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A polêmica das concessões de serviços públicos no STF

A necessidade de se fazer ou não nova licitação de concessão, caso a concessionária não possa prestar de forma adequada o serviço concedido, arrasta-se na Justiça desde 2003.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

Atualizado às 18:06

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Na reabertura dos trabalhos este ano no STF, deverá ser incluída na pauta de julgamentos a ADIn 2.946, que questiona a ausência de licitação para a transferência de contratos de concessão de serviços públicos. O julgamento foi iniciado em dezembro passado. Após a leitura do relatório pelo ministro Dias Toffoli, houve manifestação do PGR Augusto Aras, que defendeu a procedência parcial do pedido, a fim de possibilitar a transferência da concessão como medida excepcional devidamente justificada, fundada em motivos idôneos que demonstrem a incapacidade do concessionário de manter a prestação do serviço.

Após, o AGU Bruno Bianco Leal defendeu a validade da norma, argumentando que uma eventual declaração de inconstitucionalidade do artigo traria impactos catastróficos a alguns setores, como o da infraestrutura. Em seguida, houve a sustentação dos amici curiae: (i) ABDIB - Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base, pelo Dr. Gustavo Binenbojm; (ii) ABCR - Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias, pelo patrono Dr. Orlando Magalhães Maia Neto; (iii) Abiape - Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia, pelo Dr. André Silveira; e, (iv) o BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico, pelo Dr. Saulo Benigno Puttini, todos defendendo a constitucionalidade da norma.

Iniciado o julgamento, o ministro relator Dias Toffoli votou pela improcedência do pedido formulado, alterando o voto anteriormente dado no plenário virtual e entendendo pela constitucionalidade da norma. Esclareceu que o que interessaria à administração Pública seria a proposta mais vantajosa, e não a identidade do contratado. O ministro relator foi seguido pelos Ministros Gilmar Mendes (que apresentou declaração de voto antecipada) e Kassio Nunes Marques. Devido ao horário regimental, a sessão foi suspensa e atualmente se aguarda a inclusão em pauta, cuja data deverá ser  definida pelo presidente Luiz Fux, ocasião em que votarão os demais ministros.

A pendenga, que se refere à necessidade de se fazer ou não nova licitação de concessão, caso a concessionária não possa prestar de forma adequada o serviço concedido, arrasta-se na Justiça desde 2003. Muitos entendem que a transferência de contrato pode ocorrer a partir do momento em que o poder concedente a autorize. Mas esse não foi o entendimento original da PGR, que impetrou a ação. Fato é que o universo das concessões de serviços públicos no país aguarda com atenção a decisão que sairá do STF.

Ao debater o tema, Gilmar Mendes posicionou-se afirmando que a possibilidade de transferência das concessões é mecanismo relevante da administração pública. E que sua finalidade é manter a eficiência e a continuidade dos serviços ofertados. Todos sabem que muitas empresas encontram dificuldade para prestar o serviço estabelecido. E que a melhor forma de manter a devida prestação é transferindo a concessão, até porque os processos licitatórios são complexos e demandam tempo. Se a cada transferência de concessão tiver de ser feita uma nova licitação, corre-se o risco de paralisia do serviço concedido. Desde os anos 90 diversas concessões foram transferidas sem prejuízo da prestação do serviço. Uma decisão contrária à transferência embute dois problemas sérios: o primeiro refere-se à insegurança jurídica para as concessões transferidas; o segundo refere-se à supressão de uma possibilidade que é conveniente para a cidadania caso o concessionário não possa prestar um bom serviço.  Pelo aspecto legal, o art. 27 da lei 8.987/95, que dispõe sobre o regime de concessões e permissões de serviços públicos, faculta a transferência mediante anuência do poder concedente. A transferência obedece a condicionantes que visam atender os interesses dos usuários. De modo geral, não há banalização de transferência de concessões no Brasil. Se fosse esse o caso, haveria uma enxurrada de ações questionando tais transferências.

É de se esperar, portanto, que a questão seja resolvida, tendo em vista o melhor interesse dos usuários dos serviços concessionados e a segurança jurídica dos investimentos realizados, sem a declaração de inconstitucionalidade do mencionado art. 27. Por fim, vale lembrar que o STF, no julgamento da ADIn 5.942, decidiu pela constitucionalidade das operações de cessão de direitos de exploração de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos sem a prévia realização de licitação.

Murillo de Aragão

VIP Murillo de Aragão

Advogado, sócio da Advocacia Murillo de Aragão e doutor em sociologia pela UnB.

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