Artigo - Células-tronco embrionárias e coerência

27/5/2008
Dávio Antonio Prado Zarzana Júnior

"O ilustre desembargador Francisco Cesar Pinheiro Rodrigues, em seu artigo desta semana sobre o tema das células-tronco embrionárias, trouxe sua contribuição neste espaço democrático (Migalhas 1.904 - 27/5/08 - "Células-tronco" - clique aqui). Ao fazê-lo, novamente utilizou um argumento que também foi mencionado em debates anteriores: se o Papa tivesse uma enfermidade grave, o povo católico 'mudaria de opinião'? Ou, nas suas palavras, que preciso reproduzir aqui: ... 'Um papa altamente intelectualizado, 'honrado e firme como o atual deveria, por pétrea 'coerência', recusar um tratamento com remédios oriundos de tais pesquisas? A coerência moral, presume-se, o obrigaria a essa recusa; mas o mundo católico — indaga-se — aceitaria facilmente que seu guia espiritual afundasse na indigência mental, quase animal, apenas porque os únicos remédios disponíveis originavam-se de laboratórios 'moralmente condenáveis', que faziam experiências com células-tronco embrionárias? Seus fiéis, pergunta-se, prefeririam assistir à lenta deterioração mental de Sua Santidade, quando sua mente brilhante poderia se salva com tais remédios? Os médicos do Vaticano certamente pressionariam o excepcional paciente a transigir, aceitando os novos tratamentos, mesmo com um 'vício de origem'. Duvido, até, que o próprio Papa insistisse na intransigência que, por sinal, teria uma conotação de suicídio — um pecado, no entender da doutrina católica. Um papa zeloso na condução da grande nau do catolicismo dificilmente preferiria a coerência de se deteriorar lentamente pela doença, havendo a opção de salvar sua mente — e seu rebanho —, aceitando os remédios oriundos de tais pesquisas' [...]. Como todos os migalheiros podem notar, não há neste parágrafo transcrito as seguintes palavras: Deus e alma. Na Bíblia lê-se que o profundo respeito a Deus, também chamado de temor reverencial, é o início de toda a sabedoria. Jesus, Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, diz: 'Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida'. Vida que não é apenas um valor, uma realidade: é também uma Pessoa em excelência. E toda a sabedoria transmutada em doutrina e elaborada em torno desta Pessoa valoriza a vida humana, como nenhuma outra instituição terrena o faz, nem nunca fez ou fará. O ato sexual que leva à concepção humana traz ao mundo não apenas um 'zigoto', um 'embrião'. Cria, também, uma alma humana, na esfera espiritual. A salvação das almas começa na concepção, e vai até a velhice, e mesmo nas orações pelos entes queridos que já partiram. A realidade do pecado (desobediência às leis de Deus e à lei natural) é também metajurídica, mas ultimamente tem sido escarnecida em nome de um laicismo que lembra muito os horrores dos dois maiores genocídios da história: o holocausto e o regime comunista, nos quais falar-se em Deus era um absurdo. O argumento de que o Papa se deixaria tratar por medicamentos ou ferramentas oriundos de tais pesquisas, para 'salvar sua mente e seu rebanho' somente pode ser interpretado como proveniente de um tipo de pensamento, não exclusivo, de que o Papa pensa mais em si mesmo do que nos valores espirituais que defende por obrigação espiritual de sucessão apostólica milenar, valores inalteráveis como a vida, o amor, a solidariedade e a verdade. É óbvio que o Papa - um verdadeiro Papa - não faria tamanho absurdo, hipótese somente relegada aos pusilânimes hedonistas da sociedade atual, que não entendem o porquê da morte de Jesus Cristo (e sua ressurreição logo em seguida). Um Papa zeloso na condução da grande nau do catolicismo, e do mundo todo, preferiria mil vezes dar a própria vida a exemplo de Cristo, do que atender a interesses voltados diretamente para o genocídio em massa, disso podemos ter certeza. Hoje a mentira corre solta no mundo político e na mídia, e a desonestidade é praticada, inclusive na ciência, com a ilusão de que 'ninguém está vendo mesmo', ou ainda, 'devemos buscar o poder a qualquer custo'. Bem, Deus está vendo. E a cada um recompensará segundo suas obras , e revelará os pensamentos secretos de todos os corações. E se desvendará, finalmente, toda a sujeira e a podridão que estão por trás do movimento abortista e estimulador das pesquisas com células-tronco. Talvez realmente a justiça humana seja falha. Mas a divina não é. E ela vem, cedo ou tarde. Os políticos do Brasil - os bons, pelo menos, se os há - deveriam abrir os olhos para o fator do longo prazo. Muitos países fazem pesquisas com células-tronco embrionárias. Também muitos países adotam a pena de morte, o aborto, a eutanásia, enfim, a eugenia e crimes piores. Se o critério axiológico para a interpretação dos valores essenciais do ser humano for depender do número de países, ou de um tipo de 'Maria vai com as outras', em detrimento das verdades ontológicas sobre estes mesmo valores e princípios, o mundo está perdido. E hoje caminha para essa perdição, mesmo, se nada for feito, justamente pela perda do sentido do espiritual, de Deus, da alma humana, que deve ser resgatado e restaurado. O grande jurista Ives Gandra da Silva Martins não precisava ter iniciado sua defesa no STF, antes da audiência pública sobre as aludidas pesquisas, afirmando que não se tratava de argumentos religiosos, mas somente científicos. Por quê? Por qual razão a religião como um todo, e mais especificamente a católica, vem sendo atacada sistematicamente no mundo todo, nas últimas décadas, com uma proporção nunca antes vista? Quem está interessado no pretenso 'esquecimento de Jesus e de Deus', como se Eles não existissem? Bom, aí pouca gente sabe responder. Não é mesmo, Robin de Ruiter? Pesquisem, amigos migalheiros. Pesquisem."

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