Alguns apontamentos sobre SIGEF e material técnico para retificação de imóvel rural
Comentários sobre o SIGEF e o material técnico para certificação no Incra e retificação da matrícula por meio da averbação do georreferenciamento.
sexta-feira, 7 de novembro de 2025
Atualizado às 11:06
1. Introdução
O decreto 12.689/25 prorrogou o prazo do georreferenciamento. Apesar da prorrogação, a exigência legal permanece e com isso todos os imóveis rurais deverão ser georreferenciados, com certificação do Incra; as matrículas deverão ser retificadas no tocante à descrição até 21/10/25, sob pena de ficarem vedados desmembramentos, parcelamentos, remembramentos e quaisquer transferências de imóvel rural.
Os documentos exigidos para a retificação da matrícula do imóvel rural estão previstos no § 5º do art. 9º do decreto 4.449, de 2002, e são: 1. requerimento; 2. CCIR - certificado de cadastro do imóvel rural; 3. declaração do ITR - Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural e a respectiva CND - certidão negativa de débitos; 4. planta e memorial descritivos do perímetro do imóvel rural certificados pelo Incra; 5. ART - anotação de responsabilidade técnica; 6. declaração de responsabilidade do requerente de que respeitou os limites e as confrontações, nos termos do §13 do art. 176, da lei 6.015, de 1973. Além desses documentos, é necessário o 7. recibo de inscrição no CAR - cadastro ambiental rural e o respectivo Demonstrativo da Situação das Informações Declaradas no CAR.
O presente artigo visa analisar o atual sistema de certificação do Incra - Sigef - Sistema de Gestão Fundiária e a respectiva normativa para permitir a certificação do perímetro do imóvel rural a fim de promover a retificação matrícula no cartório de registro de imóveis competente.
Este será o último artigo da trilogia sobre o tema da retificação da matrícula e o georreferenciamento de imóvel rural. Nessa trilogia discorreu-se, ainda que timidamente, sobre alguns apontamentos do tema nos aspectos registrários1 e nos aspectos cadastrais2. Por fim, essa trilogia é dedicada ao adorável Dr. Helio Lobo Júnior, coautor do primeiro artigo, que nos deixou, infelizmente, no dia 6/7/25.
2. Apontamentos
2.1 Normas de certificação do georreferenciamento - 1ª edição; 2ª edição e 3ª edição (Sigef)
A lei 10.267/01, posteriormente regulamentada pelo decreto 4.449/02, alterou a lei de registros públicos para impor a averbação da descrição georreferenciada e certificada pelo Incra - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, nos imóveis rurais a fim de atender ao princípio da especialidade objetiva, previsto no art. 176, § 1º, II, da lei de registros públicos.
No âmbito do Incra, o procedimento de certificação de imóveis rurais foi inicialmente regulamentado com a IN 13/03. Posteriormente, o procedimento de certificação foi alterado pela IN 25/05. Em 2013, o procedimento de certificação de imóveis passou a ser eletrônico, por meio Sigef - Sistema de Gestão Fundiária do Incra, criado pela IN 77/13.
A certificação do perímetro do imóvel rural realizada nas normas anteriores não foi revogada pela IN 77/13. Portanto, essa certificação pode ser utilizada para a retificação do registro imobiliário. Apesar disso, a citada instrução permitiu que as certificações realizadas nas edições anteriores fossem convertidas ao Sigef, nos termos do art. 21 da IN 77/13.
Ressalta-se que, a partir da publicação da portaria Incra 629/22, a qual atualizou a 2ª edição do Manual Técnico de Georreferenciamento de Imóveis Rurais, foi adotado o conceito de imóvel rural, previsto na lei de registros públicos, para fins de certificação do perímetro do imóvel rural, a fim de facilitar o procedimento de retificação do registro imobiliário.
Atualmente, o georreferenciamento dos imóveis rurais deve ser executado conforme orientações da 2ª edição do Manual Técnico para Georreferenciamento de Imóveis Rurais, aprovada pela portaria Incra 2.502/22.
Por sua vez, o Manual para a Gestão da Certificação - 2ª edição, aprovado pela portaria Incra 3/23, alterada pela retificação de 12/9/23, estabelece procedimentos a serem realizados pelo Incra para promover a gestão da certificação de imóveis rurais.
2.2 Sobreposição de área
A IN 77/13 estabelece o procedimento de certificação do perímetro do imóvel rural no Sigef - Sistema de Gestão Fundiária.
No caso de sobreposição de parcela a ser certificada a citada IN estabelece procedimento a ser adotado, conforme previsto no art. 5º e seguintes da IN 77/13.
No caso de sobreposição de parcela com outro polígono não certificado por meio do Sigef, o profissional credenciado poderá requerer análise de sobreposição ao Comitê Regionais de Certificação (art. 5º).
No caso de sobreposição de parcela com outro polígono certificado por meio do Sigef, o técnico deverá requerer, via Sigef e de forma fundamentada, o cancelamento da certificação sobreposta para excluí-la do cadastro (art. 6º). A análise do deferimento do cancelamento será feita pelo Sigef e pelo Comite de Certificação, depois de notificado o proprietário da parcela certificada para fins de manifestação acerca da impugnação (art. 7º, § 5º).
2.3 A integração Sigef e registro de imóveis: Aspectos técnicos e a rigidez da análise do Incra/Sigef
A regularização fundiária no Brasil exige a perfeita integração entre a precisão técnica da engenharia e a segurança jurídica do registro de imóveis. O Sigef - Sistema de Gestão Fundiária do Incra - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária é o eixo central desse processo, atuando como o validador técnico das informações de georreferenciamento.
A análise de um requerimento de georreferenciamento submetido ao Sigef é predominantemente automatizada e baseada em critérios técnicos rigorosos.
O processo exige que o profissional credenciado submeta uma planilha junto ao Sigef com as informações dos vértices que definem o perímetro da parcela a ser certificada, as quais são as suas coordenadas geográficas e precisões, altitude, tipo de levantamento utilizada, tipo de limite e qualificação dos confrontantes.
O Sigef, ao receber a planilha, realiza uma análise minuciosa, que inclui: 1. Conformidade do datum: Verificação de que todos os vértices e coordenadas estão referenciados corretamente ao SIRGAS2000; 2. Consistência geométrica: Cálculo automático da área, perímetro, distâncias e azimutes (utiliza-se o Plano Geodésico Local); 3. Análise topológica (não-sobreposição): Este é o ponto técnico mais crítico. O sistema compara os limites propostos com o banco de dados de todas as propriedades já certificadas. O deferimento da certificação técnica inicial depende crucialmente de o imóvel não apresentar sobreposição com outros vértices, sejam eles de matrículas confrontantes ou de áreas públicas. A certificação do Incra só é emitida após a aprovação desta validação técnica.
Após a aprovação técnica do georreferenciamento pelo Incra (certificação), a etapa subsequente se dá junto ao RI - Registro de Imóveis.
O processo de retificação de área de um imóvel rural no Registro de Imóveis, com base em um georreferenciamento certificado pelo Incra/Sigef, ocorre por meio da abertura de nova matrícula ou a averbação da nova descrição perimétrica, atualizando-a descrição a fim de garantir sua identificação precisa e unívoca. Este procedimento é iniciado conforme previsto no § 5º do art. 9º do decreto 4.449, de 2002.
Concluído este processo, aberta a nova matrícula, há que se atentar a um ponto que o papel do oficial de registro (registrador) se torna fundamental, e onde reside o conceito de "deferimento automático": 1. Requerimento de registro no Sigef: a certificação do INCRA garante que os limites são tecnicamente corretos e únicos. Contudo, para que essa informação conste no banco de dados definitivo do SIGEF como área registrada, o oficial de registro é quem deve protocolar o requerimento final dentro do sistema. 2. A importância do requerimento pelo oficial: O requerimento de registro no Sigef, efetuado pelo oficial de registro (após a averbação na matrícula do cartório), possui deferimento automático. Isso se deve ao fato de que, para essa fase, a rigorosidade técnica já foi atestada pelo INCRA na emissão da certificação. O ato do oficial de registro é uma confirmação legal que associa o número da matrícula e as coordenadas, garantindo a integração final dos dados.
Essa rotina simplificada (deferimento automático) é uma medida de desburocratização. Ela reconhece a fé pública do registrador e impede que a matrícula fique "conflitante" com o banco de dados oficial do SIGEF, solidificando a segurança jurídica do imóvel.
Considerações finais
Em suma, o georreferenciamento do perímetro de um imóvel rural passa por um rigoroso filtro técnico (certificação Sigef), efetuado pelo profissional e validado pelo sistema, culminando no filtro legal (averbação no RI) e na confirmação automática (registro no Sigef pelo oficial de registro de imóveis). Este sistema integrado é a chave para a segurança e a unicidade da propriedade rural no Brasil.
Dessa forma, apesar da prorrogação do prazo para o georreferenciamento pelo decreto 12.689/25 para 21/10/29, recomenda-se que os perímetros dos imóveis rurais sejam georreferenciados; certificados no Incra e as matrículas retificadas no Cartório de Registro de Imóveis competente a fim aumentar a segurança jurídica sobre o imóvel rural e evitar possíveis conflitos fundiários.
Ressalta-se, por fim, que o georreferenciamento do perímetro do imóvel é a base dos cadastros ambiental (CAR) e fiscal (Cafir). Assim, com a exatidão gerado pelo georreferenciamento, ter-se-á o exato valor a ser recolhido para fins do imposto sobre a propriedade territorial rural - ITR e o exato passivo ambiental ou excedente de vegetação nativa, uma vez que as APP - áreas de preservação permanente e a área de reserva legal estarão devidamente identificadas.
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1 LOBO JUNIOR, Helio; ORLANDI NETO, Narciso; GRUPPI, Bruno D. Alguns apontamentos sobre retificação da matrícula e o georreferenciamento de imóvel rural. Migalhas, 10 abr. 2025. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/428041/apontamento-sobre-retificacao-da-matricula-e-georreferenciamento-rural. Acesso em 15 jun. 25.
2 GRUPPI, Bruno D; SANCHEZ, Rodrigo E. Alguns apontamentos sobre os cadastros do imóvel rural na retificação de matrícula. Migalhas, 10 abr. 2025. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/433838/apontamentos-sobre-cadastros-rurais-na-retificacao-de-matricula. Acesso em 28 ago. 25.
Bruno Drumond Gruppi
Advogado e geógrafo. Especialista em direito ambiental, agrário, registral e notarial. Coordenador da Adnotare, associado do Ibradim e membro das comissões de meio ambiente e agrário da OAB/SP.
Daniel Costa
Engenheiro agrimensor (Universidade Federal de Viçosa) e Engenheiro Civil (Mackenzie). Mestre em Engenharia (Poli USP). Ex- Diretor do Setor de Regularização Fundiária no INCRA/SP. Professor universitário. Forte atuação profissional em Engenharia Legal, Regularização de Imóveis, Georreferenciamento e Gestão de Projetos de Engenharia Civil e Agrimensura. Sócio da ENGDANIEL.




