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Acordo é o mais indicado juridicamente para logística reversa de eletrônicos, diz advogada

Advogada comenta importância do acordo para uma política nacional de logística reversa de eletroeletrônicos.

26/2/2013

A Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano, do Ministério do Meio Ambiente, lançou Edital de Chamamento 1/13 para a elaboração de acordo setorial para a implantação de sistema de logística reversa de produtos eletroeletrônicos.

De acordo com o edital, a indústria de eletroeletrônicos terá de recolher e reciclar 17% dos produtos que forem colocados no mercado, em um prazo de até cinco anos após a assinatura do acordo. As indústrias podem apresentar um plano de até junho.

Obsolescência

A troca de eletroeletrônicos pelos consumidores tem ocorrido em ritmo cada vez mais ágil. Muito antes da vida útil dos aparelhos ter chegado ao fim, o público corre atrás das últimas novidades tecnológicas. No início do mês, o Instituto Brasileiro de Politica e Direito da Informática ajuizou ação contra a Apple acusando-a de realizar “prática comercial abusiva” no lançamento do iPad de quarta geração, citando o conceito de “obsolescência programada”. Do modelo original para o iPad 2 foram 14 meses; o da terceira geração chegou um ano depois e sete meses depois veio um novo modelo.

Nesse sentido, o edital do Ministério do Meio Ambiente chega em boa hora para lidar com a questão do descarte desses aparelhos. Acerca do tema, entrevistamos a advogada Ana Grizzi, sócia da área ambiental do escritório Veirano Advogados, que comenta a importância do acordo para uma política nacional de logística reversa de eletroeletrônicos, seus impactos ambientais e sociais, entre outros tópicos.

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1 – Qual a importância do Acordo Setorial para uma política nacional de logística reversa de produtos eletroeletrônicos ?

O Acordo Setorial é essencial para a implantação de sistemas de logística reversa, inclusive de eletroeletrônicos. Em que pese haver outros 2 instrumentos de implantação – Decreto ou Termo de Compromisso - o Acordo Setorial é o mais indicado do ponto de vista jurídico. Ele pressupõe negociação entre todos os stakeholders (governo, fabricantes, importadores, distribuidores e varejo) para criação e efetivação de um sistema que seja operacional e tecnicamente viável, além de tratar das questões legais (a exemplo de divisão de responsabilidade). Até este momento, temos a previsão legal da logística reversa na Política Nacional de Resíduos Sólidos e no Decreto que a regulamenta, porém, são normas 'de eficácia limitada', até que tenhamos o Acordo Setorial assinado, Decreto publicado ou Termo de Compromisso assinado.

2 – Qual o principal ponto de discussão do Acordo ?

O principal ponto de discussão é a meta quantitativa: até o 5º ano após a assinatura do Acordo Setorial, a logística reversa deve atingir 17%, em peso, dos produtos eletroeletrônicos colocados no mercado nacional no ano anterior ao da assinatura do Acordo. Considerando que o eletroeletrônico é de propriedade do consumidor, o consumidor pode estender sua vida útil, a seu exclusivo critério; o consumidor pode doá-lo ou vendê-lo, ou, simplesmente, deixá-lo guardado na gaveta de casa (afinal, quem de nós não tem um celular que virou game portátil dos filhos ou que é back up para emergências?). Como obrigar fabricantes, importadores, distribuidores e varejo a cumprir meta de recolhimento? Aliás, se a própria Política prevê reuso como prioritário se comparado à reciclagem, qual a razão da meta quantitativa?

3 – O que as empresas devem considerar no momento de elaborar a logística reversa ?

Há três pilares de trabalho para elaboração do sistema de logística reversa: técnico – assegurar que o resíduo seja gerenciado por empresas que efetivamente tenham capacitação técnica para sua reciclagem; operacional – assegurar que o retorno do 'resíduo' será viável em termos de logística de transporte e armazenagem, principalmente considerando nossa dimensão territorial; jurídico – assegurar que os envolvidos estejam cientes de sua parcela de responsabilidade (a famosa responsabilidade compartilhada) e das potenciais penalidades em caso de descumprimento, incluindo a incerteza sobre futuras decisões judiciais relacionadas a danos ambientais derivado de resíduos pós-consumo.

4 – Quais as principais dificuldades em sua implantação ?

No meu ponto de vista, as principais são: (i) custos de armazenagem/transporte: nossa dimensão territorial torna extremamente difícil a implantação do sistema – como será a armazenagem e transporte de geladeiras usadas? Acredito ser inevitável que o custo de logística reversa acabe sendo incorporado aos produtos; e (ii) articulação entre fabricantes, importadores, varejo e distribuidores: ainda há resistência em aceitar as novas obrigações legais por alguns participantes do sistema, por isso, alguns setores estão se recusando a negociar ou aceitar quaisquer obrigações (leia-se, custos).

5 – Quais seriam os impactos sociais e econômicos da implantação da logística reversa ?

O consumidor terá de ser educado para devolver eletroeletrônicos fora de uso ou funcionamento, quando assim desejar fazê-lo. Em razão da responsabilidade ambiental, não concordo com o envolvimento de cooperativas de catadores no sistema de eletroeletrônicos.

O custo do tratamento do resíduo pós-consumo certamente acabará sendo incorporado ao produto. Toda mudança de paradigma tem aspectos bons e ruins: se por um lado o consumidor reclamará do custo acrescido ao produto, por outro, e desde que isso realmente aconteça, ao dar destinação ambientalmente adequada aos resíduos eletroeletrônicos que o consumidor efetivamente quiser descartar, claramente melhoraremos nossa gestão de resíduos, o que vai se refletir na melhora das questões de saúde pública, incluindo áreas contaminadas.

6 – Qual o papel das cooperativas ou outras formas de associações de catadores de materiais recicláveis ou reutilizáveis no acordo ?

No setor de eletroeletrônicos, entendo que do ponto de vista técnico e jurídico as cooperativas não podem fazer parte do processo. A insegurança jurídica sobre responsabilidade ambiental em casos de danos derivados da má gestão de resíduos pós-consumo torna este item extremamente preocupante. Além disso, há a questão de necessidade de licenciamento ambiental para o estabelecimento no qual os produtos serão desmontados/reciclados e não acredito que cooperativas tenham qualificação técnica para isso.

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