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Da alienação de bens que a massa falida possui em copropriedade

A lei 14.112/20 afastou o conceito de preço vil para a alienação de bens na falência, no 3º leilão. Mas já é possível identificar a possibilidade de relativização desta regra.

quinta-feira, 4 de agosto de 2022

Atualizado às 08:27

Introdução

Com a nova sistemática imposta pela lei 14.112/20, a alienação dos bens arrecadados na falência prevista na lei 11.101/05, mediante leilão, seja eletrônico, presencial ou híbrido, dar-se-á, nos termos do art. 142, em primeira chamada, no mínimo pelo valor de avaliação do bem; em segunda chamada, por no mínimo 50% (cinquenta por cento) do valor de avaliação; e em terceira chamada, por qualquer preço.

Observa-se que não há mais a aplicação do conceito de preço vil. Desta forma, o legislador privilegiou a celeridade em sobreposição à maximização do valor dos ativos.

Contudo, em alguns casos, a regra da venda por qualquer preço, em terceira chamada, pode ser relativizada, tal como quando o bem indivisível é de propriedade da Massa Falida e de um terceiro.

Da limitação pelo judiciário do preço de venda de bens em terceira chamada

A atual redação do art. 142 da lei 11.101/05 prevê, no inciso III do § 3º-A, que a alienação por leilão eletrônico, presencial ou híbrido dar-se-á em terceira chamada, por qualquer preço. Ainda, fora acrescentado no inciso V do § 2º-A o afastamento da aplicação do conceito de preço vil.

A novidade trazida pela lei 14.112/20 vai de encontro aos novos objetivos da falência, previstos no art. 75 da lei 11.101/05, que destaca que o processo visa preservar e otimizar a utilização produtiva dos bens, dos ativos e dos recursos produtivos, inclusive os intangíveis, da empresa, bem como permitir a liquidação célere das empresas inviáveis, com vistas à realocação eficiente de recursos na economia. Além disso, deve-se ter em mente que muitas vezes o dispêndio de dinheiro para guarda e conservação dos bens justifica a venda destes em um prazo curto, ainda que por um preço menor.

Como muito bem ressaltado por SACRAMONE, Marcelo Barbosa:

"Diante das peculiaridades do procedimento falimentar e de recuperação, medidas céleres para a liquidação dos ativos podem ser exigidas em razão da conservação dispendiosa dos bens, risco de perecimento ou deterioração das coisas, em razão de os ativos não serem relevantes para o desenvolvimento da atividade e necessitem ser liquidados para reverter o produto para a manutenção da atividade principal com urgência, ou pela inexistência de interessados, notadamente diante do estigma ainda existente em face de bens de Massa Falida e que tem afugentado os interessados das aquisições." (SACRAMONE, Marcelo Barbosa. Comentários à Lei de recuperação de empresas e falência - 2 ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 577)

Contudo, observa-se que a venda a qualquer preço, em alguns casos, poderia levar a violações a direitos de terceiros, que possuem copropriedade do bem indivisível a ser alienado. Cabe frisar que o art. 843 do CPC admite a alienação integral do bem indivisível em qualquer hipótese de propriedade em comum, resguardando-se, ao coproprietário ou cônjuge alheio à execução, o equivalente em dinheiro da sua quota-parte, calculado sobre o valor da avaliação.

Por outro lado, em tais situações também se revela a necessidade de preservar a Massa Falida de ter de arcar com os custos de localização e venda do bem para, ao final, ter que entregar todo o produto da alienação para os terceiros, sem garantia mínima de valor para ser destinada para pagamento dos credores.

Em tal contexto, surge a possibilidade de relativização da regra que permite a alienação dos bens na falência a qualquer preço, para que o valor da venda seja suficiente para o pagamento do terceiro coproprietário, e seja garantido o mínimo de recursos para a massa.

Desta forma, destaca-se o precedente dos autos 5773065-75.2009.8.13.0024 - em trâmite perante a 2ª Vara Empresarial da Comarca de Belo Horizonte/MG - no qual houve a fixação do preço mínimo da venda do bem da Massa Falida em terceira chamada do leilão.

No referido caso, em que o bem a ser alienado era de propriedade da Massa Falida e de mais duas empresas, o D. Magistrado, buscando garantir que o valor da arrematação alcance o valor da compensação financeira devida às coproprietárias e a eficácia da arrematação em face da Massa Falida, que teve dispêndio na busca e venda do bem, determinou que o lance mínimo em 3ª chamada seja correspondente a 20% a mais do que o valor da avaliação das partes do imóvel pertencentes a coproprietárias.

O leilão designado neste caso ainda não foi finalizado.

Conclusão

Consoante demonstrado, em que pese a nova regra do inciso III, do § 3º-A, do art. 142 da LRF, introduzida pela lei 14.112/20, em alguns casos ela pode ser relativizada, para garantir o direito de terceiros coproprietários de bem indivisível arrecadado na falência, além de evitar que a Massa arque com todas as despesas da busca do bem e realização do leilão, e tenha que destinar todo o produto da venda para terceiros.

Rogeston Inocêncio de Paula

Rogeston Inocêncio de Paula

Sócio fundador do escritório Inocêncio de Paula Sociedade de Advogados e Administrador Judicial em diversos processos de Recuperação Judicial, Recuperação Extrajudicial e Falência.

Raquel Santos Batista Guimarães

Raquel Santos Batista Guimarães

Advogada do escritório Inocêncio de Paula Sociedade de Advogados e especialista em Recuperação Judicial e Falência, com ênfase em Administração Judicial.

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