo no caso de categoria diferenciada. Ou seja, como regra a CCT aplicada ao empregado é a do local da prestação de serviços, inclusive como forma de aproximar os direitos previstos nos instrumentos normativos às particularidades do local em que atua. Contudo, nesses casos em que o trabalhador trabalha de qualquer lugar, há discussão quanto ao enquadramento, contudo, entendemos que se aplica a CCT do local da sede da empresa, por não ter o empregado um local fixo de trabalho.

Nesse mesmo sentido, há entendimento em que o julgador ressaltou que o empregado poderia trabalhar “em qualquer lugar do planeta” sem que isso importasse para vinculá-lo ao Sindicato do local onde estivesse morando. Além disso, nesse caso, o juiz frisou que “o domicílio do autor pode ser alterado para diversos municípios, nas mais variadas localidades do país, cada um com sua base e representatividade sindical, implicaria também severo risco de vulnerabilidade do princípio da isonomia, colocando empregados da mesma empresa em situação de desigualdade.” (Processo 0000023-21.2017.5.12.0056)

Por fim, quanto ao ajuizamento de uma ação trabalhista, como se sabe, a regra geral é que a ação será ajuizada no local de trabalho onde o empregado presta seus serviços. Porém, como tratado no presente artigo, há cada vez mais empregados que não possuem um local físico para a prestação de serviços, estando cada hora em um local diferente. Nesses casos, há entendimentos dos Tribunais Regionais do Trabalho considerando a sede da empresa como o foro competente para o ajuizamento da ação.

Dessa forma, diante de tantas discussões sobre o assunto, necessidades de adequação das normas das empresas e tendo em vista as constantes alterações dos locais em que os empregados optam por trabalhar, recomenda-se, por precaução, que as empresas elaborem uma política interna sobre o trabalho remoto, para uma maior segurança entre ambas as partes, e ainda insiram no contrato de trabalho o foro competente para ajuizamento de ações, muito embora haja discussão acerca da validade de tal cláusula. Além disso, implementem o controle de jornada para tais empregados e fiscalizem as suas jornadas.

Giovanna Tawada
Advogada formada e pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, ambos pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, e conta com mais de 8 anos de experiência na área trabalhista, sempre atuando em grandes e renomados escritórios de São Paulo. Tawada é, atualmente, sócia do escritório Feltrin Brasil Tawada com atuação voltada tanto para área consultiva quanto para o contencioso trabalhista.

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