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O Brasil de Van Gaal e Maradona

O técnico da Holanda Louis Van Gaal e o jogador Maradona tem o mesmo palpite: o Brasil é o favorito.

10/3/2014

Ele carrega a fama de não gostar muito de jogadores brasileiros. Talvez mais certo seja dizer que ele não gosta muito de trabalhar com jogadores brasileiros. Implicou com Rivaldo no Barcelona, já foi comparado a Hitler por Giovanni, dispensou Lúcio e Zé Roberto do Bayern de Munique, para onde, em compensação, levou o volante Luiz Gustavo, um dos 11 de Felipão no Brasil que pode encarar a sua Holanda já nas oitavas-de-final da Copa do Mundo.

Louis Van Gaal aposta, porém, no Brasil hexacampeão mundial, como revelou ao repórter Bruno Côrtes, do SporTV, duas semanas atrás, em Florianópolis: "O Brasil é o favorito. Não só pelo time, mas pelo técnico que tem. Eu vi os jogos da primeira fase da Copa das Confederações e não gostei da seleção brasileira. Nas semifinais e na final, o técnico reconstruiu o time mentalmente. Acredito que eles jogaram como um time e, quando o Brasil joga como equipe, é o favorito".

Mais do que a aposta em si, vale destacar o motivo que leva o técnico holandês a apostar na Seleção. Repetindo: "Quando o Brasil joga como equipe, é o favorito". E não é que o Brasil do mestre-sala Neymar fez questão de confirmar, na goleada por 5 a 0 sobre a África do Sul no amistoso da Quarta-feira de Cinzas em Johanesburgo, ter acertado o pé nos quesitos harmonia e evolução em campo?

Outros amistosos da semana passada mostraram ainda a derrota da Holanda para a França por 2 a 0, a suada vitória da Alemanha sobre o Chile por 1 a 0, o empate por 0 a 0 da Argentina com a Romênia e mais uma vitória por 1 a 0 da campeã Espanha, dessa vez sobre a Itália. Nesses cinco jogos, desfilaram os principais candidatos ao título que será disputado de 12 de junho a 13 de julho. Amistoso não é Copa, evidentemente, mas os resultados mantêm em alta o otimismo dos torcedores brasileiros.

Igualmente ligado nas lições da história, o holandês Van Gaal fez questão de lembrar ao repórter Bruno Côrtes que "nenhum país europeu venceu uma Copa do Mundo disputada na América da Sul", embora considere que a Alemanha possa ser uma grande adversária para o Brasil e para a Argentina em 2014.

Meio medíocre das décadas 70 e 80 do século passado, Aloysius Paulus Maria van Gaal maltratou a bola com a camisa de pequenas e médias equipes holandesas, como Royal Antwerp, Telstar, Sparta Roterdã e AZ Alkmaar, antes de se consagrar como técnico de esquadrões como Ajax, Barcelona e Bayern de Munique. É a segunda vez que comanda a seleção holandesa – na primeira, não conseguiu a classificação para a Copa do Mundo de 2002; agora, classificou os atuais vice-campeões do mundo para a Copa com nove vitórias e um empate nos dez jogos das Eliminatórias europeias. O futebol, para ele, é uma obra de conjunto.

Mais do que com craques brasileiros, Van Gaal implica com as estrelas que não se entregam completamente ao jogo coletivo que preza acima de tudo e define como a essência do futebol. Ele já contou que, na primeira vez que viu de perto um treino do fantástico Ajax que Rinus Mitchell começava a montar no final dos anos 1960, ficou mais fascinado com o trabalho do técnico do que com as andanças em campo do supercraque Cruyff. A revelação é chave para entender Van Gaal.

Numa entrevista ao site da FIFA, no fim do ano passado, ele explicitou sua visão: "É preciso jogar como um time e não como indivíduo. É por isso que sempre volto a meu modo de ver o futebol, e depois penso no time e só então em quais jogadores se encaixam em meu sistema, o 4-3-3, porque sempre jogo com ele. Se um jogador mais jovem conseguir fazer isso, eu o escolho. Se for um jogador mais velho, não me importa; isso não é o fator mais importante".

Imodesto, acha que tem uma filosofia de jogo, não apenas uma visão própria do futebol. Na mesma entrevista, ao ser perguntado sobre o que o diferencia de outros técnicos, não titubeou em responder: "Acho que é minha filosofia, porque ela une os jogadores à maneira como treino. Em minha carreira, tive muitos jogadores que ficaram fascinados por essa filosofia. Eles gostam de fazer parte dela porque é ofensiva, técnica e tática. Por isso, podem mostrar suas qualidades mais do que nunca".

Van Gaal admira muitos jogadores brasileiros, mas, da mesma forma que está tentando rejuvenescer a sua Holanda para os duros embates contra Espanha, Austrália e Chile na fase de grupos da Copa do Mundo e quem mais vier a partir das oitavas, põe fé no Brasil porque enxergou sinais de que Felipão conseguiu moldar o talento de Neymar e companhia às necessidades coletivas do futebol moderno e, portanto, eles "podem mostrar suas qualidades mais do que nunca".

Van Gaal tem companhia ilustre na bancada de apostadores. Há poucos dias, de passagem por Dubai, Diego Armando Maradona também encheu a bola da Seleção: "Sem dúvida, meu favorito é o Brasil, que já demonstrou sua força na Copa das Confederações. Quando estão devidamente concentrados, os brasileiros são imbatíveis". Ou seja: o time que evolui harmonicamente em campo também se destaca no quesito concentração, reforçando a perspectiva de um novo Carnaval no meio do ano.

Há vozes dissonantes, porém. Em entrevista à Folha de S. Paulo, o francês Marcel Desailly, campeão do mundo em 1998, discordou do holandês e do argentino: "A Argentina é a primeira seleção que me vem à cabeça como favorita. O Brasil lidou bem com a pressão na Copa das Confederações, mas acho que a Copa do Mundo vai pesar demais sobre seus ombros".

Os brasileiros torcem por Van Gaal e Maradona, pelo menos como palpiteiros.

O Pai

Van Gaal apareceu como grande treinador para o mundo do futebol no Ajax, tendo sido campeão europeu e mundial em 1995 e tricampeão holandês (1994, 1995 e 1996). Foi ainda bi espanhol pelo Barcelona (1998 e 1999), novamente campeão holandês pelo AZ Alkmaar (2009) e alemão pelo Bayern (2010). No ano passado, quando o clube de Munique contratou Pep Guardiola, chegou a se insinuar como mentor da contratação. O presidente do Bayern, Uli Hoeness, negou e disparou: "O problema não é que Louis se ache Deus; ele acha que é o pai de Deus. Antes de o mundo existir, Louis já estava lá".

Na final

Última pergunta a Luiz Felipe Scolari em entrevista publicada pelo site da Fifa na véspera dos 5 a 0 sobre a África do Sul: "O que você estará fazendo às 16 horas do próximo dia 13 de julho?" Resposta do técnico brasileiro: "Bem, sei que 13 de julho é a final. Então, se começa às 16h, eu estou lá me preparando em campo: já cantei o hino nacional com alegria, fervor e dinamismo, assim como espero que meus jogadores e o público também. E esperando que nós todos no Brasil possamos jogar uma final e ganhar".

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Colunista

Roberto Benevides é jornalista, foi por muitos anos colunista e o editor do caderno de esportes de O Estado de S. Paulo, trabalhou também no JB, na Folha de S.Paulo, nas revistas Veja, Exame, Quatro Rodas, Placar e Época. Nos últimos dois anos, fez a coordenação editorial de uma coleção de 15 livros sobre esportes olímpicos publicada pelo editora do Sesi.