Em uma sociedade cada vez mais mediada pela tecnologia, a parentalidade enfrenta desafios sem precedentes. O abandono digital dos filhos emerge como uma nova forma de negligência, que, embora muitas vezes invisível, possui consequências profundas e potencialmente perigosas.
Essa forma de desamparo ocorre quando os pais, por desatenção ou desconhecimento, expõem seus filhos ao mundo virtual sem a devida orientação e supervisão. Essa exposição desmedida se manifesta de diversas formas, desde a publicação imprudente de imagens e informações pessoais das crianças e adolescentes até a ausência de controle sobre os conteúdos aos quais eles têm acesso. Tal prática não apenas expõe os menores a constrangimentos, mas também os coloca em risco, ao revelar sua rotina, locais frequentados e outras informações que podem ser exploradas por criminosos.
As consequências dessa negligência não se restringem ao constrangimento ou à exposição indevida. No caso dos adolescentes, a falta de orientação e controle parental pode torná-los vulneráveis à influência de grupos criminosos que operam no ambiente digital, incluindo redes que os aliciam para práticas ilícitas, atos de terrorismo ou envolvimento em comportamentos destrutivos. Neste cenário, os jovens se tornam agentes inconscientes, manipulados por mentes patológicas que operam desde o espectro sexual até o homicida.
Além disso, a ausência de supervisão parental está associada ao fenômeno do cyberbullying, também conhecido como intimidação sistemática virtual. Crianças e adolescentes expostos a essa prática são submetidos a humilhações constantes, afetando gravemente sua saúde mental e emocional. Não supervisionados, podem desenvolver dependência psicológica das redes sociais, prejudicando seu desenvolvimento e bem-estar.
O teórico da comunicação Marshall McLuhan já alertava para o fenômeno do "mundo como um palco", onde todos estão expostos como personagens em um espetáculo contínuo. No contexto da ausência de proteção digital, as crianças e adolescentes se tornam atores involuntários deste "mundo de Truman", à mercê de espectadores desconhecidos e potenciais predadores.
Abandonar os filhos ao universo virtual não é apenas um lapso, mas uma omissão que beira a cumplicidade. Os pais que ignoram o que seus filhos acessam, com quem interagem ou que conteúdos consomem, tornam-se coadjuvantes silenciosos de uma tragédia anunciada. A supervisão digital não é uma opção, é um dever jurídico e moral.
Nossa Constituição Federal garante o direito à educação, proteção e desenvolvimento integral de crianças e adolescentes. Além disso, a responsabilidade parental está expressamente consagrada, estabelecendo o dever dos pais de prover criação, educação e proteção aos filhos, princípio reforçado pelo Código Civil e pelo ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente. Esses dispositivos garantem o direito ao desenvolvimento saudável e à proteção integral dos menores, estabelecendo uma obrigação jurídica e moral dos pais em zelar pelo bem-estar físico, emocional e digital de seus filhos.
Diante disso, é imperativo que os pais compreendam seu papel como responsáveis pela orientação e proteção digital de seus filhos. Estabelecer limites, monitorar conteúdos e dialogar sobre os perigos do ambiente virtual são medidas essenciais para garantir o bem-estar e a segurança dos menores. A parentalidade não é apenas uma tarefa afetiva, mas também uma responsabilidade ética e moral que se estende ao universo digital.