CPC na prática

Impenhorabilidade - Recentes interpretações do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo quanto ao artigo 833, X, do novo Código de Processo Civil

Impenhorabilidade - Recentes interpretações do TJ/SP quanto ao artigo 833, X, do CPC/15.

23/3/2017

Elias Marques de Medeiros Neto

Em recentes julgados, algumas câmaras de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo vem adotando uma interpretação extensiva ao disposto no inciso X do artigo 833 do Novo Código de Processo Civil, decretando-se o entendimento de que a impenhorabilidade das quantias depositadas em poupança, até o limite de quarenta salários mínimos, incide também quanto aos valores que eventualmente estejam depositados em outras modalidades de aplicações financeiras, tais como os fundos de investimento; respeitado sempre o limite máximo de quarenta salários mínimos, bem como observado o parágrafo 2º. do artigo 833 do Novo Código de Processo Civil.

Prevê o referido artigo 833 que:

"São impenhoráveis: (...);

X - a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos;

(...);

§ 2o O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8o, e no art. 529, § 3o."

No julgamento do agravo de instrumento 2239955-64.2016.8.26.0000, ocorrido em 23/2/2017, tendo sido relator o desembargador Roberto Mac Cracken, a 22ª Câmara de Direito Privado entendeu que:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO – PENHORA – BLOQUEIO DE CONTA POUPANÇA – IMPOSSIBILIDADE – APLICAÇÃO DO ART. 833, X, DO CPC – Em razão de disposição legal as aplicações em conta poupança inferiores a quarenta (40) salários mínimos são impenhoráveis – Segundo a orientação jurisprudencial do C. Superior Tribunal de Justiça, a norma do artigo 833, X, do CPC/16 deve ser interpretada de forma extensiva para se reconhecer que a impenhorabilidade no limite de até quarenta salários mínimos compreende "não apenas os valores depositados em cadernetas de poupança, mas também em conta corrente ou em fundos de investimento, ou guardados em papel-moeda" – Recurso provido".

Também em julgamento recente, ocorrido em 14/3/2017, a mesma interpretação extensiva foi adotada pela 15ª Câmara de Direito Privado, no julgamento do agravo de instrumento 2224055-41.2016.8.26.0000, tendo sido relator o Desembargador Coelho Mendes:

"EXECUÇÃO. DECISÃO QUE AFASTOU A ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DE MONTANTE DEPOSITADO EM CONTA BANCÁRIA. APLICABILIDADE DA REGRA PREVISTA NO ART. 833, X DO CPC, QUE CONFORME RECENTE ENTENDIMENTO DO STJ, TAMBÉM, COMPREENDE VALORES DEPOSITADOS EM CONTA CORRENTE E FUNDOS DE INVESTIMENTOS. PRECEDENTE DO STJ NO ERESP 1330567 / RS. MONTANTE BLOQUEADO QUE NÃO SUPERA O LIMITE PREVISTO NO INCISO X DO ART. 833 DO CPC. RECURSO PROVIDO."

Entendimento similar foi o adotado pela 20ª Câmara de Direito Privado no julgamento do agravo de instrumento 2153696-66.2016.8.26.0000, ocorrido em 6/2/2017, tendo sido relator o Desembargador Rabello Pinho:

"EXECUÇÃO – Admissível o reconhecimento da impenhorabilidade prevista no art. 833, X, CPC/2015 (correspondente ao art. 649, X, do CPC/1973), para valores de até 40 salários mínimos, depositados em aplicações financeiras com caráter de investimento, incluindo contas-poupança vinculadas a conta corrente, fundos de investimento e conta corrente, nos termos da interpretação extensiva adotada pelo Eg. STJ - Nos termos da orientação supra, como a quantia alcançada pelo bloqueio, em conta poupança da parte devedora, é inferior a 40 salários mínimos, ela é impenhorável, por força do art. 833, X, CPC/2015 (correspondente ao art. 649, X, do CPC/1973), impondo-se, em consequência, a reforma da r. decisão agravada, para determinar o levantamento do bloqueio on-line efetivado, com restituição do referido valor constrito à agravante - Revogação do efeito suspensivo concedido ao recurso. Recurso provido".

Os aludidos julgados acompanham orientação fixada pela 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial EREsp 1330567/RS, tendo sido relator o Ministro Luis Felipe Salomão:

"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. ALCANCE. APLICAÇÃO FINANCEIRA. LIMITE DE IMPENHORABILIDADE DO VALOR CORRESPONDENTE A 40 (QUARENTA) SALÁRIOS MÍNIMOS. 1. (...). 2. É possível ao devedor poupar valores sob a regra da impenhorabilidade no patamar de até quarenta salários mínimos, não apenas aqueles depositados em cadernetas de poupança, mas também em conta-corrente ou em fundos de investimento, ou guardados em papel-moeda. 3. Admite-se, para alcançar o patamar de quarenta salários mínimos, que o valor incida em mais de uma aplicação financeira, desde que respeitado tal limite. 4. Embargos de divergência conhecidos e providos".

A orientação jurisprudencial acima descrita parte da premissa de que o legislador buscou, na realidade, tornar impenhorável a quantia de 40 (quarenta) salários mínimos, não havendo necessariamente a obrigação de tal valor estar investido na modalidade poupança. Logo, tal quantia pode estar aplicada em fundos de investimento, certificados de depósitos bancários, ou mesmo estar simplesmente depositada na conta corrente. O que o legislador buscou, na verdade, foi proteger a quantia de 40 (quarenta) salários mínimos, não se podendo exigir que tal valor esteja necessariamente atrelado a uma conta poupança.

Vale lembrar que o artigo 833 do Novo Código de Processo Civil apresenta o rol dos bens impenhoráveis. Tem-se aqui o que Cândido Rangel Dinamarco1 denomina como limites políticos da execução, excluindo-se do seu campo de atuação, seja por interesse público, seja por respeito à pessoa e dignidade do devedor, determinados bens tidos como impenhoráveis.

__________

1 DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução civil. 8ª. ed. São Paulo: RT, 2002. p. 311.

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André Pagani de Souza é doutor, mestre e especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Bacharel em Direito pela USP. Professor de Direito Processual Civil e coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo. Pós-doutorando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Autor de diversos trabalhos na área jurídica. Membro do IBDP, IASP e CEAPRO. Advogado.

Daniel Penteado de Castro é mestre e doutor em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária. Membro fundador e conselheiro do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados em Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Professor na pós-graduação Lato Sensu na Universidade Mackenzie, Escola Paulista de Direito e Escola Superior da Advocacia. Professor de Direito Processual Civil na graduação do Instituto de Direito Público. Advogado e Autor de livros jurídicos.

Elias Marques de M. Neto tem pós-doutorado em Direito Processual Civil na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (2015). Pós Doutorado em Democracia e Direitos Humanos, com foco em Direito Processual Civil, na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra/Ius Gentium Conimbrigae (2019). Pós Doutorado em Direitos Sociais, com foco em Direito Processual Civil, na Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca (2022). Pesquisador visitante no Instituto Max Planck, em Direito Processual Civil (2023). Doutor (2014) e Mestre (2009) em Direito Processual Civil pela PUC/SP. MBA em Gestão Empresarial pela FGV (2012). Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela FGV (2006). Especializações em Direito Processual Civil (2004) e em Direito dos Contratos (2005) pelo IICS/CEU. Especialização em Direito do Agronegócio pela FMP (2024). Pós Graduação Executiva nos Programas de Negociação (2013) e de Mediação (2015) da Harvard Law School. Pós Graduação Executiva em Business Compliance na University of Central Florida - UCF (2017). Pós Graduação Executiva em Mediação e Arbitragem Comercial Internacional pela American University / Washington College of Law (2018). Pós Graduação Executiva em U.S. Legal Practice and ADR pela Pepperdine University/Straus Institute for Dispute Resolution (2020). Curso de Extensão em Arbitragem (2016) e em Direito Societário (2017) pelo IICS/CEU. Bacharel em Direito pela USP (2001). Professor Doutor de Direito Processual Civil no Curso de Mestrado e Doutorado na Universidade de Marilia - Unimar (desde 2014), nos cursos de Especialização do CEU-Law (desde 2016) e na graduação da Facamp (desde 2021). Professor Colaborador na matéria de Direito Processual Civil em cursos de Pós Graduação Lato Sensu e Atualização (destacando-se a EPD, Mackenzie, PUC/SP-Cogeae, UCDB, e USP-AASP). Advogado. Sócio de Resolução de Disputas do TozziniFreire Advogados (desde 2021). Atuou como Diretor Executivo Jurídico e Diretor Jurídico de empresas do Grupo Cosan (2009 a 2021). Foi associado sênior do Barbosa Mussnich e Aragão Advogados (2002/2009). Apontado pela revista análise executivos jurídicos como o executivo jurídico mais admirado do Brasil nas edições de 2018 e de 2020. Na mesma revista, apontado como um dos dez executivos jurídicos mais admirados do Brasil (2016/2019), e como um dos 20 mais admirados (2015/2017). Recebeu do CFOAB, em 2016, o Troféu Mérito da Advocacia Raymundo Faoro. Apontado como um dos 5 melhores gestores de contencioso da América Latina, em 2017, pela Latin American Corporate Counsel Association - Lacca. Listado em 2017 no The Legal 500's GC Powerlist Brazil: Teams. Recebeu, em 2019, da Associação Brasil Líderes, a Comenda de Excelência e Qualidade Brasil 2019, categoria Profissional do Ano/Destaque Nacional. Recebeu a medalha Mérito Acadêmico da ESA-OABSP (2021). Listado, desde 2021, como um dos advogados mais admirados do Brasil na Análise 500. Advogado recomendado para Resolução de Disputas, desde 2021, nos guias internacionais Legal 500, Latin Lawyer 250, Best Lawyers e Leaders League. Autor de livros e artigos no ramo do Direito Processual Civil. Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP, Pinheiros (desde 2013). Presidente da Comissão de Energia do IASP (desde 2013). Vice Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP (desde 2019). Membro fundador e Conselheiro (desde 2023) do Ceapro, tendo sido diretor nas gestões de 2013/2023. Conselheiro curador da célula de departamentos jurídicos do CRA/SP (desde 2016). Membro de comitês do Instituto Articule (desde 2018). Membro da lista de árbitros da Camarb. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), do CBar e da FALP. Foi presidente da Comissão de Defesa da Segurança Jurídica do Conselho Federal da OAB (2015/2016), Conselheiro do CORT/FIESP (2017), Coordenador do Núcleo de Direito Processual Civil da ESA-OAB/SP (2019/2021) e Secretário da comissão de Direito Processual Civil do CFOAB (2019/2021).

Rogerio Mollica é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela USP. Especialista em Administração de Empresas CEAG-Fundação Getúlio Vargas/SP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Bacharel em Direito pela USP. Professor doutor nos cursos de mestrado e doutorado na Universidade de Marilia - Unimar. Advogado. Membro fundador, ex-conselheiro e ex-presidente do Ceapro - Centro de Estudos Avançados de Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).