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A lei geral do licenciamento ambiental: Uma realidade

O PL 2.159/21 cria a lei geral do licenciamento ambiental, visando uniformizar, agilizar e desburocratizar o processo, mas gera debates sobre impactos e eficácia.

terça-feira, 5 de agosto de 2025

Atualizado em 4 de agosto de 2025 10:35

I. Introdução

Com a recente aprovação pelo Congresso Nacional do PL 2.159/21, em 17 de julho de 2025, o Brasil está em vias de ter, finalmente, uma LGLA - Lei Geral do Licenciamento Ambiental: uma norma federal de caráter geral, aplicável a todos os entes da federação, cuja expectativa é tornar o licenciamento ambiental mais uniforme, célere e menos burocrático. No entanto, o texto da norma, conforme aprovado, tem gerado ampla discussão em diversos setores da sociedade brasileira.

Vale lembrar que essa matéria tramitou por mais de 21 anos no Congresso Nacional, tendo sido objeto de projetos de lei que tiveram diferentes redações. Essa longa tramitação se justifica, em parte, pela relevância e sensibilidade do tema, bem como pelos distintos interesses envolvidos.

Há, agora, grande expectativa em torno da sanção presidencial, cujo prazo se encerra em 08 de agosto de 2025, e dos possíveis vetos ao texto aprovado. De um lado, a Frente Parlamentar Mista Ambientalista encaminhou ao Presidente um pedido de veto a 18 dispositivos da lei, considerados mais críticos. De outro, 90 associações do setor produtivo defendem a sanção integral da norma.

Apesar das críticas ao texto aprovado, é inegável a importância da LGLA, seja pela necessidade de estabelecer regras uniformes, que reduzam as discrepâncias nos processos de licenciamento ambiental conduzidos pelos diferentes entes federativos, cujas estruturas e realidades são bastante distintas; seja pela busca por maior previsibilidade e segurança jurídica nesses processos.

Como já tivemos a oportunidade de observar, muito se crítica a respeito do licenciamento: exigências burocráticas excessivas, decisões pouco fundamentadas, insensatez desenvolvimentista de empreendedores, contaminação ideológica do processo e, ainda, a "anomia", ou seja, a ausência de lei sobre a matéria que "teria transformado o processo em um reino da discricionariedade administrativa"1.

Bem por isso, e muito embora ainda não seja possível afirmar se o texto aprovado, de fato, alcançará os objetivos propostos pela norma, especialmente o de reduzir a burocracia que acomete os processos de licenciamento ambiental em todo o país, ou se implicará em retrocessos na proteção ambiental ou na atuação dos órgãos ambientais federais, como alguns têm manifestado, não se tem dúvidas de que com a aprovação do PL em questão evoluímos no debate da regulação da matéria.

Assim, a partir do texto aprovado, é possível fazer algumas importantes reflexões, identificando pontos que realmente poderão interferir de forma positiva nos processos de licenciamento; e outros mais controversos, que poderão ser objeto de veto e/ou judicialização.

II. Aspectos positivos e controversos do texto aprovado

O licenciamento ambiental, como se sabe, é instrumento instituído pela Política Nacional do Meio Ambiente (lei 6.938/1981), por meio do qual o Poder Público disciplina a implementação de atividades e empreendimentos que possam causar alterações no meio ambiente, estabelecendo as medidas necessárias ao equacionamento dos impactos.

O texto aprovado traz uma nova conformação ao licenciamento ambiental, ao consolidar importantes regras que, até então, eram tratadas de forma esparsa e pouco sistematizada em normas estaduais e municipais, resoluções do CONAMA, instruções normativas ou portarias de órgãos ambientais, muitas vezes com abordagens distintas.

A positivação de regras gerais que definam prazos e procedimentos uniformes, aliás, é uma das finalidades dessa norma, porque confere maior previsibilidade ao processo, seja ele conduzido por um pequeno município, seja pelo IBAMA.

A tabela abaixo destaca alguns desses pontos positivos da nova lei:

 

 

Ampla participação pública nos processos de licenciamento

Art. 3º, incisos V a VII

Art. 39 a 41

O texto aprovado define diferentes formas de participação pública nos processos de licenciamento, a saber: "audiência pública", "consulta pública", "reunião participativa" e, ainda, a "tomada de subsídios técnicos". Com isso, busca-se assegurar a ampla participação social, conforme previsto no art. 1º.

A audiência pública é obrigatória para empreendimentos/atividades sujeitos a EIA. Já a consulta pública pode ser utilizada em qualquer modalidade de licenciamento, como forma de colher informações, esclarecer dúvidas e debater impactos com os interessados.

 

 

 

Diferentes modalidades de licenças e procedimentos simplificados de emissão

Art. 5º

Art. 18

O texto aprovado altera significativamente o modelo tradicional trifásico (LP, LI e LO), previsto no art. 19 do Decreto 99.274/1990, que regulamentou a Política Nacional do Meio Ambiente. Agora, são previstas sete modalidades de licenças, com maior flexibilização das etapas do licenciamento, conforme a tipologia do empreendimento. O processo poderá ser ordinário (trifásico) ou simplificado (monofásico ou bifásico), conforme previsto no art. 18.

 

 

Uniformização dos prazos das licenças

Art. 6º

O texto aprovado redefine os prazos de validade das licenças, em relação à Resolução CONAMA 237/1997:

i.                     LP: de 3 a 6 anos;

ii.                   LI e LP/LI aglutinadas: de 3 a 6 anos;

iii.                  LAU, LO, LI/LO aglutinadas, LOC e LAE: de 5 a 10 anos;

iv.                  LAC: de 5 a 10 anos.

 

 

Proporcionalidade entre impactos e condicionantes

Art. 14, §1º

As condicionantes definidas nas licenças devem guardar relação direta com os impactos do empreendimento/atividade.

Com essa disposição o legislador objetiva coibir exigências desproporcionais, como obrigações para mitigar impactos causados por terceiros ou fora da esfera de ingerência do empreendedor, em consonância com o que já estabelece o art. 3º, XI, da Lei da Liberdade Econômica (Lei 13.874/2019).

 

 

Suspensão/cancelamento de licenças e modificação de condicionantes

Art. 16

A lei detalha as hipóteses de suspensão ou cancelamento de licenças, bem como de modificação de condicionantes e medidas de controle (§1º), aprimorando as disposições nesses sentido, estabelecidas na Resolução CONAMA 237/1997.

Com isso, o legislador confere maior previsibilidade e balizamento à atuação dos órgãos ambientais, assim como há um limitador à atuação discricionária dos órgãos ambientais.

 

 

Recursos no processo de licenciamento

Art. 14, §6º

Art. 16, §3º

 

O art. 14, §6º, prevê a interposição de recurso, no prazo de 30 dias, quando da emissão de licença, a fim de que o órgão revise condicionantes estabelecidas, cuja eficácia poderá ficar suspensa, até decisão final a seu respeito.

No art. 16º, §3º, por sua vez, a norma estabelece a hipótese de interposição de recurso, também em 30 dias, da decisão que analisa pedido de alteração de condicionante de licença em vigor.

Contudo, constatamos que o texto aprovado deixou de prever recurso em caso de indeferimento de pedido de licença ambiental, o que levanta dúvidas: nessas situações, deverá o interessado, por analogia, utilizar o prazo consignado nos dispositivos mencionados ou os prazos recursais previstos nas normas regem os processos administrativos de maneira geral, inclusive por força do art. 55 da futura lei?

 

 

 

Certidão de Uso e Ocupação do Solo

Art. 17

Conforme já previsto na Lei da Liberdade Econômica, o legislador reforçou que a certidão de uso e ocupação do solo, emitida pelos municípios, não é documento indispensável ao licenciamento ambiental, salvo se houver lei que assim o exija. O mesmo se aplica a outros atos de órgãos não integrantes do SISNAMA.

Referida disposição objetiva encerrar discussões comuns sobre o tema, de modo a blindar o licenciamento de interferências indevidas e imposição de obrigações dissociadas do processo.

 

 

Procedimentos e exigência de estudos

Art. 18

A norma determina que a modalidade de licenciamento e o estudo exigido devem ser compatíveis com as características e o potencial impacto da atividade/empreendimento.

Com essa regra o legislador pretende afastar exigências indiscriminadas e até indevidas do EIA, de modo que essa modalidade de avaliação de impactos ambientais somente poderá ser exigida em casos de significativa degradação ambiental, conforme a Constituição Federal e a PNMA.

 

 

Prazos do processo de licenciamento

Arts. 47 e 48

A norma também se incumbiu de definir os prazos para análise pelos órgãos licenciadores e de manifestação dos interessados, novamente com o objetivo de tornar o processo mais previsível e conferir-lhe maior segurança jurídica.

A inobservância dos prazos, no entanto, não configura licenciamento tácito, mas possibilita ao interessado buscar, perante o Poder Judiciário, o atendimento da lei e conclusão da análise de seu pedido de licenciamento.

 

 

 

 

 

 

Participação de autoridades envolvidas e entes federativos

Arts. 42 a 46 e 50

A participação de outros órgãos no processo de licenciamento é tema que geralmente enseja controvérsia em processos de licenciamento.

Segundo o texto aprovado, adotou-se o termo autoridades envolvidas (em lugar de órgãos intervenientes).

A lei reforça a regra já positivada na LC 140/2011, de que não é vinculante a manifestação das autoridades envolvidas ou demais entes federativos, e que não impede o prosseguimento do processo. Garante-se, contudo, sua participação em qualquer etapa do licenciamento, quando justificada sua participação.

 

Por outro lado, a nova norma tem sido objeto de críticas, devido a disposições controversas, algumas delas, inclusive, eivadas de inconstitucionalidade.

A tabela abaixo apresenta alguns comentários a esses pontos:

 

 

 

 

 

 

Atividades minerárias sujeitas às disposições da LGLA

 

Segundo o texto aprovado, a LGLA será aplicável às atividades minerárias de grande porte ou alto risco, como a exploração de petróleo na margem equatorial.

Conforme emenda incluída pelo Senado Federal, quando da aprovação do projeto por tal casa legislativa, em maio/2025, as referidas atividades não estariam sujeitas a essa norma, de modo que seriam reguladas por disposições do CONAMA, até que fosse promulgada lei específica sobre a matéria. No entanto, essa emenda não foi acolhida pela Câmara dos Deputados na votação de julho de 2025, de modo que a LGLA se aplicará a essas atividades.

Inclusive, essa modalidade de empreendimento poderá ser licenciada por meio de Licença Ambiental Especial - LAE, mediante deliberação do Conselho de Governo, nos termos do art. 24.

 

 

 

 

Renovação automática de licenças ambientais

Art. 7º, §4º

O §4º do art. 7º do texto aprovado estabelece a possibilidade de renovação automática de licenças ambientais, sem a necessidade de nova análise do cumprimento de condicionantes, desde que não tenham sido alterados as características e o porte da atividade, a legislação aplicável e que tenham sido cumpridas as condicionantes.

Embora essa disposição busque conferir maior agilidade e reduzir a burocracia na renovação de licenças ambientais, ela pode comprometer uma etapa relevante do processo: a revisão das condicionantes ambientais.

O desenvolvimento das atividades exige fiscalização contínua e ajustes às novas realidades locais, que nem sempre se refletem em mudanças formais na legislação ou nas características do empreendimento. Assim, há o risco de que licenças sejam renovadas automaticamente, sem a devida reavaliação de obrigações que poderiam necessitar de atualização.

 

 

 

 

 

Atividades e empreendimentos isentos de licenciamento ambiental

Arts. 8º e 9º

A isenção do licenciamento em normas estaduais e municipais é tema sempre polêmico, que comumente gera judicialização.

No caso do texto aprovado, no art. 8º foram listadas algumas atividades/empreendimentos, cujo rol nos parece taxativo, que estariam dispensadas do licenciamento ambiental.

Entretanto, é preciso lembrar que o artigo 225, §1º, IV, da Constituição Federal exige o estudo prévio de impacto ambiental (e, por óbvio, o respectivo licenciamento ambiental) "para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente" (destacamos). Por isso, seria inconstitucional dispensar, por lei ordinária, do licenciamento atividades/empreendimentos que assim se enquadrem.

Ainda que justificadas por razões estratégicas, como no caso de obras militares, se essas forem potencialmente causadoras de significativa degradação, não poderiam ficar isentas do licenciamento. O mesmo raciocínio se aplica a intervenções emergenciais em casos de calamidade pública ou de emergência, que também devem ser analisadas com cautela, mesmo diante do interesse público envolvido.

 

O texto aprovado também dispensa do licenciamento as atividades agrícolas.

A justificativa para tanto é que referidas atividades já são reguladas por instrumentos previstos no Código Florestal (Lei 12.651/2012), como o Cadastro Ambiental Rural - CAR, e as autorizações de supressão vegetal, entre outras. Inclusive, o §3º do art. 9º do texto aprovado ressalva a necessidade de obtenção de outras licenças ou autorizações pertinentes. A norma também destaca que a dispensa do licenciamento não afasta a fiscalização sobre a atividade pelos órgãos competentes e, no caso de pecuária intensiva, admite-se o licenciamento ambiental simplificado, por adesão e compromisso.

Apesar disso, há críticas quanto ao risco que a dispensa de licença pode ocasionar em termos de redução na proteção ambiental e fragilização do controle sobre os impactos em áreas com exploração agrícola, especialmente em grandes propriedades rurais. Os críticos argumentam que, sem o licenciamento ambiental, a fiscalização e controle ambiental sobre os grandes produtores agrícolas ficarão comprometidos.

Ademais, cabe mencionar que, muito embora o CAR pudesse funcionar, nestes casos, como o principal instrumento de gestão e controle dos imóveis agrícolas - o que, em tese, justificaria dispensar o licenciamento -, a realidade é que sua implementação ainda é incipiente e ele não cumpre adequadamente sua função.

 

 

 

Simplificação e dispensa de EIA para empreendimentos de abastecimento de água e esgotamento sanitário

Art. 10

 

Embora as obras e estruturas de abastecimento de água e esgotamento sanitário sejam de extrema relevância para o meio ambiente e a saúde humana, as disposições que preveem a simplificação do licenciamento e que excepcionalizam o EIA, podem conflitar com a Constituição Federal, pelos mesmos fundamentos anteriormente expostos.

As hipóteses de exigência do EIA estão expressamente estabelecidas no artigo 225 da Constituição Federal, de modo que a lei ordinária não poderia estabelecer exceções ou simplificações ao licenciamento quando o texto constitucional dispõe de forma diversa.

 

 

 

 

 

 

 

 

Licença Ambiental por Adesão e Compromisso - LAC

Art. 3º, XXVII

Art. 22

Ainda que alvo de críticas, a LAC é uma realidade adotada por vários Estados e municípios, que desafoga os órgãos ambientais de promover o burocrático licenciamento trifásico tradicional para diversas atividades de baixo impacto.

Trata-se de uma modalidade de licenciamento que confere maior agilidade ao processo, mas que também impõe maior responsabilidade ao empreendedor, que deve observar critérios técnicos rigorosos, permanecendo sujeito à fiscalização do Poder Público e à penalização na hipótese de seu uso indevido.

Como bem observa Andrea Vulcanis - idealizadora da LAC, inicialmente implementada no Brasil pelo Estado da Bahia -, "diferente de uma licença meramente declaratória, a LAC não é uma simples declaração. O empreendedor submete-se formalmente às medidas de controle descritas, com responsabilidade direta sobre falhas em sua implementação que são conhecidas desde início e ordenadas pelo órgão ambiental licenciador"2.

No entanto, no que se refere ao texto do projeto aprovado, a principal crítica à LAC recai sobre sua aplicação a empreendimentos de médio porte, que podem gerar impactos relevantes e, por isso, deveriam ser submetidos a uma avaliação técnica mais detalhada, com imposição de condicionantes específicas.

De qualquer forma, a experiência prática tem demonstrado que os licenciamentos ambientais simplificados, na modalidade por adesão e compromisso, aplicados para empreendimentos de baixo impacto ambiental, configuram um importante instrumento de gestão aos órgãos ambientais. No Estado de São Paulo, por exemplo, esse tipo de licenciamento, por meio do sistema Via Rápida Ambiental, adotado pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo - CETESB, tem sido extremamente positivo, porque permite manter atividades/empreendimento devidamente regulares e sujeitos à fiscalização do órgão ambiental.

 

 

 

 

 

 

 

 

Licença Ambiental Especial - LAE

Art. 3º, XXVI

Art. 24

A denominada Licença Ambiental Especial - LAE também tem sido alvo de intensas críticas.

Essa modalidade de licença foi incluída no texto do projeto de lei por emenda do Senador Davi Alcolumbre, durante sua tramitação no Senado Federal, a qual foi acatada pela Câmara dos Deputados.

Segundo o texto aprovado, a tramitação do pedido de LAE deve ser prioritário, por meio de um licenciamento monofásico, objetivando um procedimento absolutamente célere, com prazo máximo de 1 ano, para viabilizar empreendimentos considerados estratégicos ao Governo.

A definição sobre quais projetos serão considerados estratégicos caberá ao Conselho de Governo - órgão de assessoramento da Presidência da República -, a cada dois anos.

Assim, a principal preocupação em relação à LAE é o forte viés político que pode influenciar seu processo de emissão. Além disso, dada a celeridade estabelecida por lei, teme-se que não sejam realizados os estudos e análises técnicas adequadas, o que pode comprometer a proteção ambiental e o controle por parte dos órgãos competentes.

 

 

 

 

Revogação dos §§ 1º e 2º do art. 14 da Lei da Mata Atlântica

Art. 66, III

 

O artigo 66 da nova lei revoga os §§1º e 2º do artigo 14 da Lei da Mata Atlântica (Lei 11.428/2006), que exigem autorização dos órgãos ambientais estadual e municipal para a supressão de vegetação primária e secundária em estágio avançado de regeneração, mesmo nos casos de utilidade pública e interesse social.

Os críticos da nova norma argumentam que com essa revogação, ainda que se trate de empreendimento de utilidade pública - cuja consecução é prioritária e benéfica à coletividade -, haverá um enfraquecimento da proteção do bioma Mata Atlântica, cuja preservação é assegurada constitucionalmente. A nós, no entanto, parece que a autorização de supressão vegetal continua a ser exigida por força da Lei Complementar 140, arts. 7°, XIV e XV, art. 8°, XV e XVI, art. 9, XIV e XV. Portanto, revogada apenas a necessidade de anuências de entes não licenciadores.

III. Conclusão

Apesar de todas as críticas ao texto aprovado da LGLA, é inegável a importância de o Brasil contar com uma norma geral sobre licenciamento ambiental, com relevantes regras uniformes sobre essa matéria.

Obviamente que a lei em si não será suficiente para resolver todos os conflitos que pairam sobre o licenciamento ambiental. Como bem destaca Eduardo Fortunato Bim, "O licenciamento ambiental é instrumento pelo qual se realiza uma ponderação dos valores em jogo. Ao balançar valores complexos e conflitantes ele tem como papel harmonizar interesses em conflito para proceder ao juízo de viabilidade ambiental. Essa harmonização traduz-se em juízo discricionário do órgão licenciador e consiste basicamente no quanto se admite em termos de impactos ambientais e em quais condições."3. Bem por isso, o licenciamento ambiental jamais estará imune a discussões, inclusive perante os tribunais.

De qualquer modo, o texto aprovado, nos termos do §2º do art. 1º, define importantes diretrizes que devem nortear o uso desse instrumento, ao consignar que "o licenciamento ambiental deve prezar pela participação pública, pela transparência, pela preponderância do interesse público, pela celeridade e economia processual, pela prevenção do dano ambiental, pelo desenvolvimento sustentável, pela análise dos impactos e, quando couber, dos riscos ambientais". Assim, mesmo diante de alegações de ilegalidade, inconstitucionalidade e da possibilidade de vetos, a aplicação da nova lei deverá estar alinhada a essas diretrizes fundamentais, a serem observadas tanto por empreendedores como pelos órgãos ambientais e demais envolvidos.

Assim, guardadas as críticas pertinentes e a possibilidade de vetos justificáveis, o texto aprovado da LGLA parece ter maior capacidade de aprimorar o licenciamento ambiental do que resultar em eventuais retrocessos.

E, de todo modo, caso sancionado, integral ou parcialmente, será necessário promover uma mudança profunda na forma como o licenciamento ambiental é compreendido e aplicado, de modo a instrumentalizar e concretizar os princípios que a norma preconiza, com vistas a construir um processo realmente eficaz, eficiente e efetivo na gestão de impactos ambientais, capaz de superar a burocracia e garantir a segurança jurídica que dele se espera.

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1 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 12ª ed., São Paulo: Thomson Reuters/RT, 2020. p. 998.

2 VULCANIS, Andrea. "Licença ambiental por adesão e compromisso na visão de quem idealizou o modelo" in Consultor Jurídico - CONJUR: https://www.conjur.com.br/2025-jul-19/licenca-ambiental-por-adesao-e-compromisso-na-visao-de-quem-idealizou-o-modelo/ acessado em 22.07.2025

3 BIM, Eduardo Fortunato. Licenciamento Ambiental. 5ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2020, p. 29.

Édis Milaré

Édis Milaré

Advogado fundador de Milaré Advogados. Professor e consultor em Direito Ambiental; Doutor e Mestre em Direitos Difusos e Coletivos pela PUC/SP; Criador e 1° Coordenador das Promotorias de Justiça do Meio Ambiente do Estado de São Paulo; Secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo (1992/1994).

Maria Clara Rodrigues Alves Gomes

Maria Clara Rodrigues Alves Gomes

Pós-graduada em Direito Processual Civil e graduada em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. É especializada em Meio Ambiente e Sociedade pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo. É advogada do Milaré Advogados desde 2004.

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