STF fixa tese sobre inclusão de empresas do mesmo grupo econômico na execução trabalhista
A inclusão só é válida se houver indicação prévia do responsável e garantia de contraditório e ampla defesa, respeitando princípios do devido processo legal.
terça-feira, 14 de outubro de 2025
Atualizado em 13 de outubro de 2025 12:10
O STF concluiu na sexta-feira, 10 de outubro de 2025, o julgamento do RE 1.387.795, de relatoria do ministro Dias Toffoli, submetido ao rito da repercussão geral (Tema 1.232).
A controvérsia decidida pelo STF diz respeito à possibilidade de inclusão, no polo passivo da execução trabalhista, de empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico que não participaram da fase de conhecimento, bem como à necessidade de observância dos requisitos processuais e materiais aplicáveis, à luz dos princípios constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa. O julgamento, iniciado em sessão virtual no dia 3 de outubro de 2025, possui relevante impacto prático, especialmente em execuções trabalhistas envolvendo grupos empresariais complexos e diante das alterações introduzidas pela reforma trabalhista.
O julgamento, em repercussão geral, buscou uniformizar a interpretação acerca da possibilidade de redirecionamento da execução nesses casos e definir os requisitos processuais e materiais que devem ser observados.
No voto do relator, ministro Dias Toffoli, foi enfatizado que a inclusão, na fase de execução, de pessoa jurídica do mesmo grupo econômico que não participou do processo de conhecimento demanda a instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica, com contraditório e ampla defesa. Ressaltou que o rito dos arts. 133 a 137 do CPC é aplicável ao processo do trabalho, inclusive antes da introdução do art. 855-A da CLT, como procedimento padronizado de garantia processual.
O min. relator também destacou a necessidade de equilibrar celeridade e segurança jurídica no processo do trabalho e indicou que a desconsideração para alcançar o grupo econômico deve observar os pressupostos do art. 50 do CC, evitando uso indiscriminado do instituto. No caso concreto, propôs o conhecimento e o provimento do recurso extraordinário, declarando a nulidade dos atos executivos praticados contra a recorrente e sua exclusão do polo passivo da execução.
O ministro Cristiano Zanin acompanhou o relator quanto ao resultado do julgamento, votando pelo provimento do recurso extraordinário para declarar a nulidade dos atos executórios contra a recorrente. Contudo, apresentou sugestão de redação alternativa para a tese de repercussão geral, reforçando que o cumprimento da sentença trabalhista não pode ser direcionado contra empresa que não tenha participado da fase de conhecimento. Segundo o voto, o reclamante deve indicar, já na petição inicial, os corresponsáveis solidários, inclusive integrantes de eventual grupo econômico, demonstrando concretamente os requisitos legais. Zanin destacou ainda que o redirecionamento da execução somente é admitido, de forma excepcional, nas hipóteses de sucessão empresarial ou abuso de personalidade jurídica, devendo ser observado o procedimento específico previsto na CLT e no CPC. Ressalvou, ademais, a aplicação da tese mesmo aos redirecionamentos anteriores à reforma trabalhista, com exceção dos casos já transitados em julgado, dos créditos satisfeitos e das execuções definitivamente arquivadas.
O ministro Nunes Marques acompanhou o relator quanto ao provimento do recurso extraordinário, votando pela exclusão da recorrente do polo passivo da execução e pela nulidade dos atos constritivos praticados. Em seu voto, destacou a importância da observância dos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, ressaltando que a inclusão de empresa integrante de grupo econômico na fase de execução somente é possível mediante a instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica, com a concessão de oportunidade prévia de defesa. Reforçou que a interpretação do art. 2º, §§ 2º e 3º, da CLT é compatível com o art. 513, §5º, do CPC e que a utilização indiscriminada da desconsideração pode comprometer a segurança jurídica. No caso concreto, entendeu que a constrição judicial de bens da recorrente, sem prévia instauração do incidente, violou garantias constitucionais, razão pela qual declarou a nulidade dos atos executivos.
O ministro André Mendonça manifestou concordância com a posição adotada pelos ministros Cristiano Zanin e Nunes Marques. Aderiu à posição do relator quanto à solução do caso concreto e, em relação à tese, manifestou concordância no tocante à parte substancial. Fez apenas uma sugestão de ajuste para deixar clara a limitação dos efeitos temporais da decisão, a fim de resguardar situações já definitivamente consolidadas. Nesse ponto, propôs a seguinte redação: "Aplica-se tal procedimento mesmo aos redirecionamentos operados antes da reforma trabalhista de 2017, ressalvada a indiscutibilidade relativa aos casos já transitados em julgado, aos créditos já satisfeitos e às execuções findas ou definitivamente arquivadas." ou seja, a tese se aplicaria, no entender do ministro Mendonça, a todos os processos, inclusive e principalmente execuções. Apenas não se aplicaria a execuções que tenham decisões já transitadas em julgado, arquivadas, quitadas. Não seriam cabíveis, por consequência, rescisórias contra decisões em execuções extintas.
Na sessão plenária realizada em 19 de fevereiro de 2025, o ministro Dias Toffoli apresentou ajustes em seu voto, acolhendo sugestões dos ministros Cristiano Zanin, Flávio Dino e André Mendonça, para conhecer do recurso extraordinário e dar-lhe provimento, excluindo a recorrente do polo passivo da execução. Nessa ocasião, o STF fixou tese em repercussão geral estabelecendo que o cumprimento da sentença trabalhista não pode ser direcionado a empresa que não participou da fase de conhecimento, sendo necessária a sua prévia indicação como corresponsável na petição inicial. Foram também definidas hipóteses excepcionais em que se admite o redirecionamento, como sucessão empresarial e abuso da personalidade jurídica (art. 50, do CC), desde que observado o procedimento legal específico (art. 855-A da CLT e 133 a 137 do CPC). Por fim, o Tribunal determinou a aplicação desse entendimento inclusive a situações anteriores à reforma trabalhista de 2017, com ressalvas quanto a casos já transitados em julgado, créditos satisfeitos e execuções definitivamente encerradas.
O ministro Gilmar Mendes proferiu voto vogal no qual destacou a importância da aplicação do art. 513, §5º, do CPC no âmbito trabalhista, afirmando que seu afastamento pela Justiça do Trabalho configura violação à cláusula de reserva de plenário (art. 97 da Constituição Federal e súmula vinculante 10). O ministro apontou que o dispositivo decorre diretamente do art. 506 do CPC, relativo aos limites subjetivos da coisa julgada, e deve incidir plenamente no processo do trabalho, dada a aplicação supletiva prevista no art. 15 do CPC.
Além disso, observou que a exclusão do art. 513, §5º, pelo TST sem declaração formal de inconstitucionalidade afronta o sistema constitucional. Gilmar Mendes admite hipóteses excepcionais de inclusão de terceiros não participantes da fase de conhecimento: fato superveniente (ingresso posterior no grupo econômico), sucessão empresarial (art. 448-A da CLT) e abuso da personalidade jurídica, em interpretação restrita, limitada à fraude à execução (CPC, art. 792). Mesmo nesses casos, defende a instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica, com contraditório e ampla defesa.
Apenas com dois votos vencidos, prevaleceu, então, a tese proposta pelo ministro relator, Dias Toffoli, com os ajustes sugeridos pelo ministro Zanin. Ou seja, com efeito vinculante, foi fixada a tese de que só pode haver a inclusão em execução de empresa do mesmo grupo:
(i) Se houver a indicação prévia na petição inicial que é corresponsável;
(ii) Se houver a garantia do contraditório e da ampla defesa (eventualmente, com a instauração de IDPJ);
(iii) Em hipóteses excepcionais, como sucessão empresarial e abuso de personalidade jurídica, nos termos da legislação material aplicável (art. 50, do CC).
O STF deu importante passo na imposição do respeito ao devido processo legal processual e material, fazendo valer a legislação vigente e trazendo segurança jurídica para as relações empresariais.
Osmar Mendes Paixão Côrtes
Advogado do escritório Paixão Côrtes e Advogados Associados. Pós-doutor em Direito pela UERJ. Doutor em Direito pela PUC/SP. Mestre em Direito e Estado pela Unb. Diretor do IBDP. Professor do mestrado/doutorado do IDP.
Natália Bueno
Advogada no escritório Paixão Côrtes Advogados. Pós-graduada em Ordem Jurídica e Ministério Público pela Fundação Escola Superior do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (FESMPDFT). Mestranda em Direito, Estado e Constituição na Universidade de Brasília (UnB).




