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CBIOs

Desembargador suspende sanções do RenovaBio e aponta falhas no programa

Desequilíbrio na oferta de CBIOs, insegurança regulatória e punições excessivas são alguns dos problemas destacados na decisão.

Da Redação

terça-feira, 26 de agosto de 2025

Atualizado às 11:14

A aplicação das sanções da ANP - Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis no âmbito do programa RenovaBio contra distribuidoras de combustíveis foi suspensa por determinação do desembargador Federal Nery Júnior, da 3ª turma do TRF da 3ª região.

Em decisão liminar, o relator atendeu a pedido de uma distribuidora de combustíveis e apontou série de inconsistências e problemas estruturais na política pública de descarbonização.

RenovaBio

O RenovaBio é a Política Nacional de Biocombustíveis, instituída pela lei 13.576/17, como parte da estratégia brasileira de redução de emissões de gases de efeito estufa e de cumprimento dos compromissos assumidos no Acordo de Paris em 2015.

O objetivo central do programa é reduzir a intensidade de carbono da matriz de transportes, estimulando a produção e o consumo de biocombustíveis como etanol, biodiesel e biometano.

Para cumprir essas metas, as distribuidoras são obrigadas a comprar CBIOs - Créditos de Descarbonização em quantidade suficiente e, em seguida, retirá-los de circulação no sistema da bolsa de valores.

Esse procedimento é chamado de "aposentadoria" do CBIO: uma vez aposentado, o crédito não pode mais ser negociado no mercado e passa a contar oficialmente como meta cumprida pela distribuidora.

Quanto menor for a intensidade de carbono do combustível produzido, maior a nota recebida pela distribuidora e, portanto, maior o número de CBIOs que o agente pode gerar.

Em linhas gerais:

  • Produtores e importadores certificados emitem CBIOs;
  • Distribuidoras são obrigadas por lei a comprar CBIOs em quantidade suficiente para atingir suas metas;
  • A ANP regula a certificação e a fiscalização, enquanto a bolsa registra e controla a negociação dos créditos.

O modelo se apoia no princípio do "poluidor-pagador", transferindo recursos de agentes que emitem gases de efeito estufa para aqueles que investem em soluções de menor impacto ambiental.

O caso

No processo, a distribuidora agravante buscou impedir a ANP de impor multas, restringir atividades, vedar o fornecimento de combustíveis por terceiros e mantê-la em listas públicas de inadimplência.

Alegou que o RenovaBio apresenta falhas que inviabilizam o cumprimento das metas de aquisição de CBIOs.

A empresa também pediu a suspensão do programa até que medidas corretivas fossem implementadas.

Ao analisar o pedido, o relator reconheceu a probabilidade do direito e o risco de dano decorrente da aplicação de sanções gravíssimas aos agentes obrigados.

Assim, determinou que a ANP se abstenha de praticar atos sancionatórios com base no art. 9º-B da lei 13.576/17, na lei 15.082/24 e em regulamentos correlatos, além de exigir da agência comprovação da disponibilidade de CBIOs para todas as distribuidoras.

 (Imagem: Reprodução/Arte Migalhas)

Desembargador suspendeu sanções do programa RenovaBio a distribuidoras de combustíveis.(Imagem: Reprodução/Arte Migalhas)

Críticas ao RenovaBio

No voto, o desembargador ressaltou que o programa foi concebido de forma "açodada" e apresenta graves fragilidades estruturais. Entre os principais problemas, destacou:

  • Distorção entre oferta e demanda: a emissão de CBIOs é voluntária pelos produtores, enquanto a aquisição é compulsória para distribuidoras, gerando desequilíbrio crônico, alta volatilidade e especulação.
  • Participação de agentes não obrigados: investidores sem obrigação legal competem no mercado, ampliando a escassez de créditos e provocando cobrança de ágio.
  • Volatilidade extrema: os preços dos CBIOs já ultrapassaram variação de 400%, conforme reconhecido pelo TCU e pelo TRF da 1ª região, criando insegurança e risco de abuso de mercado.

"Um exemplo disso é a distorção estrutural do mercado de CBIOs, uma vez que a emissão do certificado pelos produtores de biocombustíveis (assim como sua negociação na bolsa de valores) é voluntária, ao passo que a demanda é composta por metas compulsórias a serem cumpridas anualmente pelas distribuidoras, independentemente da quantidade e o preço do crédito ofertado.

Como era de se prever, não tardou para que houvesse um desequilíbrio crônico entre oferta e demanda, seguido pela alta volatilidade e por movimentos especulativos em torno do preço das CBIOs. Isso sem falar na aquisição de CBIOs por agentes não obrigados, o que contribui para escassez e oneração decorrente da cobrança de ágio.

A escassez e a opacidade do mercado resultam em volatilidade de preços que já ultrapassou 400%, conforme já reconheceu o TCU e o Tribunal Regional Federal da 1ª Região."

  • Concentração de ônus nas distribuidoras: apenas as empresas de distribuição são responsabilizadas pela compensação ambiental, embora representem um elo minoritário na emissão de gases. Esse desequilíbrio gera prejuízos financeiros, especialmente para pequenas e médias empresas, com risco de encerramento de atividades.
  • Judicialização crescente: diversas ações judiciais, liminares e as ADIns 7.596 e 7.617, em trâmite no STF, questionam a constitucionalidade e a aplicabilidade da política.

Penas desproporcionais e insegurança jurídica

Outro ponto criticado foi a edição da lei 15.082/24, que endureceu penalidades sem corrigir as falhas do sistema.

Entre as mudanças, a norma passou a prever:

  • tipificação do descumprimento de metas como crime ambiental;
  • aumento do teto de multas de R$ 50 milhões para R$ 500 milhões;
  • proibição de compra de combustíveis por distribuidoras inadimplentes;
  • possibilidade de cassação da autorização de operação em caso de reincidência.

O desembargador destacou que a lei entrou em vigor no próprio dia 31/12/24, quando se encerrava o prazo de cumprimento das metas, o que teria dado menos de 24 horas para adaptação, em afronta ao princípio da irretroatividade penal mais gravosa.

Além disso, criticou a publicação de listas de inadimplência sem respeito ao contraditório e à ampla defesa, prática que, segundo ele, viola a presunção de inocência.

Repercussão setorial

A decisão não apenas atendeu ao pleito da empresa agravante, mas repercutiu em todo o mercado de distribuição de combustíveis.

O desembargador determinou a suspensão das sanções da ANP para todas as distribuidoras, em um momento em que os CBIOs já enfrentam forte desvalorização e questionamentos sobre sua credibilidade como ativo ambiental.

O voto ainda ressaltou a presença de agentes especulatórios no mercado, que, sem obrigação legal, competem com as distribuidoras na compra dos créditos, ampliando a escassez e elevando artificialmente os preços.

Essa lógica, combinada à obrigatoriedade de aposentadoria de CBIOs pelas distribuidoras, expõe uma falha estrutural central do RenovaBio: a inexistência de correlação entre oferta voluntária e demanda compulsória.

Com isso, a decisão tende a fortalecer os pleitos de entidades e associações do setor de combustíveis, que há tempos denunciam os problemas do programa, como a falta de transparência, a concentração de custos nas distribuidoras e a insegurança jurídica gerada por alterações legislativas repentinas.

Assim, com base nas inconsistências apontadas, o desembargador determinou:

  • suspensão de quaisquer sanções da ANP às distribuidoras no âmbito do RenovaBio;
  • proibição da manutenção e divulgação de listas públicas de inadimplência;
  • exigência de comprovação da ANP sobre a real disponibilidade de CBIOs no mercado;
  • expedição de ofício à B3 para informar sobre a atuação de agentes não obrigados.

Processo5021162-67.2025.4.03.0000

*Conteúdo patrocinado.

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