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Difal - Contribuintes: oportunidade para empresas recuperarem valores pagos indevidamente

Considerando os fundamentos utilizados pelo STF, os contribuintes possuem uma oportunidade para pleitear junto ao poder judiciário a restituição do Difal pago na aquisição de mercadorias para uso e consumo e destinadas ao ativo imobilizado.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

Atualizado às 07:52

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

No início de 2022, em razão da sanção tardia da lei complementar 190/22, os contribuintes depararam-se com uma gigantesca controvérsia envolvendo a (im)possibilidade de cobrança do Difal-não contribuintes já no presente ano. A nova lei também ressuscitou o debate sobre a ilegalidade da base dupla do Difal. Essas controvérsias foram tratadas pela advogada Jussandra Hickmann Andraschko em dois artigos, nos quais foram detalhadas as razões pelas quais se está diante de mais uma ilegalidade perpetrada pelos Estados.1 Por outro lado, a celeuma envolvendo o Difal pode gerar mais uma oportunidade aos contribuintes: trata-se da possibilidade de restituição dos valores pagos de forma indevida nos últimos cinco anos por contribuintes do imposto (Difal-contribuintes) em decorrência da aquisição de mercadorias destinadas ao ativo imobilizado e a uso e consumo.

Para analisar essa oportunidade, é importante compreender o que foi julgado no tema 1.093 de repercussão geral. Naquela oportunidade, o STF foi instado a manifestar-se sobre a legalidade de diversas cláusulas do convênio ICMS 93/15 do CONFAZ, o qual foi editado apenas para regulamentar as inovações trazidas pela EC 87/15 e possibilitar que os Estados iniciassem a cobrança do Difal-não contribuintes.

Diante desse cenário, pode-se concluir, sem maiores esforços, que a matéria julgada pelo STF não dizia respeito à (im)possibilidade de cobrança do Difal - contribuintes. Apesar de não ter analisado o arcabouço legal envolvendo a instituição do Difal-contribuintes pelos Estados, o posicionamento do STF adotado no julgamento do tema 1.093 de repercussão geral deve ser levado em consideração para analisar a possibilidade de cobrança do referido Difal. As razões de decidir do STF possuem clareza meridiana e, em respeito à segurança jurídica e ao sistema de precedentes introduzidos pelo CPC/15, não restam dúvidas que o caminho percorrido pelo STF deve ser replicado em casos cujo objeto em discussão é semelhante.

Dito isto, importante resgatar algumas premissas fixadas pelo STF quando da declaração de inconstitucionalidade de determinadas cláusulas do convênio ICMS 93/15 do CONFAZ. Analisando o voto do ministro Dias Toffoli, constata-se que a Suprema Corte chegou à conclusão de que o Difal não é mera repartição de um mesmo tributo, na medida em que se trata de um imposto com fato gerador, base de cálculo e contribuinte próprios. Essa constatação é decorrência lógica do entendimento firmado pelo STF, na medida que se julgou necessária a edição de lei complementar para disciplinar a cobrança do Difal-não contribuintes, o que não seria preciso se o Difal fosse encarado como mera repartição de receitas.

Outro ponto relevante do voto do ministro Dias Toffoli refere-se à análise se lei complementar 87/96 (Lei Kandir) possui normas suficientes para autorizar os estados e o DF a efetivar a cobrança do Difal. A conclusão adotada pelo ministro foi a seguinte:

Note-se que não se infere dessa lei complementar, por exemplo, (i) quem é o contribuinte dessa exação, isto é, se é o remetente ou o destinatário; (ii) se há ou não substituição tributária na hipótese; (iii) quem deve ser considerado o destinatário final, se, v.g., o destinatário físico ou se o destinatário jurídico dos bens; (iv) quando ocorre o fato gerador da nova obrigação, se, por exemplo, na saída da mercadoria do estabelecimento, na entrada dela no estado de destino ou, ainda, em sua entrada no estabelecimento ou no domicílio do consumidor final; (v) onde ocorre o fato gerador, para efeito de cobrança da exação.

Fixadas tais premissas, parte-se para análise do complexo de normas envolvendo o Difal-contribuintes, o qual já havia sido previsto no art. 155, §2º, VII e VIII, da redação originária da CF/88.2 Inicialmente, o referido imposto era regulamentado pelo convênio ICMS 66/88, considerando a previsão constante no § 8º do art. 34, do ADCT, a qual concedia poderes aos Estados para regulamentação, mediante convênio, do ICMS até a promulgação da lei complementar da qual tratava o art. 146, III, da CF/88.

No convênio ICMS 66/88 constavam, de forma expressa, todos elementos necessários para a cobrança do Difal-contribuintes. Posteriormente, foi promulgada a LC Federal 87/96 - Lei Kandir, a qual foi responsável por dispor sobre o regramento nacional do ICMS, fato que acarretou na perda de efeitos do convênio ICMS 66/88.

Ocorre que, na Lei Kandir, não havia qualquer previsão sobre o fato gerador, a base de cálculo e quem seriam os contribuintes do Difal. A ausência de previsão legal sobre esses aspectos restou ainda mais evidente quando houve a promulgação da LC 190/22, na medida em que essa regulamentou de forma expressa a cobrança do Difal-contribuintes.

A partir de todo o exposto, pode-se concluir que, no período posterior a perda de eficácia do convênio ICMS 66/88, a cobrança do Difal-contribuintes foi feita sem aparo legal. Assim sendo, considerando os fundamentos utilizados pelo STF no julgado do tema 1.093 de repercussão geral os contribuintes possuem uma oportunidade para pleitear junto ao poder judiciário a restituição do Difal pago na aquisição de mercadorias para uso e consumo e destinadas ao ativo imobilizado, neste último é necessário levar em consideração o percentual do imposto eventualmente creditado.

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A incostitucional base de calculo dupla para apuração do Difal. Disponpivel aqui. Atraso na sanção presidencial da lei complementar 190/22 adia Difal para 2023. Disponível aqui.

2 Redação original: art. 155, §2º, VII e VIII: "art. 155: Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre; § 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: VII - em relação às operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á: a) a alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do imposto; b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele; VIII - na hipótese da alínea "a" do inciso anterior, caberá ao Estado da localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual".

Wagner Schneider Cemin

Wagner Schneider Cemin

Graduado em Direito pela Unisinos - Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Advogado do escritório Hickmann Advogados Associados.

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