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Concurso público: Aprovado sub judice tem direito à remuneração integral após exercer o cargo?

Candidato aprovado sub judice que exerce plenamente o cargo tem direito à remuneração integral. O TJ/PB reafirma que pagar menos gera enriquecimento ilícito e não viola a súmula vinculante 37.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

Atualizado em 4 de dezembro de 2025 15:35

A situação do candidato aprovado sub judice em concursos públicos tem gerado debates complexos no Judiciário, especialmente quando esse candidato, por força de decisão liminar, conclui todas as fases do certame, assume as atribuições do cargo e passa a exercê-lo de forma plena. Surge então a dúvida: é devido o pagamento integral da remuneração prevista em lei para o cargo? Ou o Estado pode limitar o pagamento, alegando ausência de previsão normativa e afronta ao art. 37 da Constituição Federal?

Uma recente decisão da 1ª Câmara Especializada Cível do TJ/PB oferece resposta clara a essa controvérsia. No caso analisado, um candidato que havia ingressado sub judice em concurso militar concluiu o Curso de Formação de Soldados, obteve o engajamento e exerceu as funções típicas do cargo. Mesmo assim, o Estado insistia em remunerá-lo como "aluno em formação", sustentando que qualquer pagamento superior violaria o princípio da legalidade e configuraria aumento de remuneração sem lei específica, situação vedada pela súmula vinculante 37 do STF.

O argumento, embora recorrente em defesas estatais, não prosperou. O Tribunal paraibano deixou claro que remunerar o servidor de acordo com as funções efetivamente exercidas não constitui aumento por isonomia, tampouco equiparação salarial. O que há, segundo o acórdão, é o cumprimento do dever básico da Administração de pagar pelo trabalho realizado, sob pena de enriquecimento ilícito - vedado pelo art. 37, §6º, da própria Constituição e pela jurisprudência consolidada do STJ.

Nos embargos de declaração interpostos pelo Estado, alegou-se que o acórdão anterior teria sido omisso ao não enfrentar expressamente os dispositivos constitucionais mencionados. O Tribunal rejeitou a tese, explicando que a matéria foi devidamente analisada e que não há omissão quando o julgador, ainda que sem citar artigo por artigo, resolve integralmente a controvérsia. Ressaltou-se, inclusive, que a exigência de "citação literal" para fins de prequestionamento não tem respaldo na orientação atual do STJ.

Mais importante ainda foi a reafirmação de um ponto jurídico essencial: quando o candidato sub judice completa todas as etapas do concurso, conclui o curso de formação e assume as funções do cargo, a remuneração correspondente não decorre de equiparação, mas sim do exercício real das atribuições. A hipótese está muito distante da Súmula Vinculante 37, que trata apenas de situações em que o Judiciário aumenta vencimentos com base em isonomia ou simetria, sem qualquer base fática.

A distinção é decisiva. No caso examinado, o militar não buscava ganho remuneratório superior ao previsto em lei, mas somente a contraprestação legal pelo cargo que efetivamente passou a exercer. A decisão deixa evidenciado que negar esse pagamento equivaleria a reconhecer que alguém pode desempenhar todas as funções de soldado engajado recebendo remuneração inferior por mera formalidade processual - consequência incompatível com os princípios da moralidade e da razoabilidade administrativa.

O posicionamento adotado pelo TJ/PB alinha-se à jurisprudência de diversos Tribunais brasileiros, que têm reconhecido que o candidato sub judice aprovado em todas as etapas, quando investido faticamente nas atribuições do cargo, faz jus à remuneração integral prevista em lei. A Administração Pública, ao receber o serviço, não pode remunerá-lo parcialmente, nem tampouco invocar a súmula vinculante 37 como barreira automática ao pagamento.

O tema ainda deve gerar debates, especialmente em concursos militares, nos quais cursos de formação, engajamentos e estágios probatórios possuem peculiaridades próprias. Mas o precedente reforça uma diretriz fundamental: o Estado não pode se beneficiar da força de trabalho de um candidato admitido por decisão judicial, exigindo-lhe desempenho pleno e avaliação contínua, para depois negar a contraprestação devida com base em um suposto obstáculo constitucional que, na realidade, não se aplica ao caso concreto.

A controvérsia, portanto, não é sobre aumento salarial. É sobre justiça administrativa e respeito à vedação ao enriquecimento sem causa. E nessa matéria, a resposta dos Tribunais tem sido firme: exercido o cargo, a remuneração deve corresponder ao cargo.

Ricardo Fernandes

Ricardo Fernandes

Professor, Escritor, Pesquisador, Palestrante, Policial MilItar da Reserva. É Advogado Especialista em Concurso Público, Direito da PCD, Direito Internacional. Direito Processual Civil, Administrativo

Ana Paula Gouveia Leite Fernandes

Ana Paula Gouveia Leite Fernandes

Administradora e Advogada; Especialista em Concurso Público, Direito do Trabalho e Previdenciário.

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