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PLP 108/24 da reforma tributária - Um novo mundo tributário é possível

Uma análise critica dos seus principais pontos, impactos esperados, evidenciando os riscos, desafios e esperança para contribuintes, profissionais tributários, Estados e municípios.

6/10/2025

Introdução

Com a EC 132/23, que instituiu o novo sistema tributário sobre o consumo no Brasil, baseado no IBS - Imposto sobre Bens e Serviços e na CBS - Contribuição sobre Bens e Serviços, se discute intensamente sobre as possibilidades de melhorias no sistema tributário, onde muitos pontos ainda precisam da devida regulamentação. Neste sentido, sendo aprovado recentemente o segundo projeto de regulamentação da reforma tributária, o PLP 108/24, considera-se pauta necessária entre os tributaristas e todo cidadão, tudo que vai afetar as realidades de consumo, pois o consumo esta entre todos nós. Entre suas principais inovações, destaca-se a criação do Comitê Gestor do IBS, órgão responsável por arrecadar, gerir e distribuir a receita entre os entes federativos, além de editar regulamento único e uniformizar a interpretação da legislação. O presente artigo analisa a estrutura proposta de alguns dos  pontos da PLP e seus reflexos na segurança jurídica, no equilíbrio federativo e nas garantias do contribuinte.

1. Estrutura do CG-IBS - Comitê Gestor do IBS

O PLP 108/24 institui o CG-IBS como entidade pública sob regime especial, com autonomia técnica, administrativa e orçamentária. O órgão contará com Conselho Superior, Diretoria Executiva, Corregedoria e Auditoria Interna. Suas atribuições incluem editar regulamento único, arrecadar o IBS, realizar compensações e decidir contenciosos administrativos. A ideia parece ser boa, pois centralizará os procedimentos de acompanhamento e decisões que vão impactar diretamente nas operações tributárias. Sendo uma comissão que a vista pode ser estratégica, por ter caráter técnico, por contar também com representantes dos entes federativos, pode-se dizer que há certa esperança neste modelo.

2. Processo administrativo e penalidades

E um dos pontos mais complexos do mundo tributário, são os processos administrativos fiscais, por sua complexidade e morosidade. Constantemente os tributaristas e profissionais contábeis,  enfrentam os conflitos entre a norma tributária e norma da Receita Federal. O projeto prevê um processo administrativo tributário centralizado no CG-IBS, incluindo regras de fiscalização e penalidades. Agora há esperança mesmo no CG-IBS, pela proposta da sua composição com caráter técnico, que em tese vai entender as dores dos tributaristas e contribuintes.

Durante a fase de transição, a fiscalização terá caráter pedagógico, permitindo a correção de omissões em 60 dias. Entretanto, o PLP prevê multas severas, que podem chegar a 150% em casos de fraude ou reincidência, o que gera críticas quanto à proporcionalidade das sanções e à proteção das garantias fundamentais dos contribuintes. Neste sentido, desanima um pouco, pois o grande monstro do mundo tributário, que são as multas grandiosas, ainda irá assombrar muito os contribuintes.

3. Créditos de ICMS e transição

Créditos de ICMS, um ponto discutido constantemente, será que agora teremos uma solução boa para os contribuintes? A PLP 108/24, regulamenta a compensação de saldos acumulados até 2032, finalmente! E ainda possibilita a compensação com débitos de ICMS/IBS, transferência a terceiros ou o ressarcimento em ate 240 parcelas, porém os estados e o Distrito federal, terão 24 meses para analisar a homologação. Sendo um dos assunto mais polêmicos, considera ser de extrema importância uma atenção especial dos tributaristas e profissionais da área, para este ponto, sendo necessário estudos aprofundados de cada situação, pois a regulamentação ainda deixa  várias dúvidas sobre como será na prática.  

4. Alterações no ITCMD

O PLP também altera as regras do ITCMD, estabelecendo novas hipóteses de incidência e critérios de cálculo. Inclui a exigência de avaliação de mercado de quotas societárias e participações, podendo elevar a carga tributária em transmissões patrimoniais. Determina ainda a redefinição do local de cobrança, o que impacta a arrecadação estadual. Mas este é um ponto que ainda gera muita insegurança jurídica, pois a ideia de uniformização e a progressividade, será de fato a melhor forma deste tributo? Pensando em um dos princípios da reforma tributária, que é o da cooperação, a fim de evitar a guerra fiscal, vale a reflexão sobre isto.

5. Split Payment

Um sistema de pagamento mais eficaz, esta é a ideia deste ponto que  é um dos que mais tem gerado dúvidas sobre sua funcionalidade. O PLP trás a flexibilização dos prazos e da tratamento diferenciado a pequenas plataformas, reconhecendo as dificuldades de adaptação tecnológica. E ainda prevê penalidades ao sistema financeiro caso não seja implementado o split a partir de 2027. Isso é algo que vamos ver na prática, pois um sistema de pagamentos instantâneo como se apresenta, vai deixar muitas operações dependentes dos sistemas financeiros e da Receita Federal, que pelo visto não vai cair nunca, mas a ideia é de fato otimizar a arrecadação e evitar sonegação.

6. Benefícios do trabalhador

Um dos benefícios mais utilizados nas empresas para o trabalhados, são o vale-transporte, vale-refeição e o vale-alimentação. No PLP estes benefícios foram retirados da regra que exigia acordo ou convenção coletiva de trabalho, que neste caso, essa era a condição que permitia o aproveitamento dos créditos sobre essas aquisições, ou seja, desburocratizou o procedimento. Logo, se observa uma boa oportunidade de redução tributária e valoração destes benefícios ao trabalhador, sendo agora essenciais para o empresário para obter seus créditos e sempre necessários para o empregado.

7. Cashback

Eis um ponto que todo cidadão esta curioso de como será de fato na prática, por envolver o cidadão em seus consumos de itens essenciais. No período de transição, parte da receita será progressivamente retida para compensar perdas dos entes federativos. O texto também ajusta o cashback para viabilizar a devolução em operações com gás canalizado no regime monofásico, sem necessitar de destaque do imposto na nota fiscal, coisa boa, pois não se torna tão burocrático o processo de devolução.

De acordo com o PLP, a arrecadação de IBS e CBS será ajustada para considerar o cashback (devolução tributária para contribuintes de baixa renda). O mesmo vale para as alíquotas diferenciadas e para o crédito presumido, este que se refere ao benefício que permite a uma empresa reduzir o imposto a pagar sem ter que comprovar todos os custos ou tributos já pagos.

8. Conclusão

O PLP 108/24 representa etapa crucial da reforma tributária brasileira, ao estruturar o Comitê Gestor do IBS e disciplinar questões centrais para a transição ao novo modelo de tributação do consumo.

Apesar de seu potencial de simplificação e maior equilíbrio federativo, o projeto traz desafios significativos, especialmente quanto à proteção dos contribuintes, à gestão de créditos acumulados e à viabilidade técnica da implementação. A eficácia da reforma dependerá da clareza normativa, da cooperação entre entes federados, da observância às garantias constitucionais e a conformidade com seus princípios.

Embora, se vislumbre possibilidades de maior transparência fiscal , observa-se muitas lacunas legislativas que ainda precisam de atenção, como os riscos à segurança jurídica devido à concentração de competências no CG-IBS, além da severidade das penalidades e aumento da carga tributária no período de transição. Do ponto de vista federativo, o novo modelo de distribuição do IBS poderá causar perdas a Estados produtores, enquanto beneficia Estados de consumo.

Outro ponto sensível é a complexidade operacional e os prazos de implementação, que exigirão grande esforço institucional e tecnológico, em especial dos profissionais contábeis, advogados tributaristas e empresários que participam efetivamente de planejamentos gerenciais, ou seja, todos devem estar atentos a qualquer mudança e novidade. E neste momento, o mais importante é o diálogo, troca de conhecimento, e a busca por profissionais que estão constantemente se atualizando do que mais vem por ai, e fazendo estudos mais aprofundados, baseando-se em situações casuísticas.

Por fim, há esperança , porque toda mudança vem com o movimento e pespectiva de melhorias, mas neste momento toda atenção é necessária, pois se recorda que o Brasil, há anos tem um sistema tributário mais complexo, e agora se caminha pela sua simplificação, transparência e justiça tributária, este último, não como utopia, mas como meta de que somando todo o esforço dos profissionais, Estado e de cada cidadão, será possível.

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Referência

BRASIL. Projeto de Lei Complementar 108, de 2024. Institui o Comitê Gestor do IBS e dispõe sobre normas tributárias correlatas. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/. Acesso em: 01 out. 2025

SENADO FEDERAL. Notícias sobre a tramitação do PLP 108/2024. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/. Acesso em: 01 out. 2025

JOTA. O reforço e a fragilização das garantias fundamentais no PLP 108/2024. Disponível em: https://www.jota.info/. Acesso em: 01 out. 2025

REFORMA TRIBUTÁRIA. Análises críticas do PLP 108/2024. Disponível em: https://www.reformatributaria.com/. Acesso em: 01 out. 2025

PORTAL GOV.BR. Secretário do Ministério da Fazenda participou de seminário sobre as novas regras de tributação na Assembleia Legislativa de São Paulo nesta sexta-feira, Disponível em: https://www.gov.br/fazenda/pt-br/assuntos/noticias/2025/setembro/appy-destaca-importancia-do-comite-gestor-do-ibs-no-novo-sistema-de-tributacao. Acesso  em 1 out. 2025

PORTAL GOV.BR. Split payment está sendo desenvolvido para ter mínima interferência nas práticas comerciais, ressalta Appy. Disponivel em: https://www.gov.br/fazenda/pt-br/assuntos/noticias/2025/marco/split-payment-esta-sendo-desenvolvido-para-ter-minima-interferencia-nas-praticas-comerciais-ressalta-appy. Acesso em 01 de out. 2025.

VEJA ABRIL.COM. Senado aprova segundo projeto de regulamentação da reforma tributária . Disponível em: https://veja.abril.com.br/economia/senado-aprova-segundo-projeto-de-regulamentacao-da-reforma-tributaria/. Acesso em 01 out. 2025.

Aline Barbosa Almeida
Advogada Tributarista, contadora, especialista em tributos e planeamento tributário estratégico. Fundadora do IPECT. Coord. Fiscal/Tributária na MAZ Contabilidade. Mest. em Direito Económico.

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