Migalhas de Peso

Fraude na Caixa expõe urgência de políticas de integridade

Quando a básico falha, o risco vira rotina — e a reputação, moeda volátil.

3/6/2025

A operação da Polícia Federal que apura o desvio de R$ 11 milhões da Caixa Econômica Federal não é apenas mais um escândalo funcional. É, sobretudo, um alerta sobre a negligência com que muitas instituições ainda tratam as estruturas de controle, auditoria e integridade.

Quando a básico falha, o risco vira rotina - e a reputação, moeda volátil.

Segundo as investigações, um funcionário da estatal teria usado seu acesso privilegiado para realizar transferências indevidas via Pix, em nome de clientes, desviando valores para empresas de apostas e contas de terceiros, demonstrando, inclusive, a combinação de ambientes de movimentação financeira sensíveis, como as Bets.

Entretanto, a fraude só veio à tona após uma auditoria interna, mostrando como esse mecanismo - ainda subestimado - é essencial à proteção institucional.

Esse episódio evidencia o que muitos fingem não ver: compliance não é adereço, é contenção. Não é um custo a mais, é um investimento a menos em crises.

A título de esclarecimento, cita-se a estrutura sugerida pelo COSO - Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission, a qual poderia ter prevenido ou ao menos dificultado o avanço da fraude.

Isso porque o modelo COSO organiza os controles internos em cinco pilares: ambiente de controle, avaliação de riscos, atividades de controle, comunicação e monitoramento. Amplamente adotado em boas práticas internacionais, ele é referenciado pelo TCU, CGU, Banco Central e órgãos de governança no setor público e privado, de modo que a sua ausência ou inefetividade é uma porta aberta para irregularidades sistêmicas.

Além disso, a legislação brasileira já dá o tom: a lei das Estatais (13.303/16) exige a implementação de mecanismos de governança, integridade e controle interno. A lei Anticorrupção (12.846/13), reforçada pelo decreto 11.129/22, valoriza a existência de programas de compliance como fator atenuante e essencial à responsabilização objetiva de pessoas jurídicas.

Não se trata, portanto, de uma escolha institucional - é um dever regulatório. Apesar disso, o compliance ainda é visto, em muitas companhias, como um “peso necessário”.

Ocorre que o custo da negligência sempre será maior, considerando que não se trata apenas de mitigar eventuais responsabilidades civis ou penais, mas de evitar o dano estrutural: perda de credibilidade, exposição negativa e insegurança institucional.

Ademais, esse tipo de escancaramento de ilícitos em empresas públicas e autarquias revela algo ainda mais perturbador: a falsa percepção de que o setor público estaria imune à necessidade de programas sérios de integridade. Essa crença, ultrapassada e perigosa, é o que alimenta o ambiente confortável para agentes que desejam manipular a estrutura ao seu favor.

O caso recente do INSS, onde quadrilhas estruturadas conseguiram fraudar milhares de benefícios com apoio de servidores, reforça a urgência de controles internos sólidos, mesmo no setor público.

Contudo, a raiz dos episódios, embora distintos, é comum: a ausência de cultura de integridade e falta de compromisso real com o compliance público.

Diante disso, enquanto o setor privado começa a internalizar práticas de integridade como diferencial competitivo, o setor público ainda hesita - e esse atraso custa caro. É necessário tratar o compliance não como formalidade, mas como fundação. Só assim será possível proteger o patrimônio, a reputação e, sobretudo, a confiança do cidadão.

Leonardo Tajaribe Jr.
Advogado Criminalista. Especialista em Direito Penal Econômico (COIMBRA/IBCCRIM). Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal (UCAM).

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