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Do match à prisão: Mulher manda 159 mil mensagens após encontro inicial e acaba presa

Quando a obsessão se confunde com amor.

9/9/2025

Na era digital, basta um simples clique para que duas pessoas se conectem. O “match” pode ser o início de grandes histórias - mas também de pesadelos. Foi o que ocorreu no Arizona (EUA), onde Jacqueline Ades, de 31 anos, após um único encontro, enviou mais de 159 mil mensagens para um homem. Entre juras de amor e ameaças perturbadoras, chegou a afirmar que transformaria os rins dele em sushi. O caso culminou em prisão por invasão e perseguição.

Esse episódio, que ganhou repercussão internacional, acende um alerta global: onde termina o afeto e começa a violência?

stalking no Brasil: da invisibilidade à criminalização

No Brasil, o stalking (ou perseguição) durante muito tempo foi tratado como uma conduta de difícil enquadramento. Insistentes ligações, mensagens incontroláveis, vigilância e perseguições físicas eram enquadrados genericamente em crimes como ameaça ou perturbação da tranquilidade - ambos com penas leves, muitas vezes incapazes de conter a escalada do comportamento obsessivo.

A virada aconteceu em 2021, com a edição da lei 14.132/21, que tipificou o crime de perseguição no art. 147-A do CP:

Art. 147-A - Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade.

Pena: reclusão de 6 meses a 2 anos e multa, podendo aumentar se o crime for contra criança, mulher, idoso ou mediante concurso de duas ou mais pessoas.

Essa mudança legislativa trouxe mais segurança às vítimas, que antes ficavam expostas à banalização desse tipo de violência.

Casos emblemáticos no Brasil

O país já foi palco de episódios marcantes que chamaram a atenção para a gravidade do stalking:

Esses casos mostram que, assim como no exemplo norte-americano, o stalking não escolhe fronteiras nem perfis sociais: qualquer pessoa pode ser vítima.

O crescimento do stalking no Brasil em números

Além dos casos de grande repercussão, os dados oficiais confirmam que o stalking é um crime em expansão no país:

Esses dados reforçam que, embora o fenômeno afete sobretudo mulheres, ninguém está imune. O padrão é sempre o mesmo: mensagens em excesso, vigilância, invasão de privacidade e ameaças que corroem a liberdade da vítima e comprometem sua saúde mental.

Do match à prisão, do fã ao perseguidor, do ciúme à violência: stalking é um crime que destrói vidas e exige uma resposta firme da sociedade. Os casos apresentados revelam um padrão perturbador: o que começa como interesse romântico ou admiração pode rapidamente se transformar em obsessão destrutiva, deixando rastros de trauma e medo.

A tipificação do stalking em 2021 foi um avanço fundamental, mas representa apenas o primeiro passo de uma jornada mais longa. A lei por si só não é suficiente para combater um fenômeno que tem raízes profundas em questões culturais e psicológicas. É preciso uma mudança de mentalidade coletiva, onde insistência não seja romantizada como prova de amor, e controle não seja aceito como demonstração de cuidado.

Certo é que o amor, como nos ensina Luís de Camões, só se prende por vontade. Do contrário, não é amor.

Kênia Rodrigues Quintal
Advogada há mais de 20 anos, desde 2021 exerce o cargo de Procuradora-Geral do Município de Carapebus.

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