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O direito defesa e voz do advogado pela sustentação oral

A resolução 591/24 do CNJ digitaliza julgamentos, mas gera alerta: limitar sustentações orais ameaça defesa plena e o protagonismo da advocacia.

13/12/2024

Com a resolução 591/24 do CNJ, que regulamenta os julgamentos eletrônicos no Brasil, a partir de fevereiro de 2025, surge uma grande preocupação quanto ao impacto dessa inovação sobre o direito de defesa através de sustentação oral gravada por vídeo e o protagonismo da advocacia. Embora seja inegável que a digitalização do Judiciário represente um avanço, a obrigatoriedade do envio de vídeos ou sustentações eletrônicas prévias limita o exercício pleno do papel do advogado e compromete a essência do devido processo legal.

O art. 133 da Constituição Federal é categórico ao afirmar que “o advogado é indispensável à administração da justiça”. Esse reconhecimento não é meramente simbólico, mas reflete a centralidade da advocacia como guardiã dos direitos e garantias individuais. A sustentação oral, por sua vez, é um dos instrumentos mais poderosos que o advogado possui para defender os interesses de seus clientes. Ela não deve ser reduzida a uma formalidade, muito menos a um vídeo gravado enviado sem a possibilidade de interação direta com os julgadores.

A possibilidade de enviar sustentações prévias em vídeo, conforme previsto na resolução 591/24, enfraquece a capacidade de defesa, pois priva o advogado de adaptar seus argumentos à dinâmica do julgamento, algo crucial em casos complexos. A sustentação oral não é apenas uma exposição de argumentos, mas um diálogo com o colegiado, uma oportunidade para reforçar pontos centrais e até mesmo responder a eventuais questionamentos surgidos durante a sessão.

Nesse sentido, o direito de escolha do advogado entre a sustentação presencial e virtual síncrona deve ser garantido. Essa escolha é uma prerrogativa da defesa, que conhece melhor a estratégia necessária para o caso em questão. A imposição de um formato engessado — como o envio de vídeos — desconsidera a diversidade e a complexidade das causas e ignora a relevância da presença ativa do advogado no julgamento.

O direito de defesa, garantido no art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal, exige que as partes tenham pleno acesso aos meios necessários para participar do processo, o que inclui a liberdade de decidir como e quando sustentar oralmente. Privar o advogado dessa escolha é subtrair um dos aspectos mais fundamentais do contraditório e do devido processo legal.

Por isso, a resolução 591/24 deveria ser ajustada para assegurar que a escolha entre sustentação presencial e virtual síncrona seja sempre do advogado, respeitando a estratégia de defesa e as particularidades de cada caso. O avanço tecnológico deve servir como ferramenta para fortalecer o Judiciário, e não como um meio para reduzir direitos ou mecanizar a busca por justiça.

Não se trata de recusar o progresso, mas de garantir que ele não seja feito à custa dos pilares fundamentais da advocacia. A sustentação oral é mais do que um direito processual; é um exercício vivo da defesa e um ato essencial para assegurar decisões justas e fundamentadas.

O poder judiciário e o CNJ deve respeitar o papel da advocacia e preservando o direito de escolha na defesa revogando assim essa resolução nefasta. Sem advogado não se faz justiça e sem justiça não há democracia.

Thiago Massicano
Especialista em direito empresarial. Sócio-fundador do escritório Massicano Advogados & Associados.

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