Honorários acima de 40 salários mínimos no Juizado Especial: É possível cobrar pelo JEC?
Decisão permite cobrança de honorários altos por meio de procedimento simplificado, garantindo rapidez e proteção a profissionais liberais.
quinta-feira, 4 de dezembro de 2025
Atualizado em 3 de dezembro de 2025 15:09
A cobrança de honorários advocatícios sempre esteve entre os temas mais sensíveis da rotina jurídica. Não apenas por envolver a subsistência do profissional, mas porque reflete diretamente o valor do trabalho intelectual prestado. Entre as inúmeras discussões que envolvem essa matéria, uma tem ganhado destaque: é possível cobrar honorários acima de 40 salários mínimos no Juizado Especial? Ou o simples fato de o contrato superar esse limite afastaria, automaticamente, a competência do JEC?
Uma recente decisão da 2ª turma recursal do TJ/PB enfrentou exatamente essa questão ao analisar execução de honorários contratuais superiores a R$ 70 mil. O juízo do JEC havia extinguido o processo, entendendo que o valor ultrapassava o teto previsto na lei 9.099/1995. No entanto, a turma recursal anulou a sentença, reconhecendo que o Juizado Especial é competente para apreciar e julgar a cobrança de honorários de profissionais liberais - inclusive advogados - independentemente do valor, desde que não haja complexidade incompatível com o rito.
A decisão possui enorme relevância prática. Isso porque, na maior parte das vezes, a cobrança de honorários contratuais é uma causa documental, simples e sem necessidade de extensa instrução probatória. O profissional apenas apresenta o contrato assinado, comprova a prestação dos serviços e demonstra a inadimplência. Não há perícia, nem questões jurídicas profundas; trata-se de execução contratual pura. Impedir o acesso ao Juizado apenas pelo valor da remuneração seria contrariar a própria lógica da celeridade e da economicidade do rito.
Fundamentação legal
O entendimento adotado pela turma recursal baseia-se na harmonia entre três dispositivos importantes:
- Art. 3º, II, da lei 9.099/95 - prevê que o JEC também julga causas previstas no antigo rito sumário.
- Art. 275, II, "m", do CPC/1973 - incluía expressamente as ações de cobrança de honorários de profissionais liberais no rito sumário.
- Art. 1.063 do CPC/15 - preserva a aplicação desse dispositivo, mesmo após a revogação do CPC/1973, até que nova lei trate do tema.
Em síntese, a natureza da causa prevalece sobre o valor econômico. Tratando-se de honorários de profissional liberal, a ação pode tramitar no Juizado Especial, mesmo que ultrapasse 40 salários mínimos.
Esse raciocínio é reforçado pela jurisprudência do STJ, que, em diversas oportunidades, reconheceu que a competência do JEC não é afastada exclusivamente pelo valor quando a lei estabelece regra material específica. A interpretação é também acolhida pelo FONAJE, cujo enunciado 58 estabelece que as ações previstas no art. 275, II, do CPC/1973 admitem condenação superior ao limite e podem ser executadas no próprio Juizado.
Trata-se de uma leitura que privilegia a eficiência e o acesso à justiça. O profissional que busca o recebimento de valores contratados não deve ser obrigado a ingressar em um procedimento mais longo e custoso se a causa for simples e documental. A lei, ao permitir o rito especial, buscou resguardar o profissional liberal, garantindo-lhe uma via célere de tutela jurisdicional.
Por que esse entendimento é importante?
Porque evita que advogados e demais profissionais liberais fiquem à mercê de interpretações restritivas que limitam artificialmente o acesso ao Judiciário. Se o contrato de honorários é claro, se os serviços foram prestados e a inadimplência é objetiva, a discussão não é complexa. Não há motivo para afastar o Juizado Especial, ainda que o valor seja expressivo.
Essa compreensão também impede que o devedor utilize o teto de 40 salários mínimos como estratégia de resistência injustificada. A finalidade do sistema dos Juizados é justamente proporcionar soluções rápidas, práticas e econômicas. Nada mais coerente do que permitir que o profissional busque essa via quando a causa não exige aprofundamento técnico.
O reconhecimento dessa competência traz segurança jurídica e fortalece a advocacia, assegurando que contratos legítimos, regularmente firmados, possam ser executados da forma mais eficiente possível.
A possibilidade de cobrar honorários contratuais acima do teto dos Juizados Especiais é um avanço necessário para a advocacia. A lei preservou esse direito exatamente para impedir que causas simples sejam empurradas para ritos lentos e desproporcionais. O advogado que prestou serviços e tem contrato válido merece uma resposta rápida do Judiciário. Esse entendimento reforça o respeito à dignidade da profissão e garante que valores elevados não sejam utilizados como barreira ao acesso à justiça.
Ricardo Fernandes
Professor, Escritor, Pesquisador, Palestrante, Policial MilItar da Reserva. É Advogado Especialista em Concurso Público, Direito da PCD, Direito Internacional. Direito Processual Civil, Administrativo
Ana Paula Gouveia Leite Fernandes
Administradora e Advogada; Especialista em Concurso Público, Direito do Trabalho e Previdenciário.



