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Ética, publicidade e bets: hora de regular para proteger

O texto aborda o boom das apostas online, que já movem R$ 30 bi/mês, alertando para lacunas na publicidade. Defende regulação ética, citando o PL 2.985/23 e a portaria 1.231/24 sobre jogo responsável.

21/11/2025
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No Brasil, o mercado de apostas (bets) online movimenta entre R$ 20 e 30 bilhões por mês - dados recentes do Banco Central confirmam este volume só entre janeiro e março de 2025. Para termos uma perspectiva, atualmente, as bets movimentam entre R$ 600 milhões e R$ 1 bilhão por dia no Brasil, considerando apenas as transações via Pix e sem contar outras formas de pagamento, como cartão ou TED - o que indica que esse valor pode ser ainda maior.

Estamos falando de algo que gera impacto direto no cotidiano das pessoas, sobretudo dos mais vulneráveis.

A comparação é inevitável: o Tesouro Direto, por exemplo, em julho de 2025 movimentou pouco mais de 10 bilhões no mês (incluindo investimentos e resgates). Ou seja, o mercado de apostas cresce em um ritmo acelerado, mas a regulação da sua publicidade segue atrasada. E é justamente nesse descompasso que mora o risco.

Desde os primeiros passos da publicidade no Brasil, tivemos a ética como norte. O Conar ajudou a estruturar parâmetros para setores sensíveis como bebidas alcoólicas e tabaco. Hoje, no entanto, o cenário é outro: influenciadores digitais, redes sociais e empresas offshore criaram um ecossistema em que a ausência de normas claras abre espaço para danos reais. E eu, que vivo esse universo de comunicação e regulação, vejo a urgência de tratar a publicidade das bets com o mesmo cuidado que já tivemos com outros setores.

Defendo uma publicidade regulada - nunca ausente. Porque ela é o que garante transparência, cria barreiras contra abusos e protege principalmente menores de idade. Isso não é uma trava para o mercado, mas sim uma salvaguarda para que o crescimento seja sustentável. Esse ambiente hiperdigitalizado torna urgente criar salvaguardas eficazes.

O PL 2.985/23 é um passo nesse sentido. Aprovado no Senado e agora em análise na Câmara, ele propõe restrições importantes: limitar o uso de atletas, celebridades e influenciadores em campanhas de casas de apostas, além de impor regras de horário e de meios de veiculação. Para mim, a mensagem central é clara: precisamos evitar que a publicidade se torne uma ferramenta de sedução de públicos vulneráveis, ao mesmo tempo em que não fechamos as portas para a inovação e a economia.

A justificativa central é proteger públicos vulneráveis - como menores - e minimizar os riscos de ludopatia, ao passo que o seu substitutivo tenta alcançar um equilíbrio entre inovação e responsabilidade social.

Outro avanço foi a portaria SPA/MF 1.231/24, que trouxe o conceito de “jogo responsável” para o centro do debate. Ferramentas de autocontrole, limites de tempo e valor, mecanismos de autoexclusão e alertas claros são mecanismos que considero essenciais. Não basta permitir o jogo - é preciso garantir que ele aconteça dentro de limites saudáveis.

Se olharmos para fora, países como Reino Unido e Irlanda já nos mostram caminhos. O Reino Unido exige mensagens de jogo responsável em anúncios e controle rígido contra acesso de menores. A Irlanda, por sua vez, proibiu publicidade em TV e online em horários de maior exposição infantil. Esses modelos reforçam algo que acredito profundamente: não há incompatibilidade entre mercado forte e proteção social.

Esses modelos demonstram que a responsabilização das operadoras e a proteção dos consumidores podem andar juntas - por meio de alertas contra ludopatia, restrição de horário, disclaimers e políticas claras de jogo responsável.

O Brasil está diante de uma encruzilhada. Temos a chance de estruturar um marco legal que regulamente a publicidade das bets, assegurando ética, transparência e proteção sem ignorar o potencial econômico. E digo mais: a ética publicitária não limita a inovação - é justamente o que a permite prosperar de forma sustentável e responsável.

Autor

Igor Reichow Advogado com 18+ anos em mídia, tecnologia e marketing. Especialista em societário, M&A e LGPD. Head of Legal da B&Partners.Co e membro da ANPPD®, com experiência docente e atuação internacional.

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