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Por um lar digno, livre de violência doméstica: Lula sanciona a lei do auxílio-aluguel

Necessária a criação de uma estratégia nacional de combate à violência contra a mulher, capaz de criar políticas públicas integradas, atentas a metas e a prazos, em prol de um enfrentamento coordenado e eficaz da violência contra a mulher em todo o país.

21/9/2023

O Presidente Lula sancionou integralmente, na quinta-feira (14), o texto do PL 4.875/20, que institui a concessão de auxílio-aluguel para mulheres vítimas de violência doméstica, conferindo-lhes apoio e guarida nas situações em que se deparem com atos violentos que tornem necessária a saída de seus próprios lares. Transformada na LF14.674/23, a medida foi publicada na sexta-feira (15/9) no Diário Oficial da União.

O auxílio traduz-se em medida estratégica para emancipação das mulheres vítimas de violência, pois lhes garante recursos financeiros para se libertarem do estado de agressão. Não só isso, a medida é um reforço ao direito social à moradia, inscrito na Constituição Federal de 1988, ao conferir a essas vítimas a possibilidade de viverem sem medo de serem agredidas, reacendendo a dimensão de casa como sinônimo de lar.

O pagamento do aluguel será concedido por até 6 meses e apenas em virtude de decisão judicial. O valor a ser concedido será estipulado pelo Poder Judiciário diante do caso concreto, conforme a situação de vulnerabilidade social e econômica da vítima — o que possibilita que a medida seja calibrada no caso a caso. Os valores serão custeados pelos estados, municípios ou DF, utilizando recursos destinados à assistência social.

A iniciativa reforça o regramento protetivo já desenhado pela lei Maria da Penha, marco fundamental da consagração dos direitos das mulheres que, no último dia 07 de agosto, completou 17 anos de existência. 

No atual cenário de expressividade do número de ocorrências registradas de violência de gênero, torna-se imprescindível que os atos de proteção e acolhimento sejam fortalecidos.  Dados extraídos do Fórum Brasileiro de Segurança Pública1 estimam que cerca de 18,6 milhões de mulheres foram vítimas de violência no Brasil em 2022. As mulheres vítimas de violência foram agredidas, em média, 4 vezes ao longo do ano passado. Entre as divorciadas, a média foi de 9 agressões.

Portanto, a medida em questão afigura-se extremamente necessária, especialmente porque se apresenta enquanto instrumento de proteção dos direitos fundamentais relacionados à liberdade, à dignidade e à saúde, que abrange tanto o aspecto físico quanto o aspecto psíquico das mulheres brasileiras.

Além disso, a iniciativa mostra-se alinhada às diretrizes do cenário internacional, que vem imprimindo marcha acelerada em prol dos direitos das mulheres vítimas de violência, garantindo-lhes proteção em todas as esferas, inclusive financeira.

Tem-se como exemplo a Espanha, cuja lei de violência de gênero 1/04  prevê destinação orçamentária própria para transferir vítimas de violência doméstica e seus filhos a casas de acolhida, assim como possibilita outorgar-lhes auxílios financeiros (CAPÍTULO IV Derechos económicos Artículo 27; Artículo 28). Referida lei, considerada pioneira na Europa, também dispõe sobre outras várias medidas de proteção integrada contra a violência, já tendo sido eleita pela ONU a melhor lei do mundo no enfrentamento à violência doméstica.

A legislação espanhola esquadrinha a derrocada da desigualdade de gênero e aposta em um sistema assistivo e integrado para prevenção da violência. A lei sancionada por Lula acena na mesma direção, conduzindo o Brasil aos caminhos das melhores práticas internacionais.

Ainda há um longo caminho a ser trilhado, o que envolve a necessidade de o Estado enxergar a violência doméstica como um problema de segurança pública. Com muito empenho, o Governo, os setores público e privado e a sociedade civil trabalham para, paulatinamente, construir uma rede de proteção integral às mulheres. Não basta criar incentivos para as vítimas denunciarem as agressões — é preciso fornecer amparo para que, após a denúncia, essa mulher consiga viver com dignidade e em segurança, reestabelecendo-se para dar início a uma nova vida.

Em atenção a isso, e necessária a criação de uma estratégia nacional de combate à violência contra a mulher, capaz de criar políticas públicas integradas, atentas a metas e a prazos, em prol de um enfrentamento coordenado e eficaz da violência contra a mulher em todo o país.

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1 Relatório Visível e Invisível - A Vitimização de Mulheres no Brasil. 4ª edição, 2023.

Renata Gil
Juíza de Direito do TJ/RJ e presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB).

Natalie Alves Lima
Sócia do Escritório Malta Advogados; Diretora Executiva do Escritório Malta Advogados; Diretora de Relações Governamentais do Escritório Malta Advogados; Mestranda em Direito pela Universidade de Brasília - UnB; Professora assistente na Universidade de Brasília - UnB; Diretora da Alumni FD-UnB (Associação de Ex-alunos da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília); Membro da Comissão de Relações Institucionais e Governamentais da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Distrito Federal; Diretora do Blog "Direito Médico em Foco".

Marcela Bocayuva
Presidente do Instituto Nós por Elas. Advogada, sócia e fundadora do escritório Bocayuva & Advogados Associados, coordenadora da Escola Nacional da Magistratura e mestra em Direito Público.

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