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Ação popular busca barrar comemoração do golpe de 64 determinada por Bolsonaro

Presidente determinou que unidades militares realizem “comemorações devidas” em 31 de março.

26/3/2019

Após o presidente Jair Bolsonaro determinar que quartéis realizem “comemorações devidas” do golpe de 64, o advogado Carlos Alexandre Klomfahs ingressou com ação popular nesta terça-feira, 26, para requerer que a presidência da República se abstenha de comemorar o dia 31 de março de 1964.

Na ação, o advogado afirma que, com as comemorações, "o leitmotiv do Governo Federal não é o interesse público e sim o 'jogo da classe dominante'".

"Muda-se o governo prossegue o drama. Há reiterado problema incontornável quanto à violação à moralidade administrativa. Isso porque o grau de desenvolvimento de um país se mede pela expansão e efetividade dos direitos fundamentais."

Comemoração

Na última segunda-feira, 25, o porta-voz da presidência, general Otávio Rêgo Barros, afirmou que o presidente determinou ao Ministério da Defesa que sejam feitas comemorações em referência à "data histórica", quando um golpe militar derrubou o governo João Goulart e iniciou um regime ditatorial que durou 21 anos. No período, não houve eleição direta para presidente. O Congresso Nacional chegou a ser fechado, mandatos foram cassados e houve censura à imprensa.

O presidente não considera 31 de março de 1964 um golpe militar”, disse o porta-voz. Segundo Rêgo Barros, na avaliação de Bolsonaro, sociedade civil e militares, “percebendo o perigo” que o país vivenciava naquele momento, se uniram para “recuperar e recolocar o nosso país no rumo”. “Salvo melhor juízo, se isso não tivesse ocorrido, hoje nós estaríamos tendo algum tipo de governo aqui que não seria bom para ninguém”, disse o porta-voz.

A efeméride voltará ao calendário de comemorações das Forças Armadas após oito anos. Em 2011, a então presidente Dilma Rousseff, ex-militante torturada no regime ditatorial, orientou os comandantes da Aeronáutica, do Exército e da Marinha a suspenderem qualquer atividade que lembrasse a data nas unidades militares.

Outras ações

Outra ação popular foi posteriormente proposta pelo senador Randolfe Rodrigues, pela deputada Joênia Wapichana e pelo porta-voz da Rede Sustentabilidade Pedro Ivo Batista, a fim de coibir os atos de comemoração ao golpe de 64. 

Os parlamentarem alegam "completo descompasso com os preceitos republicanos estabelecidos na CF/88, e por haver clara violação ao patrimônio público econômico e moral".

No mesmo sentido, a DPU ingressou com ACP, alegando que a ditadura militar violou diversos direitos e garantias fundamentais dos brasileiros e que o regime promoveu assassinatos, torturas, prisões arbitrárias e cassações de políticos, funcionários públicos e dirigentes sindicais.

Todas as ações requerem, liminarmente, que as Forças Armadas se abstenham de comemorar a data que marcou o início da ditadura militar no Brasil. 

Gravidade constitucional

Em nota pública divulgada nesta terça-feira, 26, a PGR pontuou ser "incompatível com o Estado Democrático de Direito festejar um golpe de Estado e um regime que adotou políticas de violações sistemáticas aos direitos humanos e cometeu crimes internacionais." 

"Embora o verbo comemorar tenha como um significado possível o fato de se trazer à memória a lembrança de um acontecimento, inclusive para criticá-lo, manifestações anteriores do atual presidente da República indicam que o sentido da comemoração pretendida refere-se à ideia de festejar a derrubada do governo de João Goulart em 1º de abril de 1964 e a instauração de uma ditadura militar. Em se confirmando essa interpretação, o ato se reveste de enorme gravidade constitucional, pois representa a defesa do desrespeito ao Estado Democrático de Direito."

O presidente do Conselho Federal da OAB, Felipe Santa Cruz, disse, em nota, que comemorar a instalação da ditadura é "dirigir olhando para o retrovisor, mirando uma estrada tenebrosa". "A quem pode interessar celebrar um regime que mutilou pessoas?"

Em um cenário de crise econômica, com quase 13 milhões de desempregados, é preciso olhar para a frente e tratar do que importa: o futuro do povo brasileiro. Comemorar a instalação de uma ditadura que fechou instituições democráticas e censurou a imprensa é querer dirigir olhando para o retrovisor, mirando uma estrada tenebrosa. Não podemos dividir ainda mais uma nação já fraturada: a quem pode interessar celebrar um regime que mutilou pessoas, desapareceu com seus inimigos, separou famílias, torturou tantos brasileiros e brasileiras, inclusive mulheres grávidas? Não podemos permitir que os ódios do passado envenenem o presente, destruindo o futuro.

Felipe Santa Cruz

 

Presidente nacional da OAB

A Anadef - Associação dos Defensores Públicos Federais manifestou repúdio à medida anunciada pelo porta-voz do governo sobre a recomendação de Bolsonaro. "A decisão do Governo é um estimulo grave ao ódio e à tortura." Veja a íntegra:

Nota Pública

A Associação dos Defensores Públicos Federais (Anadef) manifesta repúdio à medida anunciada pelo porta-voz do Palácio do Planalto, que confirmou a recomendação do presidente Jair Bolsonaro para atos em comemoração ao Golpe Militar, no próximo dia 31 de março.

Para os defensores públicos federais, que atuam na garantia dos direitos humanos, a decisão do Governo é um estimulo grave ao ódio e à tortura. Celebrar a data é ignorar a dor de dezenas de brasileiros, é retroceder aos direitos conquistados sob a morte daqueles que lutaram por um País livre, entre eles índios, sindicalistas e líderes rurais e religiosos, desaparecidos e assassinados durante o triste período da ditadura militar. 

Temos apreço e respeito às Forças Armadas que têm como seu papel institucional garantir e preservar os poderes constitucionais. No entanto, sob a pretensão de exaltar o Exército Brasileiro, a comemoração do golpe de 64 celebra um momento em que o papel das Forças Armadas foi deturpado e corrompido. O golpe de 64 representou uma violação profunda do Estado Democrático de Direito, inaugurando um período em que a tortura, a violência e a perseguição política foram institucionalizados no Brasil.

Em nome daqueles que sofreram e ainda sofrem a dor dos dias marcados pela ditadura militar, rechaçamos qualquer manifestação no sentido de reconhecer a data além do que ela estritamente representa: um dos períodos de maior sofrimento na história do País.

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