Gramatigalhas

Para se manifestar ou Para manifestar-se?

Para se manifestar ou Para manifestar-se? O professor esclarece.

30/11/2022
A leitora Carla Matozo Milan envia à coluna Gramatigalhas a seguinte mensagem:

"Gostaria de saber qual é o modo correto a se dizer na frase 'Intime-se a parte autora para manifestar-se no prazo de'. É correto dizer manifestar-se ou se manifestar ou ainda manifestar-se-á?".

1) Uma leitora indaga qual das duas formas é gramaticalmente correta: (a) "Intime-se a parte autora para se manifestar no prazo de..."; (b) "Intime-se a parte autora para manifestar-se no prazo de...". E pergunta adicionalmente se seria correta a forma manifestar-se-á.

2) Fixe-se, para conceituar, que, quando o pronome pessoal oblíquo átono se põe antes do verbo, diz-se que há próclise: "O advogado se atrasou"; já quando tal pronome se posta depois do verbo, diz-se que há ênclise: "O advogado atrasou-se".

3) No caso dos exemplos inicialmente dados, uma análise técnica revela que o leitor quer saber, em última análise, como se coloca o pronome, quando uma preposição (no caso para) precede um verbo no infinitivo (no caso manifestar): em próclise ou em ênclise?

4) Ora, para os verbos no infinitivo, existe, por um lado, a lição de Cândido de Figueiredo de que "as preposições pertencem à categoria das partículas que influem geralmente na colocação dos pronomes pessoais atônicos, atraindo-os".1

5) Exemplos colhidos pelo mencionado autor em autorizados escritores de nosso idioma, entretanto, revelam que, quando se tem um infinitivo precedido de preposição, a colocação do pronome átono, em última análise, não se faz em próclise necessária, mas constitui caso de colocação facultativa, a saber, antes do verbo (em próclise) ou depois dele (em ênclise). Exs.: a) "Até chegou a me dar casa..." (Machado de Assis); b) "... obriga o procurador a respeitar-lhe as cláusulas" (Rui Barbosa); c) "... era bastante para sacudir-me da Tijuca" (Machado de Assis); d) "Chamou-me um escravo para me servir o doce" (Machado de Assis); e) "Ficou Maria Henriqueta livre por se ver livre do suborno da mãe" (Camilo Castelo Branco); f) "Senhor, morro por unir-me convosco" (Padre Manuel Bernardes); g) "Gastei pouco tempo em dizer-lhe..." (Machado de Assis); h) "... não faltaria Deus em lhe dar um bom dia" (Padre Antônio Vieira).

6) Assim, fixada a regra de que o infinitivo precedido de preposição permite a colocação facultativa do pronome átono em próclise ou em ênclise, pode-se dizer, quanto à indagação que motivou estas considerações, que estão corretas ambas as formas trazidas pelos exemplos dados: "Intime-se a parte autora para se manifestar no prazo de..."; (b) "Intime-se a parte autora para manifestar-se no prazo de...".

7) Quanto ao terceiro exemplo trazido pela consulta, o que se vê é que ele não se encaixa na dúvida trazida, pois, afinal, não é possível dizer-se corretamente "Intime-se a parte autora para manifestar-se-á...".

8) Mesmo assim, para que o leitor não fique sem essa parte da resposta, vê-se que o raciocínio precisa passar por um outro caminho: (i) o verbo empregado pela consulta está no futuro (manifestará); (ii) e o futuro não admite ênclise; (iii) ou seja, quando se diz ênclise para os demais tempos, deve-se pensar em mesóclise para o futuro (manifestar-se-á); (iv) com esse raciocínio, faz-se uma ligeira adaptação; (v) por um lado, para os demais casos, é facultativo o emprego da próclise ou da ênclise; (vi) já com o futuro, é facultativo o emprego da próclise ou da mesóclise; (vii) com o futuro, porém, está proibido o uso da ênclise.

9. Com esse raciocínio, veja-se o que está correto ou não nos seguintes exemplos: (i) "A parte autora se manifestou..." (forma correta); (ii) "A parte autora manifestou-se..." (forma correta); (iii) "A parte autora se manifestará..." (forma correta); (iv) "A parte autora manifestar-se-á..." (forma correta); (v) "A parte autora manifestará-se..." (forma errada).

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1 FIGUEIREDO, Cândido de. O Problema da Colocação de Pronomes. 6. ed. Lisboa: Livraria Clássica Editora, 1937, p. 320.

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Colunista

José Maria da Costa é graduado em Direito, Letras e Pedagogia. Primeiro colocado no concurso de ingresso da Magistratura paulista. Advogado. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP. Ex-Professor de Língua Latina, de Português do Curso Anglo-Latino de São Paulo, de Linguagem Forense na Escola Paulista de Magistratura, de Direito Civil na Universidade de Ribeirão Preto e na ESA da OAB/SP. Membro da Academia Ribeirãopretana de Letras Jurídicas. Sócio-fundador do escritório Abrahão Issa Neto e José Maria da Costa Sociedade de Advogados.