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Medida provisória 1.045/21 - Redução de Salário - Aplicabilidade aos empregados enquadrados nas hipóteses do artigo 62 da CLT

Lembrando que a Medida Provisória foi reeditada, única e exclusivamente com o objetivo da manutenção de emprego e renda diante da pandemia mundial que permanecemos atravessando, fazendo uma interpretação teleológica/sociológica.

sexta-feira, 30 de abril de 2021

Atualizado às 12:26

A Medida Provisória 1045/21 (DOU 27/4/21) reinstituiu o Programa Emergencial de Preservação do Emprego e Renda, antes regulado pela MP 936/20 (convertida na lei 14.020/20) e, como anteriormente, dispõe sobre medidas trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19).

Entre suas regras que visam a preservação do emprego e renda, tem, no artigo 7º1, a permissão de redução de salário com a respectiva redução da duração da jornada.

Pois bem! Estão incluídos nesta possibilidade de redução de salário aqueles empregados que estão inseridos no artigo 62 da CLT(os exercentes de jornada externa; os gerentes; os trabalhadores em regime de teletrabalho), que, por expressa definição legal, não estão abrangidos no Capítulo da Duração do Trabalho e, por conta disto, não tem uma jornada de trabalho?

Entendo que sim!!

No ano passado, quando tratávamos da questão (na vigência da MP 936 e/ou lei 14.020/20), publiquei dois artigos, um deles antes da conversão da MP 936 na Lei 14.020/2020 e outro, após a conversão daquela, nesta2.

Mas como reduzir o salário se estes trabalhadores não têm uma jornada de trabalho para ser reduzida proporcionalmente? Pela literalidade, a redução em questão não seria possível para os trabalhadores de que trata o art. 62 da CLT, pois não havendo a fixação de uma jornada, não teria como promover a proporcional redução.

Entretanto, como afastar desta possibilidade de redução de salário - e por consequência, de manutenção do emprego -, considerando que estamos enfrentando, por mais de um ano, uma crise sem precedentes, sem data certa para ser "debelada" e sem qualquer responsável (culpa) pela ocorrência da mesma, típica hipótese de força maior ( art. 501 da CLT), três "categorias" de trabalhadores que, sem qualquer dúvida, representam um percentual gigantesco dos postos de trabalho na atualidade?

No caso, diante dos problemas que afetam o mundo todo e, em específico, o nosso país, não podemos "fechar os olhos" para estes trabalhadores e, por conta disto, devemos, sim, fazer uma interpretação teleológica/sociológica e por que não dizer, também sistemática, do dispositivo em comento, buscando o sentido e alcance da norma, verificando sua finalidade diante da realidade social atual e sobretudo frente ao cenário do mundo do trabalho.

Registre-se que no ano passado, em apoio a esta argumentação interpretativa (teleológica/sociológica), tivemos a posição do Pleno do Supremo Tribunal Federal, no sentido de indeferir a medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade ("ADIN") ajuizada pelo partido Rede Sustentabilidade, mantendo inalteradas as medidas trabalhistas previstas na Medida Provisória 936, cujas regras são agora renovadas na Medida Provisória objeto do presente estudo.

Como sabemos, na referida decisão, a maioria dos Ministros (7) entendeu que, em razão do momento excepcional, as alterações previstas naquela MP podem ser previstas em acordo individual, o que é razoável, pois garante uma renda mínima ao trabalhador e preserva, em princípio, o vínculo de emprego ao fim da crise. Ademais, a exigência de atuação do sindicato, abrindo negociação coletiva ou não se manifestando no prazo legal, geraria insegurança jurídica e aumentaria o risco de desemprego, o que contraria o espírito das novas normas.

Para os ministros, ao contrário do sustentado na Ação Direta de Inconstitucionalidade, a regra não fere princípios constitucionais, pois não há conflito entre empregados e empregadores, mas uma convergência sobre a necessidade de manutenção da atividade empresarial e do emprego, sendo que diante da excepcionalidade e da limitação temporal, a regra estaria em consonância com a proteção constitucional à dignidade do trabalho e à manutenção do emprego.

Enfim, em razão da excepcionalidade daquele momento (que, aliás, permanece) e visando a preservação do vínculo de emprego, foi afastada a tese de inconstitucionalidade da referida Medida Provisória por ofensa aos art. 7º, VI e XIII e 8º, VI, todos da CF, que, de forma expressa, exigem a presença do sindicato para a redução dos salários e/ou jornada de trabalho.

Por outro lado, mas não menos importante, não podemos esquecer do que consta no Título IV(DO CONTRATO INDIVIDUAL DO TRABALHO), em seu Capítulo VIII, que trata da Força Maior3.

Observe-se que o referido capítulo permite, em caso de força maior, a redução geral dos salários dos empregados da empresa, situação esta que vai ao encontro da posição defendida no presente trabalho.

Diante de toda esta situação, sempre lembrando que a Medida Provisória foi reeditada, única e exclusivamente com o objetivo da manutenção de emprego e renda diante da pandemia mundial que permanecemos atravessando, fazendo uma interpretação teleológica/sociológica e também sistemática do dispositivo legal em questão, não me parece lógico impedir que todos os trabalhadores que estão incluídos na exceção do artigo 62 da CLT fiquem à margem da referida medida.

Por esta razão é que entendo que estes trabalhadores podem sim, por acordo, na forma regulada pela Medida Provisória 1045, ter reduzido o seu salário, reduzindo em contrapartida o seu trabalho.

É oportuno que se diga que no ano passado, em 24/4/20, o Ministério da Economia/Secretaria Especial de Previdência e Trabalho publicou a Portaria 10.486, que veio corroborar, integralmente, a hipótese aqui novamente sustentada.

Com efeito, a Portaria em referência, que dispunha sobre os critérios e procedimentos relativos ao recebimento de informações, concessão e pagamento do Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda previsto na MP 936/20, em seu artigo 4º, § 3º, I4, expressamente refere que o benefício emergencial (Bem) não será devido quando mantido o mesmo nível de exigência de produtividade/desempenho do período anterior, para aqueles empregados não sujeitos ao controle de jornada.

Enfim, se alguma incerteza existia em relação a tal possibilidade, naquela oportunidade, a Portaria 10.486/2020 encerrou qualquer discussão neste sentido. 

Creio que, novamente, será editada uma nova Portaria (agora regulando a MP 1045), com a mesma diretriz. Entretanto, mesmo que isto não ocorra, mantenho a posição aqui defendida, pelos argumentos antes expostos.

E como fazer isto?

Reduzindo as tarefas/obrigações diárias destes trabalhadores. Se entre suas atribuições, por exemplo, têm uma média diária de visitas em seu trabalho normal - e caso estas visitas permaneçam ocorrendo -, basta diminuir a média de visitas diárias.

Se, eventualmente não podem mais fazer visitas, pois seus clientes estão fechados, com muito mais razão, a redução do trabalho, é inquestionável. Ou seja, como não têm jornada de trabalho para ser reduzida, adota-se uma redução das atividades diárias para os referidos trabalhadores.

Em conclusão, embora o artigo 7º da MP 1045/21, pela literalidade, não contemple a hipótese de redução de salário àqueles trabalhadores que não têm jornada de trabalho (artigo 62 da CLT), não é razoável - e até mesmo moral - retirar deste grande número de trabalhadores a possibilidade de se manter no emprego e, através de acordo, reduzir seu salário com a proporcional redução de seu trabalho/tarefas diárias, sempre lembrando que toda a lei visa, em última análise, o bem comum, não se podendo, ainda, admitir o tratamento discriminatório.

______________________

1 Art. 7º O empregador, durante o prazo previsto no art. 2º, poderá acordar a redução proporcional de jornada de trabalho e de salário de seus empregados, de forma setorial, departamental, parcial ou na totalidade dos postos de trabalho, por até cento e vinte dias, observados os seguintes requisitos:

3 Art. 501 - Entende-se como força maior todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente.

§ 1º - A imprevidência do empregador exclui a razão de força maior.

§ 2º - À ocorrência do motivo de força maior que não afetar substâncialmente, nem for suscetível de afetar, em tais condições, a situação econômica e financeira da empresa não se aplicam as restrições desta Lei referentes ao disposto neste Capítulo.

Art. 502 - Ocorrendo motivo de força maior que determine a extinção da empresa, ou de um dos estabelecimentos em que trabalhe o empregado, é assegurada a este, quando despedido, uma indenização na forma seguinte:

I - sendo estável, nos termos dos arts. 477 e 478;

II - não tendo direito à estabilidade, metade da que seria devida em caso de rescisão sem justa causa;

III - havendo contrato por prazo determinado, aquela a que se refere o art. 479 desta Lei, reduzida igualmente à metade.

Art. 503 - É lícita, em caso de força maior ou prejuízos devidamente comprovados, a redução geral dos salários dos empregados da empresa, proporcionalmente aos salários de cada um, não podendo, entretanto, ser superior a 25% (vinte e cinco por cento), respeitado, em qualquer caso, o salário mínimo da região.

4 "Art. 4º O BEm não será devido ao empregado com redução proporcional de jornada e de salário ou suspensão do contrato de trabalho que:

(...)

§ 3º O BEm não será devido caso verificada a manutenção do mesmo nível de exigência de produtividade ou de efetivo desempenho do trabalho existente durante a prestação de serviço em período anterior à redução proporcional de jornada de trabalho e de salário para os seguintes trabalhadores:

I - os empregados não sujeitos a controle de jornada; e

(...).

Claudio Araujo Santos dos Santos

Claudio Araujo Santos dos Santos

Advogado do escritório Cerdeira Rocha Vendite e Barbosa Advogados e Consultores Legais, especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS, Curso de Preparação à Magistratura do Trabalho - FEMARGS, pesquisador do núcleo de pesquisas PUCRS/CNPQ relações de trabalho e sindicalismo.

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