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Princípio da insignificância

Furto de miojo, steak e água: entenda o princípio da insignificância

Recentes casos de insignificância chegaram aos tribunais superiores e causaram indignação. Mas, como a Justiça tem aplicado o princípio?

Da Redação

quinta-feira, 18 de novembro de 2021

Atualizado em 19 de novembro de 2021 10:05

Nos últimos meses uma enxurrada de casos envolvendo pequenos furtos se destacaram nos tribunais superiores. Noticiamos recentemente o caso do furto de dois steaks de frango; o da mãe que furtou alimentos avaliados em R$ 21,69, incluindo miojo e coca-cola; o furto de requeijão que chegou ao STF e o de uma mãe presa por mais de 100 dias por furto de água.

Ao longo dos anos, a Justiça brasileira tem aprimorado a aplicação do princípio da insignificância, que não consta em lei, mas tem se consolidado na jurisprudência. Apesar disso, muitos casos como esses, considerados insignificantes na Justiça, chegam nas instâncias superiores e saltam aos olhos por gerar uma sobrecarga no Poder Judiciário, a superlotação do sistema prisional e a reflexão de até que ponto a aplicação de prisões em casos assim são efetivas sobre a questão da criminalidade.

O que é?

O princípio decorre do entendimento de que o Direito Penal não deve se preocupar com condutas em que o resultado não é suficientemente grave a ponto de não haver necessidade de punir o agente nem de se recorrer aos meios judiciais, por exemplo, no caso de furto de pequeno valor, estelionato, pequenas infrações tributárias e até posse de pequena quantidade de munição desacompanhada de arma de fogo.

O defensor público de MG Flavio Wandeck, atuante no caso do steak de frango no STJ, explicou ao Migalhas que, para a aplicação da insignificância, deve ser verificado caso a caso.

Como é aplicado?

Segundo o defensor, o princípio é aplicado aos casos de crimes cujo resultado não é suficientemente grave a ponto de haver necessidade de punir o agente.

Para isso, são necessários alguns requisitos, como a mínima ofensividade da conduta, nenhuma periculosidade, reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada.

De acordo com Wandeck, os requisitos são abstratos e a própria jurisprudência tem dificuldade de estabelecer o que cada um significa. O defensor destaca ainda que os tribunais não têm aplicação uniforme e dentro do próprio STF, por exemplo, há divergência quanto à aplicação no caso de reincidentes.

Filtros

Na última segunda-feira, 15, o ministro do STJ Marco Aurélio Bellizze concedeu entrevista ao Migalhas tratando do princípio da insignificância. Segundo o magistrado, "há necessidade de controles de demandas que chegam aos Tribunais Superiores". Ele chamou atenção para a discussão, no Congresso, da PEC 10, que trata de filtros de causas que possam ou não chegar ao STJ.

Assista: 

 

Jurisprudência

O ministro Gilmar Mendes, do STF, considera inadequado afastar o princípio da insignificância "tão somente pelo fato de o recorrente possuir antecedentes criminais".

No STJ, por exemplo, o ministro Paciornik apontou, ao conceder HC a mãe que furtou miojo, que a jurisprudência da Corte entende que a habitualidade na prática de delitos, mesmo que insignificantes, afasta a incidência da bagatela. Entretanto, ele ponderou que há situações em que o grau de lesão ao bem jurídico tutelado pela lei penal é tão ínfimo que não se poderia negar a incidência do princípio.

O ministro Sebastião Reis Jr. se mostrou indignado no caso do furto de steak. Segundo o ministro, os tribunais e Ministério Público não seguem os entendimentos aplicados e os precedentes da Corte, e continuam insistindo em processos que já são pacificados.

"Quanto se gastou com esse processo? O jeito que está não é possível continuar mais." O ministro ressaltou dados que coletou nos últimos tempos da quantidade de processos no âmbito penal do STJ: "É humanamente impossível julgar tudo", lamentou.

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