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IPI Verde e o mercado segurador: Impactos da nova política industrial para o setor de seguros

O IPI Verde impulsiona carros sustentáveis, aquece o setor de seguros e exige das seguradoras inovação, agilidade regulatória e foco em ESG.

4/8/2025

A recente implementação do programa "Carro Sustentável", também conhecido como IPI Verde, marca uma mudança significativa na política industrial brasileira, ao prever a redução do IPI - Imposto sobre Produtos Industrializados para veículos mais eficientes e menos poluentes. A medida, que concede isenção total para modelos compactos que atendam a critérios ambientais e energéticos, já começa a gerar impacto mesmo antes de sua entrada oficial em vigor.

Montadoras como Fiat, Volkswagen e Renault anteciparam-se ao novo cenário e anunciaram reduções substanciais nos preços de modelos populares, estimulando a demanda por novos veículos. Essa movimentação se soma a um contexto de alta histórica no setor: em 2024, o Brasil produziu 2,5 milhões de veículos, 9,7% a mais que no ano anterior, e contabilizou 2,6 milhões de emplacamentos, segundo dados da Anfavea e da Agência Gov. Esse é o melhor desempenho desde 2014 e reforça as expectativas de crescimento para os próximos anos.

Esse ambiente favorável não apenas impulsiona a cadeia automotiva como também aquece o setor segurador, ampliando a base de consumidores com potencial para contratação de seguros veiculares. A expansão da frota, sobretudo de veículos populares 1.0 flex, representa uma oportunidade concreta de massificação do seguro auto, exigindo das seguradoras mais agilidade operacional e adequação às normas regulatórias vigentes.

A lei 10.406/02 (CC), em seu art. 757, define o contrato de seguro como aquele pelo qual o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado relativo à pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. Com o crescimento da frota de veículos adquiridos com descontos promovidos pela nova política fiscal, há uma tendência natural de aumento na contratação de seguros, e a demanda por seguros mais acessíveis e digitalizados torna-se ainda mais relevante.

Do ponto de vista jurídico, esse novo cenário também traz desafios regulatórios. O aumento no volume de apólices pode refletir em maior litigiosidade, especialmente se as operações não forem adequadamente ajustadas à realidade do novo perfil de consumidor. A Susep - Superintendência de Seguros Privados e o CNSP - Conselho Nacional de Seguros Privados exercem papel fundamental na normatização e fiscalização dessas relações, que devem prezar pela clareza contratual, pelo dever de informação e pela oferta de produtos condizentes com o risco assumido.

Além disso, as seguradoras devem estar atentas ao crescimento de sinistros em regiões metropolitanas, onde tradicionalmente se concentram os maiores índices de roubo e colisão. A precificação atuarial e o monitoramento constante do perfil de risco tornam-se ainda mais importantes em um momento de ampliação rápida da frota nacional.

O IPI Verde também dialoga com a agenda ESG, incentivando a transição para uma mobilidade mais sustentável. A adesão a essa agenda pode ser uma oportunidade para o setor segurador se reposicionar estrategicamente, promovendo soluções que considerem não apenas o risco tradicional, mas também o impacto ambiental dos veículos segurados. Produtos voltados para carros elétricos ou com menor emissão de poluentes são tendência no mercado internacional e devem ganhar espaço no Brasil.

Por fim, é fundamental que os departamentos jurídicos das seguradoras acompanhem de perto os desdobramentos da nova política fiscal e seus impactos operacionais e contratuais. A interação entre as áreas de regulação, produtos e contencioso deve ser cada vez mais integrada, para garantir conformidade, segurança jurídica e competitividade.

O momento é propício para revisitar estratégias, aprimorar controles e oferecer experiências de valor ao consumidor. O IPI Verde, embora não tenha como foco principal o setor de seguros, abre uma janela de oportunidades para modernizar a atuação das seguradoras no país, tanto no aspecto comercial quanto na governança jurídica e regulatória.

Lucimer Coelho de Freitas
Advogada e sócia da Jacó Coelho Advogados. Doutoranda em Ciências Jurídicas pela Universidad del Museo Social - Argentina. Especialização em Direito Público (Direito Constitucional e Direito Administrativo) pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC); MBA Gestão de Seguros e Resseguro (Executivo) pela Escola Nacional de Seguros (FUNENSEG); MBA Gestão Jurídica de Seguro e Resseguro pela FUNENSEG.

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