A lei 15.177, sancionada em 23 de julho de 2025, alterou a lei 13.303/16 (lei das estatais) e a lei 6.404/1976 (LSA - lei das sociedades por ações), criando regras vinculantes para a composição dos conselhos de administração e dos comitês de auditoria de empresas estatais e de sociedades empresárias controladas pela Administração Pública. A principal inovação consiste na reserva obrigatória de 30% das vagas para mulheres, implementada de forma progressiva e com recorte interseccional.
De acordo com a nova norma, as empresas públicas, sociedades de economia mista, suas subsidiárias e controladas, bem como sociedades empresárias em que a União, os estados, o Distrito Federal ou os municípios detenham a maioria do capital votante, deverão observar, já a partir do primeiro exercício social subsequente à entrada em vigor da lei, um percentual mínimo de 10% de mulheres nesses órgãos colegiados. No segundo exercício, o percentual sobe para 20%, e, a partir do terceiro, atinge o patamar definitivo de 30%.
Importante destacar que dentro do percentual reservado às mulheres, ao menos 30% das vagas deverão ser ocupadas por mulheres negras ou com deficiência, tornando obrigatória uma abordagem interseccional na política de inclusão. A norma, portanto, não apenas exige diversidade de gênero, mas também impõe representatividade racial e de acessibilidade em cargos de alta governança.
Para lidar com situações em que o número total de vagas resulte em frações ao aplicar os percentuais exigidos, o §2º do art. 2º da nova lei estabelece critério objetivo de arredondamento: utiliza-se o número inteiro subsequente quando a fração for igual ou superior a 0,5; caso contrário, adota-se o número imediatamente inferior.
Embora a obrigatoriedade se aplique apenas às sociedades sob controle estatal, a lei contempla também as companhias abertas em geral, prevendo que sua adesão à política de reserva de vagas é facultativa. Contudo, o art. 6º autoriza o Poder Executivo a regulamentar programas de incentivo à adesão voluntária, o que poderá envolver mecanismos reputacionais, financeiros ou regulatórios. Dessa forma, a norma combina comandos cogentes para estatais com estímulos normativos às companhias abertas, alinhando-se a práticas internacionais de governança.
Como uma forma de incentivar o aumento dos indicadores de participação feminina nas estruturas corporativas, a lei 15.177/25 alterou a LSA para incluir, no art. 133, o § 6º, que impõe às sociedades anônimas de capital aberto a obrigação de divulgar, em seus relatórios da administração, informações detalhadas sobre sua política de equidade de gênero.
Nos termos desse novo dispositivo, o relatório previsto no inciso I do caput do art. 133 (Relatório da Administração sobre os Negócios Sociais e os Principais Fatos Administrativos do Exercício Findo) deverá conter, entre outras informações relevantes:
- a quantidade e a proporção de mulheres contratadas, por níveis hierárquicos;
- a quantidade e a proporção de mulheres que ocupam cargos na administração da companhia;
- a remuneração fixa, variável e eventual, segregada por sexo, relativa a cargos ou funções similares; e
- a evolução desses indicadores em relação ao exercício imediatamente anterior.
A medida não impõe metas numéricas às companhias abertas, mas visa induzir, por meio da transparência e da exposição pública de dados, a adoção de práticas corporativas voltadas à inclusão e à redução de disparidades estruturais, sobretudo no tocante ao acesso de mulheres - em especial, negras e com deficiência - aos cargos de liderança e tomada de decisão.
Por fim, especificamente em relação às estatais, o descumprimento da reserva obrigatória poderá comprometer a regularidade das deliberações dos conselhos afetados, nos termos da lei das estatais, sujeitando a companhia às medidas fiscalizatórias dos órgãos de controle. Trata-se, portanto, de uma política afirmativa dotada de eficácia normativa plena, que deverá ser observada como requisito de validade da própria composição da administração colegiada.
A lei 15.177/25, representa um importante avanço no ordenamento jurídico brasileiro ao estabelecer medidas concretas voltadas à promoção da equidade de gênero e da diversidade interseccional nos órgãos de administração das empresas estatais e das sociedades empresárias controladas pela Administração Pública.
Sob a ótica jurídica e social, a iniciativa legislativa assume especial relevância diante do atual cenário nacional, no qual a representação desigual de mulheres - especialmente negras e com deficiência - em cargos de liderança, em relação aos homens, ainda revela uma desconexão entre a estrutura social e sua correspondência nos espaços decisórios públicos e privados. A previsão de metas progressivas para reserva de vagas, combinada à obrigatoriedade de divulgação de dados segregados nos relatórios das companhias abertas, reforça uma política afirmativa com eficácia normativa plena e caráter indutor para o setor privado.
Em conclusão, a lei 15.177/25 reafirma o compromisso do Brasil com uma governança corporativa mais plural, transparente e representativa. Trata-se, portanto, de um marco normativo relevante na promoção da equidade de gênero, que busca corrigir distorções históricas e estruturais por meio de medidas concretas de inclusão, em sintonia com as melhores práticas de governança e diversidade.