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Teste físico em concurso público: A desigualdade entre piscinas aquecidas e não aquecidas nas provas de natação

Condições desiguais alteram desempenho físico e violam o princípio da igualdade em concursos.

quinta-feira, 13 de novembro de 2025

Atualizado em 12 de novembro de 2025 15:19

Entre todas as etapas de um concurso público, o teste de aptidão física talvez seja o que mais exige preparo, resistência e controle emocional. Correr, nadar, saltar - tudo isso envolve não apenas o corpo, mas a superação de limites que o candidato treinou durante meses para vencer. Por isso, é inaceitável que a Administração Pública trate de forma desigual quem enfrenta as mesmas provas em condições ambientais distintas, como ocorre nas provas de natação, quando alguns candidatos realizam o exame em piscinas aquecidas, enquanto outros nadam em águas frias e com temperatura abaixo do ideal.

À primeira vista, pode parecer um detalhe irrelevante. Contudo, a diferença térmica entre piscinas altera completamente o desempenho físico, a respiração e o ritmo do nadador. A água fria contrai a musculatura, reduz a oxigenação e compromete o controle motor. Enquanto um candidato nada em ambiente controlado e confortável, outro enfrenta condições fisiologicamente adversas. Trata-se, portanto, de uma clara violação ao princípio da isonomia.

O art. 5º, caput, da Constituição Federal, assegura a todos os cidadãos o direito à igualdade de condições em procedimentos públicos. Já o art. 37 reforça que a Administração deve agir com razoabilidade, proporcionalidade e moralidade, garantindo que nenhum candidato seja beneficiado ou prejudicado por fatores externos à sua própria capacidade. Quando a execução do teste físico depende do acaso climático, da hora do dia ou da temperatura da piscina, o mérito se dissolve no desequilíbrio das condições.

Esse problema não se limita à natação. Em inúmeras provas de corrida, por exemplo, candidatos são divididos em grupos em horários distintos - uns às 7h da manhã, sob clima ameno, outros ao meio-dia, sob sol escaldante. A disparidade ambiental é evidente: quem corre ou nada em condições mais severas não compete em igualdade real. Ainda que o edital preveja horários diferentes, o dever constitucional de isonomia deve se sobrepor ao cronograma administrativo.

A finalidade do teste de aptidão física é avaliar o desempenho técnico e o preparo físico do candidato, e não medir resistência ao frio, ao calor ou à sorte. Quando a Administração não garante uniformidade nas condições de prova, o exame perde legitimidade, pois deixa de aferir a aptidão funcional e passa a premiar o acaso ambiental. A igualdade formal, por si só, é insuficiente - o que se exige é igualdade material, que considere o contexto real em que o candidato é avaliado.

A Administração tem o dever jurídico de oferecer a todos os candidatos as mesmas condições de avaliação. Ninguém pode ser penalizado por nadar em uma piscina fria enquanto outros competem em ambiente aquecido. O concurso público deve medir esforço e mérito, e não tolerância térmica ou sorte meteorológica.

A advocacia, nesses casos, não luta apenas por um candidato, mas pela coerência do próprio sistema de mérito. O concurso público perde sua legitimidade quando a igualdade é meramente aparente. O que se busca é um Estado que trate o mérito com justiça e a legalidade com humanidade.

Ricardo Fernandes

Ricardo Fernandes

Professor, Escritor, Pesquisador, Palestrante, Policial Miltiar da Reserva. É Advogado Especialista em Concurso Público, Direito da PCD, Direito Internacional. Direito Processual Civil, Administrativo

Ana Paula Gouveia Leite Fernandes

Ana Paula Gouveia Leite Fernandes

Administradora e Advogada; Especialista em Concurso Público, Direito do Trabalho e Previdenciário.

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