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O julgamento ampliado do colegiado em caso de divergência (CPC, art. 942) e as repercussões práticas da definição de sua natureza jurídica

O NCPC traz o julgamento ampliado do colegiado em caso de divergência, nova regra que pode substituir os embargos infringentes.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Atualizado em 7 de fevereiro de 2017 10:13

O art. 942 do CPC assim dispõe: "Quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores".

A regra foi estabelecida como sucedâneo ao recurso dos embargos infringentes. Não há mais previsão do recurso de embargos infringentes. Em seu lugar, há a previsão da ampliação do órgão julgador em caso de divergência.

O expediente previsto no art. 942 do CPC não ostenta natureza recursal. Não se trata de recurso, pois a regra incide antes de haver encerramento do julgamento.

A regra aplica-se ao julgamento da apelação. Colhidos os votos e não havendo resultado unânime, não se encerra o julgamento. Este haverá de prosseguir em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial. Com a colheita dos votos, e verificando-se não haver unanimidade, o julgamento não se encerra: há de prosseguir com novos membros. Tanto que não há lavratura de acórdão. Haverá, nos termos do próprio art. 942 do CPC, apenas prosseguimento da sessão, com a presença de novos julgadores, para que haja o encerramento do julgamento.

Não é irrelevante a discussão sobre a natureza jurídica do instituto previsto no art. 942 do CPC. Há grandes repercussões práticas: se se entende que é um recurso, deve-se partir da premissa de que houve uma decisão proferida, com lavratura de acórdão (CPC, art. 941), podendo desse acórdão caber, antes mesmo da convocação de novos julgadores em prosseguimento, embargos de declaração. Ademais, se se tratasse de recurso, haveria novo julgamento, com novos votos a serem proferidos por quem já participou. E mais: se quem já votou viesse a afastar-se ou a ser substituído, poderia ter seu voto alterado, não se aplicando, justamente por ser um novo julgamento de um novo recurso, a parte final do disposto no § 1º do art. 941 do CPC.

Se se entendesse que seria recurso, deveria ser aplicado o art. 25 da lei 12.016/09, segundo o qual não cabem embargos infringentes no processo de mandado de segurança. A prevalecer o entendimento de que há natureza recursal na hipótese prevista no art. 942 do CPC, o art. 25 da lei 12.016/09 haveria de se manter. Desse modo, não se aplicaria o disposto no art. 942 do CPC ao julgamento da apelação em mandado de segurança.

Não se trata, porém, de recurso.

Sendo assim, não há necessidade de ser lavrado o acórdão. Colhidos os votos e não havendo unanimidade, prossegue-se o julgamento, na mesma ou em outra sessão, com mais outros julgadores, para que se tenha, aí sim, o resultado final, com a lavratura do acórdão. Se não há decisão ainda, o prosseguimento do julgamento com ampliação do número de julgadores não é recurso. O recurso, voluntário ou de ofício, pressupõe decisão anteriormente proferida. No caso do art. 942 do CPC, não há encerramento, mas prosseguimento do julgamento. Por não haver natureza recursal nesse procedimento, não é possível que haja embargos de declaração entre a constatação do julgamento por maioria e seu prosseguimento em nova sessão com ampliação do número de julgadores. Aqui também incide o disposto no § 1º do art. 941 do CPC: os votos já proferidos não poderão ser alterados, se os julgadores forem afastados ou vierem a ser substituídos.

Como a hipótese do art. 942 do CPC não tem natureza de recurso, o art. 25 da lei 12.016/09 perdeu sua eficácia normativa, pois não há mais embargos infringentes no sistema processual civil brasileiro. O instituto previsto no art. 942 do CPC não tem natureza recursal, sendo uma etapa necessária do julgamento da apelação, quando verificada maioria de votos entre os membros do colegiado. A regra aplica-se ao julgamento da apelação em mandado de segurança, não havendo qualquer dispositivo que a afaste ou impeça sua incidência.

A decisão na apelação ou no agravo de instrumento deve ser tomada, no órgão colegiado, pelo voto de três membros (art. 941, § 2º, CPC). Um julgamento não unânime, nesse caso, é uma decisão com dois votos vencedores e um voto vencido. Logo, hão de ser convocados mais dois julgadores para que se possa, eventualmente, ser invertida a conclusão, agregando-se os dois novos votos ao vencido, tendo-se um resultado 2 x 3. Mas também é possível que os novos votos se somem aos votos até então vencedores, tendo-se um resultado de 4 x 1, ou ainda é possível que um dos novos votos se some aos votos até então vencedores e o outro, ao vencido, mantendo-se o resultado até então obtido, só que com uma votação de 3 x 2. E ainda é possível que, após um novo voto, o julgador que já havia votado reflua e modifique seu voto, exatamente porque o julgamento ainda não se encerrou - por isso, é importante dizer que "a revisão do voto, após a ampliação do colegiado, não afasta a aplicação da técnica de julgamento do art. 942" (enunciado n. 599 do Fórum Permanente de Processualistas Civis).

O que faz incidir a regra decorrente do art. 942 do CPC é a votação não unânime. Se, retomado o julgamento com a presença dos novos julgadores, aquele que proferiu o voto vencido pode alterar seu voto. Isso, porém, não afasta a regra, nem acarreta a "desconvocação" dos novos julgadores.

Justamente por não ser um recurso, a ampliação do julgamento prevista no art. 942 do CPC não tem "efeito devolutivo". Significa que os novos julgadores, convocados para que o julgamento tenha prosseguimento, não estão limitados a decidir sobre o ponto divergente. O julgamento está em aberto, não se tendo encerrado. Quem já votou pode alterar seu voto e quem foi convocado pode decidir sobre tudo que está pendente de deliberação definitiva. Se o julgador que já proferiu o voto afastar-se ou for substituído, não poderá ter seu voto alterado (CPC, art. 941, § 1º).

O julgamento não encerrou e irá prosseguir com uma composição ampliada. Todos os julgadores devem examinar os pontos controvertidos e apreciar toda a controvérsia, para que, então, se possa encerrar o julgamento. Haverá ampliação da composição e, igualmente, ampliação do debate, com um resultado mais maduro, fruto de discussão que contou com mais outros julgadores.

Quando se constata que o resultado até o terceiro voto não foi unânime, o julgamento terá, como visto, prosseguimento em outra sessão, desta vez com a presença de mais outros julgadores. O julgamento, como também já se viu, não se terá encerrado. Logo, não se anuncia o resultado final. Apenas se anuncia o resultado parcial com a suspensão do julgamento e designação de nova sessão para prosseguimento.

Como se vê, o art. 942 do CPC prevê uma ampliação do colegiado para julgamento, estabelecendo a suspensão da sessão de julgamento quando o resultado não for unânime e determinando que se prossiga, com outros membros, em nova designação.Não se trata de recurso. O recurso é cabível contra uma decisão proferida. Na hipótese do art. 942 do CPC, não há encerramento do julgamento. Colhidos os votos e não sendo unânime o resultado, incide a regra: convocam-se novos julgadores e designa-se nova sessão para prosseguimento do julgamento, e não para revisão ou reconsideração do que foi julgado. Não houve encerramento do julgamento, mas suspensão para prosseguimento com a composição do órgão julgador ampliada.
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*Leonardo Carneiro da Cunha é advogado do escritório da Fonte, advogados.

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