Leis

20/3/2007
André Brawerman - Procurador do Estado de SP, mestre e doutorando em Direito do Estado, prof. de Direito Constitucional PUC/SP e FADISP

"Leis passionais (ditadura da maioria). Cortar a cabeça de um ditador é mais fácil do que controlar a multidão tresloucada... O Congresso produziu em uma semana três novas Leis para garantir 'a segurança pública', em decorrência do lamentável crime ocorrido na cidade do Rio de Janeiro. Eis as manchetes que li aqui no 'Migalhas':

- Senado aprova projeto que endurece o regime de pena por crimes hediondos (Migalhas 1.609 – 8/3/07 – "Legislação Penal" – clique aqui).
- Câmara aprova novas regras para interrogatórios de presos (Migalhas 1.609 – 8/3/07 – "Legislação Penal" – clique aqui)
- Posse de celular por detento passa a ser falta disciplinar grave (Migalhas 1.609 – 8/3/07 – "Legislação Penal" – clique aqui)

É necessária uma política pública séria que combata a violência no Brasil, não um apanhado de medíocres Leis que satisfaçam a sede de vingança da maioria. Sem entrar no mérito de cada uma destas Leis, a respeito dos perigos do poder das maiorias (Poder Legislativo), citamos os ensinamentos do Professor Oswaldo Aranha Bandeira de Mello e outros célebres juristas, arrolados no seu clássico A teoria das Constituições rígidas (São Paulo: Editora Bushatsky, 1980). RUI BARBOSA: 'a violência se repete através dos séculos, como os sentimentos humanos passam pela mesma perversão em todas as ditaduras, nas ditaduras da multidão, ou nas ditaduras da espada'. SAMPAIO DÓRIA (esta frase é a minha preferida): 'Há duas formas de tirania, a tirania dos reis e a tirania da plebe. Num e noutro casos, o que se trata é o império, sem contrastes, da vontade, de um só, ou da vontade de muitos. Ambos são condenáveis, e mais ainda o da plebe. Onde, nas massas deliberantes, há mais capacidade e maior idoneidade que nos reis, educados para esse fim? A ter de escolher se desgraça tamanha fosse inevitável, entre a onipotência dos reis, e a onipotência da plebe, certo que o menor mal estaria na dos reis. Porque, ao menos haveria pessoa certa, contra cuja cabeça pudessem aprumar-se os raios da vingança reparadora. Na onipotência, porém, da vontade geral, não há responsáveis, é o anonimato em massa (...)'. OSWALDO ARANHA BANDEIRA DE MELLO: '(...) os governos constituídos por eleição, quando não refreados, não são menos suscetíveis de se excederem do que os originários de designação hereditária. Acima da vontade do parlamento, devem sempre pairar os direitos da personalidade humana, desde que o Estado é um meio do qual o bem comum dos indivíduos membros da sociedade é o fim. Governar é servir, na frase dos escolásticos'. MAURICE HAURIOU: 'Já é hora de compreender-se que o Poder Legislativo é ainda mais perigoso para as liberdades individuais que o Poder Administrativo (...) chega a ser urgente proteger as nossas liberdades individuais contra as empresas deste Poder; há uma relativa Bastilha a demolir, que é a crença na soberania do parlamento'. LAVELEYE: 'A Assembléia é mais temível que o Monarca. Este é muito mais contido pelo sentimento da sua responsabilidade, quer diante do povo, quer diante da história. Uma reunião de homens não conhece este sentimento. Nada a modera, e a sua responsabilidade é nula'. A regra da maioria desempenha papel de destaque nesse processo de decisão coletiva entre indivíduos iguais; porém, a decisão democrática não depende de um simples fato aritmético. Essa decisão deve resultar de um processo de formação livre e racional da vontade - e, portanto, a manutenção de certos direitos é tão essencial à democracia como a própria regra da maioria. Proponho reflexão e não a edição de um punhado de Leis feitas em troca de votos."

Envie sua Migalha