Meio de campo

Banco CBF

Banco CBF.

24/5/2017

O objeto da CBF (ou os fins básicos, como previstos no estatuto) é tão amplo que o resumo dos 29 incisos que o compõem tomaria todo o espaço desta coluna.

Esses incisos, em sua grande maioria, apresentam descrições abertas, que comportam uma série de atuações em favor e no interesse do futebol, da manutenção da ordem esportiva, de representação nacional e internacional, de combate de substâncias ilícitas, e de promoção da defesa dos interesses e direitos coletivos de seus filiados e das entidades de prática do futebol.

Entre seus fins não se inclui a realização de empréstimos.

Empréstimos, como regra, são realizados por instituições financeiras. A atuação dessas entidades é regulada pela lei 4.595, de 31 de dezembro de 1964, e demais normas aplicáveis.

Consideram-se instituições financeiras, de acordo com o art. 17, "as pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros".

O funcionamento de instituição financeira depende de prévia autorização do Banco Central, quando nacionais, ou de decreto do Poder Executivo, se estrangeiras.

A CBF não é, definitivamente, uma instituição financeira; mas tem o hábito de realizar empréstimos aos filiados.

As demonstrações financeiras relativas aos exercícios de 2015 e 2016, dela e de determinados clubes, revelam a existência desses negócios.

Veja-se, inicialmente, a Nota Explicativa 4, da Administração da CBF: na rubrica "contas a receber", listam-se créditos contra filiados especiais, presumidamente clubes de futebol, no montante de R$ 44.020.000,00. Este valor sofreu uma redução substancial em relação ao exercício de 2015, em que se indicavam contas a receber, também de filiados especiais, de R$ 64.059.000,00.

Veja-se, agora, a situação de alguns times, todos do Rio de Janeiro.

Flamengo

Ao término do exercício de 2015, o clube mantinha um empréstimo com a CBF no montante de R$ 4.323.000,00, contratado mediante o pagamento de uma taxa de juros expressiva, equivalente a 165% do CDI.

A conta, em 2016, aparece zerada, de modo que se presume a liquidação da dívida com o credor.

Aquele montante não era relevante, é verdade, no âmbito do estoque de empréstimos e financiamentos, que totalizava, em 2015, R$ 161.975.000,00. Como referência, este valor, em 2016, caiu para R$ 111.581.000,00.

Vasco

Ao cabo do exercício de 2015, a dívida com a CBF era de R$ 16.292.000,00, de um montante de R$ 69.661.058,00, relativo à soma de empréstimos de terceiros.

Ao término de 2016, passou a R$ 13.964.000,00, de um montante de R$ 74.303.976,00.

Botafogo

No exercício de 2015, os empréstimos e financiamentos, obtidos pelo Botafogo, somavam R$ 116.101.000,00, dos quais R$ 11.107.000,00 foram captados junto à CBF.

Em 2016, os recursos advindos dessa entidade totalizaram R$ 9.387.000,00, enquanto a dívida total de empréstimos e financiamentos foi reduzida para R$ 114.868.000,00.

Fluminense

Em 2015, seus empréstimos e financiamentos montavam a R$ 38.379.000,00, sendo que R$ 10.565.000,00 provinham da CBF; ou seja, quase 30% do total dos recursos advindos de terceiros.

Como as demonstrações financeiras do clube, relativas ao exercício de 2016, ainda não foram divulgadas oficialmente, pois a votação das contas ocorrerá 25/05/20171, não se pode comentá-las.

Resumindo, valores expressivos ou não, pouco importa, não é função da CBF prover recursos para os seus filiados.

Esta prática revela, no entanto, um problema estrutural do futebol brasileiro: a ausência de um ambiente organizado, devidamente regulado, para captação de recursos para financiamento da empresa futebolística.

Assim, as captações são limitadas, e, quando disponíveis, envolvem agentes que cobram taxas de juros muito elevadas.

Enquanto não houver crédito para o futebol, não haverá crescimento; ao menos dos clubes. Pois, neste país que fica cada vez mais difícil de explicar, a CBF não para de crescer.

__________

1 Balanço de 2016 revela aumento de 48% com gastos no futebol e detalha crise financeira do Flu.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Colunista

Rodrigo R. Monteiro de Castro advogado, professor de Direito Comercial do IBMEC/SP, mestre e doutor em Direito Comercial pela PUC/SP, coautor dos Projetos de Lei que instituem a Sociedade Anônima do Futebol e a Sociedade Anônima Simplificada, e Autor dos Livros "Controle Gerencial", "Regime Jurídico das Reorganizações", "Futebol, Mercado e Estado” e “Futebol e Governança". Foi presidente do IDSA, do MDA e professor de Direito Comercial do Mackenzie. É sócio de Monteiro de Castro, Setoguti Advogados.