COLUNAS

  1. Home >
  2. Colunas >
  3. Meio de campo >
  4. A reforma tributária e o futebol: uma mensagem de esperança que vem do Senado Federal

A reforma tributária e o futebol: uma mensagem de esperança que vem do Senado Federal

quarta-feira, 8 de novembro de 2023

Atualizado às 08:34

O texto publicado na coluna da semana passada alertava para determinados pontos da reforma tributária, em avanço no Senado Federal, que poderiam prejudicar o desenvolvimento econômico do futebol. Pelos motivos lá contidos, o texto propunha, ao final, a inserção do futebol dentre as atividades catalogadas no art. 156-A, parágrafo 6º, que se sujeitariam, com a reforma, a possíveis regimes específicos de tributação, estabelecidos por lei complementar.

A proposta gerou interessantes reações, sobretudo de apreensão em relação ao futuro do incipiente - porém, já robusto - mercado do futebol, criado a partir do advento da lei 14.193/21 ("Lei da SAF"), de autoria do Senador da República e Presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD/MG).

Lembre-se, aliás, que o Presidente Rodrigo Pacheco, ao assumir a presidência da Casa, pronunciou, em seu segundo ou terceiro discurso, que pretendia repassar e corrigir um equívoco histórico, consistente na falta de política pública voltada ao futebol.

Ele tinha razão: apesar de seu monumental potencial econômico, social e educacional, o esporte era tratado pelo Estado - e pelos sucessivos governos - como prática diversionista ou de mero lazer; ou como a mais importante das coisas menos importantes.

Associar o futebol apenas a uma prática esportiva - o que não seria pouco -, eventualmente diversionista ou alienante, e ainda pouco relevante, consistia em erro que fundamentava o seu aprisionamento secular em associações sem fins econômicos, sem que se oferecesse uma alternativa de solução à bilionária e crescente dívida dos clubes, construída, paradoxalmente, em ambiente de históricos favorecimentos tributários.

Com o advento da Lei da SAF, a perspectiva começou a ser reformulada. Logo se percebeu que o país estava à procura de uma mina, a principal mina do entretenimento planetário, mirando-a lá longe, no horizonte, quando, na verdade, sentava-se sobre ela.

Sim, se a Coréia do Sul foi capaz de transformar sua música, batizada de k-pop, cantada em idioma pouco (ou nada) falado fora de seu território, em fenômeno planetário, imagine-se o que pode ser feito com o futebol, maior manifestação de entretenimento do planeta, que congrega aproximadamente 5 bilhões de seguidores e se tornou, além de um fenômeno local, um produto globalizado?

De cuja globalização o Brasil, maior produtor de jogadores (que respondem por cerca de 11% de todas as negociações globais) e maior ganhador de copas do mundo, passou, muito por conta de seu arcaico e insuficiente modelo legislativo, à função de mero exportador de meninos imberbes (ou de pé-de-obra) e à posição de importador de tecnologia.

Mais: se a indústria norte-americana do cinema se transformou há décadas em uma embaixada cultural (ou foi forjada como tal), que penetra em residências de praticamente todos os países existentes, o futebol brasileiro deveria, reconhecida a sua dimensão, ser uma espécie de soft power internacional, a abrir oportunidades de geração e distribuição de riquezas entre suas gentes.

Para tanto, faltava um marco legal viabilizador do encontro entre, de um lado, o proprietário do futebol - que não é o torcedor, como pretende, aí sim, de modo diversionista, o cartolismo clássico -, ou seja, o clube, e, de outro lado, o proprietário de capitais.

O déficit no âmbito legislativo, algo raro no Brasil, impediu, pois, a atração de recursos, a realização de investimentos, maior geração de empregos e renda, a distribuição de riquezas, a formação de uma base de negócios sobre os quais deveria haver a incidência da norma tributária e, enfim, a criação de um ambiente pujante e sustentável.

Em consequência, as entidades esportivas se tornaram obsoletas, em alguns casos inviáveis, e não puderam (ou quiseram) afastar o vício da dependência das leniências estatais para sobreviver. Daí, o resultado: além da baixa arrecadação, o fisco se tornou credor contumaz (e relevante) dos clubes, e o Estado não computava a atividade empresarial-futebolística em suas projeções orçamentárias.

Em outras palavras, pelo lado da arrecadação, o futebol caminhava à margem da sociedade e, no plano das benesses, sempre fora um de seus principais beneficiários.

Toda essa contradição, remanescente do patrimonialismo do século retrasado, começou a se dissipar com a Lei da SAF, que permitiu a passagem do modelo associativo ao empresarial, o qual é, por definição, contribuinte do erário.

Dentre os instrumentos viabilizadores do novo modelo, criou-se um regime especial de tributação, consistente em solução, como já dito no texto da coluna anterior, (i) simplificadora para a apuração de tributos federais, (ii) que não gera discussão sobre crédito e (iii) que permite ao Estado estimular a transição das entidades beneficiadas com regimes de isenção para regimes de contribuição.

Por todos esses motivos, a proposta de inserção de novo inciso no parágrafo 6º do art. 156-A, longe de um movimento de renúncia, revelava-se como uma ação voltada à manutenção da inclusão tributária e à perspectiva de aumento de arrecadação - em função da produção de riquezas.

E tão ou mais importante: representativa de inequívoco sinal de confiabilidade institucional - e de que, enfim, o país passara a sustentar uma política pública (voltada e construída) para o futebol.

Essa perspectiva foi condensada na Emenda 740, de autoria do Senador da República Carlos Portinho (PL/RJ) - que também foi o Relator no Senado Federal da Lei da SAF -, acatada pelo Relator da PEC 45/19, Senador da República Eduardo Braga (MDB/AM), conforme a seguinte redação:

"§6º Lei Complementar poderá estabelecer regimes específicos de tributação para: (...) IV - serviços de hotelaria, parques de diversão e parques temáticos, agências de viagens e de turismo, bares e restaurantes, atividade esportiva desenvolvida por Sociedade Anônima do Futebol e aviação regional, podendo prever hipóteses de alterações nas alíquotas, nas bases de cálculo e nas regras de creditamento, admitida a não aplicação do disposto no § 1º, V a VIII;".

De modo que o Senado Federal - e, espera-se, o Congresso Nacional - manda uma mensagem de esperança aos aproximadamente 150 milhões de torcedores e ao próprio país.