Um debate que deixou de ser teoria
Modelos de negócios jurídicos, posicionamento de mercado e estratégias de sobrevivência podem soar como temas recorrentes. No entanto, quando analisados sob a ótica de quem ocupa diariamente a cadeira de executivo em um escritório de advocacia, deixam de ser conceitos abstratos e se tornam realidade vivida.
Não se trata apenas de literatura acadêmica ou tendências de consultoria. É sobre a experiência prática de quem sente na pele as pressões de um mercado em constante transformação - competitivo, exigente e implacável.
A ruptura do modelo tradicional
A advocacia brasileira foi marcada por um modelo artesanal: bancas familiares, equipes enxutas, prestígio social e cobrança por hora. Embora eficiente no passado, esse formato já não sustenta a complexidade de operações atuais.
Hoje, os escritórios que permanecem presos a esse modelo enfrentam três forças de pressão:
- Clientes mais exigentes, que buscam previsibilidade financeira, relatórios claros e soluções estratégicas;
- Concorrência intensa, em um cenário com mais de um milhão de advogados disputando espaço no Brasil;
- Transformação tecnológica, que automatiza processos antes manuais e exige inovação constante.
Nesse contexto, sobrevivência significa gestão estratégica, não apenas excelência técnica.
Novos modelos de negócios jurídicos
Nos últimos anos, diferentes formatos de atuação têm se consolidado, mas todos com um ponto em comum: clareza de posicionamento.
- Full service corporativo: Escritórios estruturados como empresas, com áreas de gestão tão sólidas quanto a prática jurídica;
- Boutiques especializadas: Operações enxutas e de alto valor agregado, voltadas para nichos estratégicos;
- Lawtechs e modelos híbridos: Integração entre tecnologia e advocacia, oferecendo escalabilidade e inteligência de dados.
Redes cooperativas de escritórios: Alianças estratégicas que permitem escala e presença nacional sem perder autonomia.
Mais do que a estrutura, o diferencial está em traduzir valor percebido pelo cliente.
Posicionamento: Além da técnica
Na advocacia contemporânea, excelência técnica é apenas o ponto de partida. O verdadeiro diferencial está na forma como o escritório se posiciona no mercado:
- Clareza na proposta de valor;
- Entrega de experiência ao cliente, e não apenas serviços jurídicos;
- Transformação de dados em estratégia, com previsibilidade e métricas;
- Construção de marca institucional sólida, transmitindo identidade e confiança.
O cliente de hoje busca resultados, mas também deseja uma relação com parceiros estratégicos e inteligentes.
Sobrevivência: A visão de dentro
Quando falamos em sobrevivência no mercado jurídico, falamos de decisões diárias complexas. Significa analisar fluxos de caixa, revisar planilhas de madrugada adentro, tomar decisões difíceis e ajustar a rota diante de cenários incertos.
Nesse contexto, o advogado se torna também um executivo jurídico, responsável por equilibrar técnica, gestão e visão estratégica.
Sobreviver exige:
- Profissionalização da gestão;
- Modelos de cobrança adaptados ao perfil do cliente;
- Times multidisciplinares;
- Cultura organizacional baseada em propósito e não apenas em honorários.
Conclusão: Quem não se reposiciona, desaparece
Pode parecer clichê afirmar que o mercado mudou. Mas, para quem vive essa transformação de dentro, é impossível ignorar: escritórios que não definem claramente seus modelos de negócios, que não ajustam seu posicionamento e que não tratam a sobrevivência como prioridade estratégica correm sério risco de desaparecer.
O futuro da advocacia não pertence apenas aos maiores, mas aos que souberem equilibrar técnica, gestão e visão estratégica.
Não escrevo aqui como consultor, mas como alguém que vivencia, diariamente, as consequências das decisões que sustentam não apenas o crescimento, mas a própria existência de um escritório de advocacia.
No fim, sobrevivência não é resistir: é reinventar-se.